terça-feira, 25 de outubro de 2011

O futuro sombrio da Líbia

O que acontecerá com a Líbia após a queda e morte de Muammar Kadhafi? Com a intervenção decisiva da Otan, apoiada inicialmente pelos Estados Unidos, os rebeldes se insurgiram contra o regime que já durava 42 anos e o derrotaram sob o custo de milhares de mortos.

Bandeira de 1951 volta a vigorar
 Mas, agora, depois da fase do festim macabro instaurado com a execução do ex-líder, o país parece encaminhar-se para um destino semelhante ao do Iraque pós- Sadam Hussein. Apesar das exortações (como sempre, hipócritas e teatrais) das lideranças ocidentais, a começar de Barack Obama, para que a Líbia agora se dirija à santa democracia, “A Líbia é tribal de A a Z. Há 140 tribos”, como escreveu o jornalista Pepe Escobar no Asia Times Online, em artigo de fevereiro deste ano (mas muito atual e elucidativo da realidade do país), reproduzido em português no Viomundo no início da “revolução” líbia (leia aqui).

“Resultado inevitável desse sistema político tribal – continuava então Escobar –, foi o esmagamento de qualquer sociedade civil baseada em instituições democráticas.” E ainda: “Seja lá o que for que venha a emergir desse vulcão, não parece haver meio de evitar que a Líbia seja partida em territórios tribais. Não é exagero dizer que, para a juventude – tribal – líbia, que foi às ruas para lutar contra o regime super armado de Gaddafi, a peste é a mentalidade tribal. Não será varrida da noite para o dia.”

E infelizmente o caos parece confirmar, pelo menos nesse início pós- Kadhafi, as expectativas mais pessimistas. Nesta segunda-feira, cerca de 100 pessoas ou mais morreram e pelo menos 50 ficaram feridas na explosão de um depósito de combustível em Sirte (cidade de Kadhafi), segundo disse à AFP Leith Mohamed, do Conselho Nacional de Transição (CNT). No mesmo dia, a ONG Human Rights Watch (HRW) disse ter encontrado 53 corpos em estado de decomposição, provavelmente de partidários ou aliados de Kadhafi, com sinais de execução sumária.

De acordo com Leslie Gelb, presidente emérito do Council on Foreign Relations, citado pela BBC, “os grupos que se uniram para lutar contra Kadhafi têm pouco em comum. Acho muito provável que comecem a lutar uns contra os outros, e a matar uns aos outros".

Enquanto isso, conforme as agências internacionais divulgaram na mesma segunda-feira, o presidente do Conselho Nacional de Transição (CNT) do país, Mustafá Abdul Jalil, afirmou que Líbia será regida pela lei islâmica, a Sharia.

Mulheres

Uma mulher citada pela AFP disse o seguinte: "É chocante e insultante constatar que depois do sacrifício de milhares de líbios pela liberdade, a prioridade dos novos líderes é permitir que os homens casem em segredo (...) Nós não vencemos Golias para viver na Inquisição", afirmou a mulher de 40 anos. Para essa mulher, que conhece o que se passa com as mulheres no Irã e na Arábia Saudita, não é muito reconfortante que Mustafá Abdul Jalil tenha feito uma ressalva: "Quero certificar a comunidade internacional de que nós, líbios, somos muçulmanos moderados".

Está prevista para duas semanas a definição do novo governo provisório líbio. Espero de coração que o título deste post seja desmentido pela história.

PS: Mantenho neste post a grafia que eu uso para o nome Muammar Kadhafi assim como a usada por Pepe Escobar, citado (Gaddafi). Como eu disse em post anterior, pode-se usar Muammar Kadhafi, Muamar Gaddafi, Mu'ammar al-Qadhdhafi, Muamar Gadafi, Muammar al-Kadhafi etc, pois as possibilidades de grafia do nome do ex-líder líbio são muitas.

*Já sobre o tema Muammar Kadhafi, as acusações de terrorismo que pesam contra ele, especificamente a explosão do avião da Pan Am sobre a cidade escocesa de Lockerbie, em 1988, os julgamentos, as teorias e versões sobre o fato, recomendo o texto de Vladimir Aras, soteropolitano, membro do Ministério Público Federal: Kadafi e o atentado de Lockerbie

*Atualizado às 15:49

2 comentários:

Paulo M disse...

O Gadafi, pelo menos até uns anos atrás, não vendia petróleo pros americanos. Pra eles é até bom que agora as tribos se matem lá. Nenhuma delas vai ver a cor do dinheiro mesmo. Enquanto isso, os gringos vão apoiar um governo que faça uma Constituição democrática, ao gosto dos Estados Unidos. Aliás, o Bashar al-Assad, na Síria, já deve estar trêmulo. Sabe que possivelmente é o próximo da fila. Por isso já prometeu uma nova Constituição para daqui a míseros quatro meses.

Victor disse...

Ontem fui assistir o sociólogo Chico Oliveira na Casa da Cidade, claro que perguntaram para ele sobre a Primavera Árabe, o que ele disse está de acordo o que vc escreveu Edu. O Chico disse que no ocidente ninguém conhece muito bem a cultura oriental e qualquer palpite vai tomar como base o nosso jeito de ser, então ele não quis ser desonesto intelectualmente e dizer alguma coisa deste caldeirão que mistura, ditadura, religião e povos árabes. Acho que ele tem razão, podemos especular por esporte, falar das velhas práticas americanas de poder e petróleo, mas quanto aos próximos passos será difícil chegar perto.