sexta-feira, 28 de junho de 2013

Números mostram que educação está longe de ser prioridade no governo de Geraldo Alckmin


Foto: Roseli Costa


Estudo feito pela liderança do PT na Assembleia Legislativa, a partir de dados do orçamento do estado de São Paulo, mostra dados sintomáticos da visão da educação no governo de Geraldo Alckmin. 

As obras de expansão da rede física escolar, entre 2011 e 2012, caíram cerca de 25%, de R$ 1,002 bilhão, em 2012, para R$ 751 milhões em 2013. A redução é de R$ 251,2 milhões.

Em aperfeiçoamento dos profissionais do ensino fundamental e médio, em relação ao ano passado, o orçamento em vigor registrou este ano queda de 15,34% no primeiro (de R$ 71,4 milhões para R$ 60,4) e 25,8% no segundo, que diminuiu de R$ 52,9 milhões para R$ 39,2 milhões.

O Programa Ler e Escrever, lançado em 2007 na gestão de José Serra (PSDB) para promover a melhoria do ensino em toda a rede estadual, com ações incluindo apoio aos professores e distribuição de materiais pedagógicos e outros subsídios, teve recursos e número de alunos beneficiados reduzidos. Na peça orçamentária de 2012, eram 681.763 alunos, com verbas de R$ 85,9 milhões. Em 2013, os números caíram para 661.731 (2,9%) e R$ 65 milhões (24,3%), respectivamente.

O programa de alimentação escolar apresenta redução dos recursos (de R$ 368 milhões para R$ 336 milhões), enquanto o número de alunos a ser alcançado aumentou de 2.140.622 para 2.208.489, o que pode representar a diminuição da qualidade nutricional oferecida aos alunos, segundo o estudo.

O programa Escola da Família, criado na primeira gestão de Alckmin, que previa o funcionamento das escolas em fins de semana para atividades das comunidades onde se localizam, foi reduzido pela metade no governo de José Serra (2007-2010) e, no segundo mandato de Alckmin, permanece estagnado. Em 2012, eram 2.390 escolas participantes do programa, número que permanece igual este ano. Os recursos, porém, aumentaram de R$ 103,5 milhões para 119,3 milhões.

Enxugamento

No mesmo dia em que se vale de pronunciamento para anunciar cortes de R$ 355,5 milhões que incluem fechamento de secretaria, fusões e venda de veículos, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), pede que a Assembleia Legislativa aprove um projeto de lei que vende 600 terrenos a R$ 900 milhões – incluindo o local onde fica o Ginásio do Ibirapuera, na zona sul da capital. Ao mesmo tempo, o tucano investe R$ 226 milhões em publicidade só neste ano, totalizando quase R$ 2,5 bilhões nos últimos dez anos de administração do PSDB.

Guilherme Lara Campos/Palácio dos Bandeirantes

O governador culpou a revogação do aumento de tarifas de trens e metrô, anunciado no dia 19 após forte mobilização popular, pela necessidade de cortar de outras fontes, embora conte com ao menos R$ 12 bilhões em caixa e tenha deixado todos os anos de executar parte do orçamento estadual, que só em 2013 prevê R$ 173 bilhões em despesas.

A matéria completa sobre esses e outros números do governo Alckmin está neste link: Alckmin corta R$ 355 milhões, mas vende 600 terrenos a R$ 900 milhões – da Rede Brasil Atual

quinta-feira, 27 de junho de 2013

O admirável mundo novo da Linha Amarela do metrô de São Paulo


Reprodução do site da Companhia do Metrô
Repare: até o logo da Linha 4 é diferente
Este post poderia ser intitulado "Por que eu odeio a Linha 4 Amarela do metrô de São Paulo". Pois o ramal é digno de nota, uma nota dissonante no sistema metroviário da capital paulista.

É a única linha privada, administrada por um consórcio, a ViaQuatro. Que, no mapa da rede metroviária paulistana, tem gestão, funcionários, operação e até logotipo diferentes dos outros ramais, geridos pelo estado de São Paulo: as linhas 1 Azul (norte-sul), 2 Verde (Vila Madalena-Vila Prudente), 3 Vermelha (leste-oeste) e 5 Lilás (Capão Redondo-Largo Treze).

A importante Linha 4, que uso todos os dias, vai da Luz ao Butantã, e faz ligação com a linha norte-sul na Luz, com a linha leste-oeste na Repúbica e com a linha verde na Paulista, além de se interligar com os trens da CPTM na Luz e em Pinheiros. Mas o ramal destoa já nas interligações.

A intersecção com o ramal na avenida Paulista é um absurdo, em termos de engenharia. As correntes de pessoas são levadas como gado a andar por corredores de fluxo humano que se trombam; os postos automáticos de carregar o Bilhete Único (por máquinas de empresas privadas), vira e mexe, falham, e você não tem a quem reclamar, já que o governo estadual não administra e as empresas responsáveis pelo serviço de recarga dos bilhetes não dão satisfação ao usuário, assim como a própria ViaQuatro ignora os problemas.

Fora isso tudo, aconteceu comigo já duas vezes uma situação que nunca antes na história desse metrô paulistano eu tinha vivenciado, que é o seguinte: quando você entra no metrô, mesmo que seja um minuto antes do horário de encerramento da operação (meia-noite todos os dias e uma hora da manhã aos sábados), o metrô sempre se responsabilizou por levar o passageiro até o destino. Por exemplo: é uma quinta-feira e você entra na estação Jabaquara às 23:59. O fato de você entrar, seja para onde você for (Barra Funda, Vila Mariana, Tatuapé, Santana etc.), a certeza de que você chegará ao destino sempre foi de 100%, um compromisso histórico do metrô do Estado.

Na Linha Amarela (repetindo: privada), isso não acontece. Duas vezes aconteceu comigo de entrar na linha Azul (norte-sul) e, ao chegar na interligação com a Linha Amarela, ser barrado por seguranças anunciando que a operação já tinha encerrado. "Como assim!!", questionei. Eu estou dentro do metrô! Como não adianta discutir com seguranças, você tem que sair do metrô, tentar pegar um ônibus (quase impossível depois da meia-noite) ou apelar a um táxi. É a descontinuidade de  um compromisso do metrô com seus usuários que sempre existiu, mas o consórcio que gere o ramal quer que você se f..., e o governo Alckmin... Bem, o governo Alckmin não pode fazer nada, claro, porque a Linha Amarela não é responsabilidade sua, e sim de uma concessionária.

Um dia em que houve um debate na Assembleia Legislativa sobre o metrô, tive a oportunidade de perguntar ao senhor Milton Gioia, gerente de manutenção do metrô, sobre esse problema. A resposta dele: “Não sei te responder. Isso é um problema operacional. Vou precisar verificar. Hoje eu não tenho essa informação”.

Tente comprar bilhete nos guichês da estação Butantã, por exemplo. As filas são enormes. 

Para terminar, é intolerável a desnecessária poluição sonora na Linha 4 Amarela. Ela tem um sistema de som odioso, que impede você de se concentrar e ler umas páginas de livro ou até jornal, enquanto está no trem entre a Luz e o Butantã. É que, ao contrário da voz humana das outras linhas, a da Amarela é uma voz metálica inumana. Nas linhas geridas pelo estado, o condutor do trem anuncia entre uma estação e outra, pelo microfone: “próxima estação, São Bento. Desembarque pelo lado direito do trem”.

Na Linha Amarela, depois de um sinal sonoro alto e agressivo, uma voz robótica anuncia, uns 15 segundos antes de o trem chegar à estação, em volume também acima do necessário, que você está chegando à estação Luz, por exemplo, e enumera as interligações com a CPTM e a linha 1 Azul. Quinze segundos depois, quando o trem chega, o mesmo sinal sonoro em alto volume e a mesma voz metálica para surdo repete tudo de novo, só mudando o texto, tirando o “próxima estação”, já que você chegou. Ou seja, eles tratam as pessoas como se fossem estúpidas. E o pior é quem ninguém reclama, todo mundo acha normal.

O metrô da Linha 4 Amarela não tem condutor. É comandado por uma central, operada por computadores.

Segundo a assessoria de imprensa do Metrô, a Linha Amarela transporta hoje 600 mil usuários por dia.

Bem-vindo ao admirável mundo novo do metrô de São Paulo.

terça-feira, 25 de junho de 2013

Com proposta de plebiscito, Dilma sai da defesa, mas já enfrenta oposição de ministros do Supremo


Se é correta a comparação que se faz da política com o xadrez (embora, ressalve-se, este jogo milenar seja feito para a disputa entre apenas dois contendores), foi uma jogada bem executada a da presidente Dilma Rousseff ao propor um plebiscito sobre a instalação de uma constituinte que faça a essencial reforma política no país, que não será feita pelos atuais parlamentares para mexer em “direitos” que eles consideram seus.

Certo que o PT já pôs nas ruas há mais de dois meses uma campanha por coleta de assinaturas para tentar viabilizar uma proposta de Assembleia Constituinte exclusiva para reformar o empoeirado sistema do país. Mas com a proposta partindo da presidência, a coisa ganha consistência. 

O fato de ela ter feito a proposta em reunião com os 27 governadores e os prefeitos das cidades mais importantes do país dá um alcance enorme à proposta. Com a estratégia, Dilma sai finalmente da defesa e ao mesmo tempo coloca em cena os chefes dos executivos estaduais e municipais como corresponsáveis pela conjuntura de crise.


Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr
Dilma, vice Michel Temer, governadores, prefeitos e ministros em Brasília

Mas ministros e ex-ministros do STF já combatem a ideia, dizendo, por exemplo, que um plebiscito é juridicamente incabível e politicamente desnecessário. Além disso, uma Constituinte parcial ou com agenda pré-estabelecida não se sustenta, dizem alguns. “Ninguém pode convocar a Constituinte e estabelecer agenda prévia, o constituinte não tem agenda pré-fixada”, disse o jurista Luís Roberto Barroso, o próximo a assumir uma vaga no do STF, em alusão à ideia de se convocar o colegiado para definir uma reforma política, por exemplo. “Mas às vezes a realidade derrota a teoria constitucional”, ressalvou.

Já o ministro aposentado do STF Carlos Velloso afirmou considerar a possibilidade “um absurdo, algo inusitado que esconde qualquer coisa, porque não tem apoio na ordem jurídica”, segundo a Agência Brasil. Ora, como sabemos, o STF não é feito de arcanjos. É um órgão político e que faz política. Se ele não aceita a ideia, não se deve apenas ao abstrato ordenamento jurídico, até porque não há unanimidade em torno das leis e nem da Constituição. É evidente que a ideia incomoda.

Evidentemente uma reforma política feita por uma Constituinte exclusiva vai mexer com muitos interesses, e há inúmeros políticos, não só do PT, insatisfeitíssimos com a sem-cerimônia com que o Supremo interfere na agenda política e no próprio Legislativo.

É tão óbvio que Dilma saiu da defesa que até os ministros do STF já se manifestam contra o plebiscito. A coisa vai longe e o embate será duro.

sábado, 22 de junho de 2013

Seleção de Felipão avança e deve enfrentar Espanha na final



Reprodução
Jornal italiano Corriere della Sera estampa vitória brasileira

A grande vitória brasileira contra a Itália por 4 a 2 em Salvador, pela Copa das Confederações, tem três ressalvas:  no primeiro gol brasileiro Jô estava impedido; no segundo, Neymar cobrou de forma magistral uma falta que, porém, não existiu, ele se jogou; a Itália jogou desfalcada de Pirlo e De Rossi, ou seja, sem no mínimo meio time, e ainda perdeu Montolivo e Abate, lesionados, ainda no primeiro tempo.

Os gols brasileiros foram de Dante, aos 46 minutos do primeiro tempo; Neymar, aos dez, e Fred, aos 21 e aos 43 minutos do segundo tempo. A Itália marcou com Giaccherini, aos cinco, e Chiellini, aos 26 minutos do segundo tempo.

A seleção de Felipão eliminará o Uruguai numa semifinal, a Itália deve cair ante a Espanha na outra, embora a Azzurra nunca deva ser subestimada.

Brasil e Espanha provavelmente farão a final. Aí vão ser outros quinhentos.


sexta-feira, 21 de junho de 2013

Dilma anuncia diálogo com manifestantes, sindicatos e movimentos sociais


Íntegra do pronunciamento


“Anuncio que vou receber os líderes das manifestações pacíficas, os representantes das organizações de jovens, das entidades sindicais, dos movimentos de trabalhadores, das associações populares. Precisamos de suas contribuições, reflexões e experiências (...) de sua capacidade de questionar erros do passado e do presente.”

Essa foi para mim a passagem mais importante da presidente Dilma hoje, no esperado discurso que fez à nação sobre as manifestações que sacudiram ruas e praças do Brasil por mais de uma semana.

Há um crescente descontentamento da sociedade civil, movimentos sociais e sindicatos com o encastelamento de Dilma e sua dificuldade em dialogar e recebê-los.

Conversei hoje com lideranças do PT em São Paulo que não só estavam, pela manhã, muito preocupadas como inconformadas com o silêncio da presidente diante do sinistro cenário que se desenhou durante a semana, culminando com o quase pânico na noite de ontem.

Outro trecho importante do discurso foi o reconhecimento de que o país precisa caminhar mais rapidamente no rumo de avanços de todos os tipos: serviços públicos decentes e relações políticas mais honestas, por exemplo. Disse Dilma:

“As manifestações dessa semana trouxeram importantes lições. As tarifas baixaram e as pautas dos manifestantes ganharam prioridade nacional. Temos que aproveitar o vigor dessas manifestações para produzir mais mudanças, que beneficiem o conjunto da população brasileira.

"Essas mensagens exigem serviços públicos de mais qualidade, escolas de qualidade, atendimento de saúde de qualidade, transporte público melhor a preço justo, mais segurança. Ela quer mais. E para dar mais as instituições e os governos devem mudar.

“Irei conversar nos próximos dias com os chefes dos outros poderes, para somarmos esforços esforços. Vou convidar os governadores e os prefeitos das principais cidades do país para um grande pacto em torno da melhoria dos serviços públicos. O foco será, primeiro, a elaboração do Plano Nacional de Mobilidade Urbana, que privilegie o transporte coletivo; segundo: a destinação de 100% dos recursos do petróleo para a educação; terceiro: trazer de imediato milhares de médicos do exterior para ampliar o atendimento do SUS.”

Abaixo, outros trechos do discurso:

 Violência e diálogo

“Se deixarmos que a violência nos faça perder o rumo, estaremos não apenas desperdiçando uma grande oportunidade histórica, como também correndo risco de colocar muita coisa a perder.
“Tenho a obrigação tanto de ouvir a voz das ruas como dialogar com todos os segmentos, mas tudo dentro dos primados da lei e da ordem, indispensáveis para a democracia. O Brasil lutou muito para se tornar um país democrático, e também está lutando muito para se tornar um país mais justo (...) Não é fácil chegar onde desejam muitos dos que foram às ruas. Só tornaremos isso realidade se fortalecermos a democracia, o poder cidadão e os poderes da República.”

"Vamos manter a ordem"

“Os manifestantes tem o direito a liberdade de questionar e criticar tudo, de propor e exigir mudanças, de lutar por mais qualidade de vida e defender com paixão suas ideias e propostas, mas precisam fazer isso de forma pacífica e ordeira. O governo e a sociedade não podem aceitar que uma minoria violenta e autoritária destrua o patrimônio público e provado, ataque templos, incendeie carros, apedrejem ônibus e tente levar o caos aos principais centros urbanos. Essa violência, promovida por uma pequena minoria, não pode manchar o movimento pacífico e democrático. Não podemos conviver com essa violência que envergonha o Brasil.

“Todas as instituições e os órgãos da segurança pública têm o dever de coibir, dentro dos limites da lei, toda forma de violência e vandalismo (...) Asseguro a vocês: vamos manter a ordem.”

História

“A minha geração lutou muito para que a voz das ruas fosse ouvida. Muitos foram perseguidos, torturados e morreram por isso. A voz das ruas precisa ser ouvida e respeitada, e ela não pode ser confundida com o barulho e a truculência de alguns arruaceiros. Sou a presidenta dos que se manifestam e dos que não se manifestam.”

Sistema político

“Precisamos oxigenar o nosso sistema político, encontrar mecanismos que tornem nossas instituições mais transparentes, mais resistentes aos mal-feitos e acima de tudo mais permeáveis à influência da sociedade.É a cidadania e não o poder econômico quem deve ser ouvida em primeiro lugar.”

Política, corrupção e cidadania

“Quero contribuir para a construção de uma ampla e profunda reforma política, que amplie a participação popular. É um equívoco achar que qualquer país possa prescindir de partidos e sobretudo do voto popular, base de qualquer processo democrático. Temos de fazer esforço para que o cidadão tenha mecanismos de controle mais abrangentes sobre os seus representantes. Precisamos de formas mais eficazes de combate à corrupção. A Lei de acesso à Informação, sancionada no meu governo, deve ser ampliada para todos os poderes da República e as instâncias federativas. A melhor forma de combater a corrupção é com transparência e rigor.”

“(...) Confio que o Congresso Nacional aprovará o projeto que apresentei para que todos os royalties do petróleo sejam gastos exclusivamente com educação.”

Copa do Mundo

“Em relação à Copa, quero esclarecer que o dinheiro do governo federal gasto com as arenas é fruto de financiamento que será devidamente paga pelas empresas e os governos.
O Brasil sempre foi muito bem recebido em toda a parte. Respeito carinho e alegria, é assim que devemos trartar os nossos hóspedes. O Brasil merece vai fazer uma grande Copa.”

Fim do discurso

“Eu quero repetir que o meu governo está ouvindo as vozes democráticas que pedem mudança. Eu quero dizer a vocês, que foram pacificamente às ruas: eu estou ouvindo vocês e não vou transigir com a violência e a arruaça. Será sempre em paz, com liberdade e democracia que vamos continuar construindo juntos esse grande país.”

quarta-feira, 19 de junho de 2013

Apontamentos sobre as manifestações
em São Paulo


Foto: Mídia Ninja
Prefeitura de São Paulo sitiada ontem, 18 de junho

A vitória do Movimento Passe Livre é histórica e importante, com a redução das tarifas de transporte anunciada pelos prefeitos do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PMDB), de São Paulo, Fernando Haddad (PT), este ao lado do governador paulista, Geraldo Alckmin (PSDB).  Mas até onde vai a “consciência política” dessa massa?  “Se há algo positivo na rejeição aos partidos e políticos, o fato de a juventude buscar novas formas de se manifestar e se organizar, há o risco de um movimento desse tipo ser uma força que é só formalmente apolítica, mas que é na verdade um discurso conservador” (Lincoln Secco, professor do Departamento de História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP).

Leio de gente jovem e supostamente de esquerda (ou que acha que é de esquerda) uma série de apontamentos tolos (trotskistas anacrônicos?) e de gente não jovem (trotskistas anacrônicos) sobre uma série interminável de erros de Fernando Haddad, que começou a governar há menos de seis meses. É gente que tirou as fraldas ontem e não tem noção de história. Que se encaixa bem na definição de Pasolini de “os jovens infelizes” (vou discorrer sobre isso em outro momento).

A manipulação das massas insatisfeitas – por grupos de direita ou fascistas e/ou pela mídia – é um perigo real.

As redes sociais são a manifestação contemporânea do inconsciente coletivo em forma de esquizofrenia.

E: “a esquizofrenia é um estado transitório entre a cegueira completa e a lucidez” (Gabriel Megracko).

As coisas acontecem numa velocidade tamanha que há quem anteontem achava que as manifestações eram de esquerda e ontem já achava que era de direita ou extrema direita! Isso me faz pensar no filósofo francês Paul Virilio.

“[O movimento] começou com as bandeiras da mobilidade urbana e a redução das tarifas de transportes, mas não para acusar o governo Dilma [de corrupção]. Preocupa que efeitos da mobilização sejam apropriados por oportunistas.” (Vagner Freitas, presidente da CUT).

Cartazes e pichações de ofensas vulgares e obscenas contra os governos do PT foram assustadoramente disseminadas, além de cenas de vandalismo desmedido e depredações de gente claramente disposta a tumultuar e espalhar o caos. Aquele cara na porta da prefeitura, o bombado, na noite do dia 18, era a própria expressão de um paramilitar. Só faltou a arma.

Mensagem via twitter de um idiota (cujo perfil não vou citar) reproduzido pelo rock-fascista Lobão: "Vem pra rua: Avenida Francisco Prestes Maia 1633 - SBC  (casa do Lula - ele tá cercado).

Do portal Terra: "Centenas de manifestantes que protestam nas ruas de São Bernardo do Campo, no ABC Paulista, na noite desta quarta-feira, fizeram um ato em frente ao prédio onde o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem um apartamento".

Também no twitter – retuitado pelo Bruno Ribeiro (‏@brsamba): "Agora as coisas ficarão mais claras. Saberemos quem protestava pelos R$ 0,20 e quem quer o Golpe" (concordo).

Por enquanto é isso.


terça-feira, 18 de junho de 2013

Não é uma mudança pro futuro, é pra já



Foto: Mídia Ninja (clique para ampliar)
Centro de São Paulo, hoje (18) à noite


Por Gabriel Megracko*

Acho curioso que isso tudo aconteça durante um período hegemônico do PT. Estive por aí ontem à noite, andei com as pessoas, fui até a Berrini e depois até a Paulista. Eu, Gisely, Anna, Jaqueline e Abdo, meu "primo" sírio-libanês e novo morador da nossa casa. Pegamos ainda uma carona, na Marginal Pinheiros (fato inédito porque em quatro pessoas – Jaqueline ainda não estava – e menos de cinco minutos!). Não tinha jeito de pegar trem e menos de ir a pé, a gente já tinha andado a Faria Lima toda e o trem estava impraticável. Pegamos uma carona com um negro muito engraçado. Concluímos que estávamos em dois italianos, uma índia, um muçulmano, um negro e que em hipótese alguma poderíamos ser parados. 

Ao deixar a gente perto da Brigadeiro Luís Antônio, pegou sua mulher e sua filha, negras, que entraram assim que saímos do carro. Foi algo arquitetado pelo cosmos. E assim foi no geral, algo conspirado pelo cosmos. As pessoas estavam todas muito solícitas, dispostas ao diálogo, paravam seus veículos caros para as pessoas passarem, "burgueses" buzinando seus carros no ritmo e sorrindo. Aí é que começo a achar mais esquisito que curioso. Sim, não é uma impressão, é um movimento da classe média pra cima!, talvez por enquanto. Topamos com um trabalhador fodido e injuriado com tudo isso. Claro, ele estava com a sua razão particular. E como você vai dizer pra ele não ir trabalhar suas 12 horas de trabalho braçal para ir a manifestações? Mas, também claro, as manifestações têm mesmo que ser feitas por quem pode, é obrigação de quem pode trabalhar por quem não pode (resta saber se é esse o rumo). É a lei invariável da energia e vai mal quando não é assim.

Antes de continuar escorrendo sobre a coisa, gostaria de dizer que isso é antes uma necessidade de reorganização da disposição das energias, exatamente por não haver uma questão que justifique a multidão que vi ontem, uma coisa sem precedentes pros meus olhos. É óbvio que isso não está acontecendo só por uma reivindicação como diminuição da tarifa do transporte público, isso não é nem décimo. Era muita, muita gente. E a pergunta: pode a massa toda junta dar um tiro no pé? Claro que sim. Acho que sim? Acho que não. Mas ouvi muitos e fortes coros contra Dilma e Haddad (mas acho que eram os trotskistas anacrônicos) e uns poucos e fracos contra Alckmin (em quem os trotskistas anacrônicos não pensam tanto quanto deviam), mas estavam todos juntos. Será que as pessoas, mesmo classe média aspirante a burguês (que, como diz a Marilena Chaui, "são burros, porque não vão ficar burgueses trabalhando já que não detêm os meios de produção"), estão ficando sensíveis aos problemas sociais? Acho que sim, é uma tendência do desenvolvimento da cidadania de um povo, e essa é a tendência da América Latina e é, em meio a outras questões mais particulares, uma determinação do Banco Mundial para assegurar o progresso do padrão neoliberal. 

No caso das nações desenvolvidas, o problema só muda de foco. É a Nação desenvolvida à custa da servidão subdesenvolvida de outras nações. Só que os carrascos de hoje em dia têm como ferramenta de tortura a micromatemática utilizada nos golpes financeiros que se aplicam aos, enfim, flagelados e, se for necessário, usa-se a força apenas para erguer a muralha e bloquear os revoltosos; nisso, a separação por fronteiras nacionais dificulta muito uma revolta, se uma nação não tem poder de ação no mercado mundial. Cara, a coisa tá clara: a coisa tá obscura. Não no pior sentido da coisa, mas simplesmente porque é uma incógnita e se for pro lado errado será trágico. O que foi aquilo que vi ontem? Qual o rumo? Muitos cartazes conversando sobre "corrupção". Sim, corrupção é ruim, mas pode ser pior. A corrupção na política? Mas se a palavra "política" está corrompida... bom, espera. Volta. 

O que será que era aquilo? Protestos contra a corrupção? Bingo!: não era. Isso é justamente o que não é. Era um protesto contra a "política"! Ali havia muitos "corruptos" (e não "corruptos" também), mas estavam protestando, não só com gritos, porque não havia mesmo um epicentro temático, mas o coro mais recorrente era "ô ô ô, o povo acordô", e estava ali, lá, em todos os lugares! 

Tem-se a sensação de que algo aconteceu, mas o quê? Não sei, sou desconfiado, mas estou otimista por um motivo que é intrínseco a todas as pessoas e só não é melhor aproveitado porque é constantemente bloqueado: o que sinto em mim, no meu organismo: corpo e alma. Algo fundamental se alterou em mim. Não ontem, claro, mas as coisas têm mudado muito e num ritmo acelerado. 

E percebo claramente isso nas pessoas e gosto do que vejo. Sinto o tempo se expandindo e os espaços sendo preenchidos, lentamente, é verdade, mas progressivo. E, aqui, eis o mais importante, na minha opinião: não é uma mudança pro futuro, é pra já. E... será que há um (in)consciente coletivo que está tendendo a entender que a única forma de melhorar o futuro é melhorando o presente, agora, hoje!? Seria um presentão, ahn? Mesmo porque o passado se altera plasticamente conforme o presente muda. Estranho, as pessoas decidiram sair na rua.

*Gabriel Megracko, 29 anos, é poeta

domingo, 16 de junho de 2013

Início da Copa das Confederações mostra Brasil muito inferior a Espanha e Itália


Reprodução
Iniesta: joga tudo e mais um pouco
É indiscutível a supremacia de Brasil (3 a 0 contra Japão), Itália (2 a 1 sobre o México) e Espanha (2 a 1 ante o Uruguai). Mas a superioridade brasileira é discutível, até porque o time do Japão é muito ruim. O Brasil de Scolari é mais suscetível ao imponderável do que Itália e Espanha, times feitos e entrosados. 

A Espanha peca pela soberba. Poderia ter levado o empate do Uruguai nos últimos 5 minutos numa partida em que massacrou no primeiro tempo, fazendo o Uruguai de bobinho com uma posse de bola de mais de 77%, se não me engano. É inegável que o time espanhol é espetacular. Iniesta, um dos maiores craques que se viu desde Zidane, cujo enorme talento é ainda otimizado pela companhia de Xavi e Fábregas. O problema do time de Vicente Del Bosque parece ser o preciosismo que faz jogos fáceis se complicarem justamente pela soberba. Tocam tanto a bola que às vezes se esquecem que, como dizia o narrador, "o que vale é bola na rede".

O Brasil é ainda "um time em formação", como se diz. O problema é que a Copa do Mundo já começou, por assim dizer, já que a Copa das Confederações é um ensaio para o Mundial e um ano passa muito rápido. Felipão é obsoleto e conservador. Joga com um time "compartimentado", previsível. Neymar pela esquerda, o brucutu ofensivo Hulk pela direita, o ainda inconvincente Oscar como meia e os volantes Luiz Gustavo e Paulinho para proteger a zaga, Paulinho fazendo na seleção o que sempre fez, e muito bem, no Corinthians: o volante que vira elemento surpresa e chega à frente para concluir. Mas o time não tem varições táticas. É, repito, previsível; mostra buracos entre os setores; tem um goleiro ultrapassado.

A "crônica esportiva" elogiou muito o ex-são paulino Oscar, que se mudou para o Internacional para fazer a ponte para o Chelsea, onde joga. Quero ver ele jogar não contra o Japão, mas contra Espanha ou Itália. A mim, não agrada. Precisaríamos de um Ganso, mas o Ganso infelizmente não se ajuda.

Na primeira rodada da Copa das Confederações, quatro golaços: o de Neymar contra o Japão (que, sendo o gol mais bonito do fim de semana, vai abaixo);



o do italiano Pirlo, de falta, contra o México; o do espanhol Soldado no massacre contra o Uruguai no primeiro tempo; e o do uruguaio Luis Soares no finzinho no mesmo jogo, tento que quase deu chance à Celeste Olímpica de aguar o chop do baile espanhol até então. (Há quem ache que gol de falta nunca é golaço, o que me parece uma implicância tola.)

Sobre a Itália, uma observação: tenho amigos que têm verdadeiro ódio do futebol italiano. Só que o futebol clássico da Itália é indiscutivelmente belo, admita-se ou não. Você não vê a defesa italiana dar chutão. Mesmo pressionados, os zagueiros saem tocando a bola. O meio campo, com Pirlo e De Rossi, faz a bola rolar, os espaços aparecem. Não vi um chutão da defesa italiana em 90 minutos de jogo contra o México. Veja quantos chutões dá o time de Felipão numa partida. Mas essa observação sobre o time da Itália não é apenas relativo a esse time de hoje, especificamente, e sim sobre a escola italiana, não por acaso quatro vezes campeã mundial.

Em suma, três vitórias indiscutíveis: a brasileira, sobre o frágil Japão; a italiana, ao estilo da Azzurra, fazendo o suficiente para bater o sempre perigoso México, mas com autoridade e categoria; e a espanhola. Vamos combinar, um timaço esse, da Espanha, diante de um aguerrido mas atônito Uruguai, numa partida que mais pareceu uma roda de bobinho, apesar do risco que os ibéricos correram no fim.

Em termos de time propriamente falando, Itália e principalmente Espanha estão em estágio visivelmente superior ao do Brasil. São equipes com um padrão definido, cada um com seu estilo, mas que entram em campo sabendo o que querem. A seleção brasileira parece que entra em campo tateando.

É preciso registrar que é enorme a supremacia técnico-tática do atual campeão europeu (Espanha) na comparação com o campeão sul-americano (Uruguai), assim como a da Itália e de ambos os times do Velho Mundo sobre o Brasil nos dias de hoje. Se a Copa do Mundo estivesse começando agora, diria que Espanha, Itália e Alemanha seriam favoritos diante dos claudicantes Brasil e Argentina, considerando o Uruguai apenas como um pálido e impotente figurante.

Para mim, o ganhador do Moto-Rádio nesta primeira rodada foi Iniesta. É provavelmente o maior jogador da atualidade. É, lembremos, o autor do gol do título da Espanha na final da última Copa do Mundo.

Fora os goleadores citados, destaque neste início de Copa das Confederações também para o italiano Balotelli, um bad boy que aterroriza qualquer defesa e é muito legal ver em campo.

Imprensa e manifestações

Quanto às questões extra-campo, lamentável mais uma vez a ação da polícia, agora em Brasília, contra manifestações e cidadãos. Porrada, bombas, tiros e repressão como não se vê desde a ditadura.

Na cobertura jornalística, o João Carlos Albuquerque, na ESPN Brasil, mostra que o chamado jornalismo esportivo não precisa ser medíocre. Enquanto isso, no Sportv, o comentário antes do jogo foi: "Infelizmente temos manifestação em Brasília". É o sistema Globo de sempre, com o cinismo característico.

O problema é que a ESPN não transmite a Copa das Confederações, que é direito da Globo. Então, há que se que escolher entre Sportv, Globo ou Band (concessão da caridosa Globo). É difícil saber o que é pior.


sábado, 15 de junho de 2013

Considerações sobre o confronto polícia x manifestantes



CC/DRAGO/SELVASP



Gostaria de fazer algumas considerações sobre o que estou observando no meu país, com o intuito de contribuir com o debate nas redes sociais.

- Está claro que a juventude não está mais indo às ruas por conta do aumento generalizado de tarifas de transporte pelo Brasil afora. Embora criticar os aumentos abusivos seja uma causa justa, isso está sendo o estopim para a expressão de uma insatisfação política muito maior. A esse estopim vem se somar a postura inflexível dos governantes eleitos pelo povo, mas que com o povo não aceitam sentar para negociar, além da ação truculenta e irresponsável da Polícia Militar.

- Os reprimidos de ontem se tornam os repressores de hoje. Embora o PSDB seja hoje um partido pseudo-social-democrata, que migrou para o liberalismo mas ainda não teve coragem de mudar o nome, ainda tem em seus quadros muita gente que lutou contra a ditadura militar. Sobre o PT, é ainda mais lamentável ver gente como José Eduardo Cardozo tratando manifestantes como vândalos e baderneiros. O problema é que o meu ceticismo me diz que os reprimidos de hoje tendem a se tornar os repressores de amanhã. Essa é uma marcha histórica que infelizmente nunca foi rompida.

- O discurso cínico de restabelecimento da ordem não cola mais. Está claro, até pela cobertura da imprensa (que invariavelmente é intolerante e boçal em relação à rebeldia, mas que teve de engolir a realidade dos fatos), que quem começou a desordem de ontem foram as "forças da ordem", que aplicaram força desproporcional e contribuíram para generalizar o caos ao contrário de garantir que uma manifestação pacífica continuasse transcorrendo de forma pacífica, sem degenerar em violência.

- O movimento está crescendo, e a truculência e intolerância com que está sendo tratado é que está contibuindo para que vire uma bola de neve. Uma hora os donos do poder vão ter que sentar para conversar com os "baderneiros", ou então a tendência é que a situação se agrave cada vez mais. Não é com tropa de choque e cacetadas que se tratam as manifestações democráticas. E isso prova que o governador do Estado não tem moral para falar jamais em "aula de democracia".

*Felipe Cabañas da Silva, 29 anos, é professor de Geografia

Isolar Haddad é um erro da esquerda paulistana


Tenho lido nas redes sociais, principalmente no Facebook, algumas manifestações apaixonadas sobre o que está acontecendo em São Paulo e no país, e que poderia ser midiaticamente rotulado como Occupy São Paulo, Occupy Rio de Janeiro etc. 

Li, por exemplo: “Já são 10 anos e os caras se perderam. Ou renasce uma oposição ou nós perderemos juntos”.

A referência (“os caras” que “se perderam”) é ao governo popular eleito pelo povo brasileiro, principalmente os nordestinos, em 2002, 2006 e 2010?

Não sou petista. Nunca me filiei a nenhum partido. Mas me parece óbvio – e a história é farta em exemplos – que um dos maiores erros que se podem cometer na política é fazer julgamentos precipitados sobre fatos que só futuramente serão história. No Brasil, esse equívoco se repetiu várias vezes. Talvez o golpe de 1964 fosse inexorável, pelos superpoderosos interesses norte-americanos que por fim acabaram vencendo e instalando as ditaduras nos principais países da América do Sul ao longo das décadas de 60 e 70 do século passado. Mas, com certeza, a divisão da esquerda facilitou o trabalho dos golpistas de derrubar João Goulart. Em suma, a paixão não é o melhor instrumento para se pensar a história.

Em 1989, a esquerda novamente se dividiu, entre Lula e Brizola, e Fernando Collor de Mello foi eleito presidente da República Federativa do Brasil. O que custou muito caro ao Brasil. E também a mim, na minha carreira profissional e na minha vida como cidadão.

Estamos no primeiro mandato de Dilma Rousseff após dois mandatos do metalúrgico Lula, depois de dois mandatos de FHC e, daí para trás, após Itamar Franco, Collor, Sarney, João Baptista Figueiredo e a ditadura. 

Digo tudo isso para falar sobre estratégia. Acho equivocado, do ponto de vista da esquerda, isolar o prefeito Fernando Haddad na atual conjuntura. Não estou nem considerando proselitismos políticos baratos como o de Plínio de Arruda Sampaio, por exemplo.

Se não me engano foi em 2003, ano do primeiro mandato de Lula, que o cearense Ciro Gomes, ex-governador do Ceará, então ministro da Integração Nacional, disse à revista Fórum que a esquerda precisava entender que, se se dividisse mais uma vez, naquele momento, e não entendesse o significado da eleição de Lula, poderia levar mais 30 anos para voltar ao poder. 

Quando explodiu o escândalo do “mensalão”, em 2005, e muitos petistas de “alta plumagem”, como o gaúcho Tarso Genro, defendiam a “refundação” do PT, o não petista Ciro Gomes deu a cara a tapa e defendeu o governo Lula. Nos intestinos do Partido dos Trabalhadores, Valter Pomar, por exemplo, escrevia artigos para manifestar sua discordância da visão de petistas conformistas como Tarso Genro (e uso o termo "conformista" como referência do cinema, a referência de Bernardo Bertolucci).

No momento é importante saber quem está e quem não está a favor do diálogo. 

sexta-feira, 14 de junho de 2013

Pensamento para sexta-feira [44] – Hamlet: Ser ou não ser – eis a questão



Ato III, Cena I, de Hamlet (Shakespeare) – trecho

Ser ou não ser – eis a questão.
Será mais nobre sofrer na alma
Pedradas e flechadas do destino feroz
Ou pegar em armas contra um mar de angústias –
E, combatendo, dar-lhe fim? Morrer; dormir;
Só isso. E com o sono – dizem – extinguir
Dores do coração e as mil mazelas naturais
A que a carne é sujeita; eis uma consumação
Ardentemente desejável. Morrer – dormir –
Dormir! Talvez sonhar. Aí está o obstáculo!
Os sonhos que hão de vir no sono da morte
Quando tivermos escapado ao tumulto vital
Nos obrigam a hesitar: e é essa reflexão
Que dá à desventura uma vida tão longa.
Pois quem suportaria o açoite e os insultos do mundo,
A afronta do opressor, o desdém do orgulho,
As pontadas do amor humilhado, as delongas da lei,
A potência do mando, e o achincalhe
Que o mérito paciente recebe dos inúteis,
Podendo, ele próprio, encontrar seu repouso
Com um simples punhal? Quem aguentaria fardos,
Gemendo e suando numa vida servil,
Se não porque o terror de alguma coisa após a morte –
O país não descoberto, de cujos confins
Jamais voltou nenhum viajante – nos confunde a vontade,
Nos faz preferir e suportar os males   que já temos,
A fugirmos para outros que desconhecemos?


quarta-feira, 12 de junho de 2013

Que venga el loco Bielsa


Reprodução
Uma das últimas entrevistas no Bilbao
Se for concretizada, a contratação de Marcelo “Loco” Bielsa para comandar o Santos seria uma grande tacada do time da Vila mais famosa do mundo.

Ele estaria vindo a Santos, talvez nesta quinta-feira, para conhecer a estrutura do clube. Especula-se que ele quer assumir só em janeiro e que um auxiliar dividiria o comando do clube com Claudinei Oliveira no Brasileiro. Mas tudo são especulações. "Não tem nada disso. Ele não vem para a cidade nos próximos dias. Ainda tem muita coisa para ver e, depois, tentar um acerto com ele", disse agora há pouco Odílio Rodrigues Filho, presidente do clube em exercício, segundo o jornal A Tribuna, de Santos*.

O treinador é conhecido por adotar um esquema tático ofensivo, o que se enquadra perfeitamente no espírito do Santos. O torcedor santista de modo geral não suporta “futebol de resultado”, retranca, chuveirinho e muricysmos.

A possível vinda do argentino daria uma renovada no chamado mercado, dominado pelos nomes de sempre, que não preciso mencionar. Questionam o valor que Bielsa ganharia. Fala-se em R$ 700 mil. É muito? É. Nenhum técnico deveria ganhar isso. Mas é mais ou menos o que Muricy Ramalho ganhava, para fazer aquele trabalhinho sem-vergonha. 

Outra característica de Bielsa é sua facilidade de trabalhar com garotos. Ou seja, no Santos, que tem a tradição de ser uma fábrica de craques e está atualmente lançando uma nova safra com Gustavo Henrique, Leandrinho, Pedro Castro, Léo Cittadini, Neílton e outros, cairia como uma luva.

Não conheço profundamente o trabalho de Bielsa. Leio, porém, declarações de personagens do futebol que vale a pena reproduzir. Pep Guardiola, ex-treinador do Barcelona e agora no Bayern de Munique, que diziam ser descartável no ex-“melhor time do mundo”, já que o Barça “tem uma escola que independe de treinadores”, disse sobre o argentino em março de 2012: “Estamos diante do melhor técnico do planeta na atualidade. Faz um jogo honesto, dando seu máximo e atacando ganhando ou perdendo". 

Outro que não economizou elogios a Bielsa recentemente é o ex-jogador e hoje treinador Jorge Valdano, que marcou um gol pela Argentina na final da Copa de 1986: “É um dos treinadores mais generosos que conheci. Quando eu digo a palavra generoso me refiro ao jogo. Ataca com vários jogadores, leva a bola a partir do fundo, renuncia à catimba por sua obsessão ética, e mesmo quando está ganhando continua atacando como se o mundo fosse acabar”.

Entre suas conquistas como técnico, Bielsa ganhou cinco vezes o campeonato argentino (quatro pelo Newell's Old Boys e um pelo Vélez Sársfield). Perdendo para o poderoso Barcelona na temporada 2011-2012, foi vice-campeão da Copa do Rei na Espanha, pelo Athletic Bilbao, de onde acaba de sair e era adorado pela torcida. Pelo time basco, foi ainda vice-campeão da Liga Europa de 2011-2012, perdendo a final para o Atlético de Madrid.

Como técnico da seleção do Chile, fez um belo trabalho e levou a equipe à Copa do Mundo de 2010. Ganhou também a medalha de ouro com a seleção argentina nos Jogos Olímpicos de 2004.

Entonces, que venga el loco Bielsa.

Em tempo, o Santos do interino Claudinei Oliveira e recheado de jovens da base, bateu o Atlético-MG na Vila, por 1 a 0, e deixou hoje a zona de rebaixamento.
*Atualizado à 00:13

terça-feira, 11 de junho de 2013

Blitz evangélica contra o Estado laico, a cidadania, as mulheres e a ciência



A garantia do Estado laico obsta que dogmas de fé determinem o conteúdo de atos estatais. Concepções morais religiosas, quer unânimes, quer majoritárias, quer minoritárias, não podem guiar as decisões estatais, devendo ficar circunscritas à esfera privada.” (Marco Aurélio Mello, ministro do STF, em julgamento que autorizou o aborto em casos de anencefalia)


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A ciência também está na mira da blitz evangélica
É com justa indignação que todas as pessoas preocupadas com cidadania, estado laico e conceitos afins devem encarar a atual conjuntura, embora não seja, para mim, crível que um projeto com o teor obscurantista e medieval do tal Estatuto do Nascituro venha a vigorar no país.

Até porque, no limite, o Supremo Tribunal Federal deve fazer valer seu “poder de veto”, digamos assim, já que há pouco mais de um ano a corte convalidou o estado laico e o direito da mulher ao autorizar o aborto em casos de anencefalia.

No voto que proferiu no julgamento citado, o ministro Marco Aurélio argumentou: “O ato de obrigar a mulher a manter a gestação, colocando-a em uma espécie de cárcere privado em seu próprio corpo, desprovida do mínimo essencial de autodeterminação e liberdade, assemelha-se à tortura ou a um sacrifício que não pode ser pedido a qualquer pessoa ou dela exigido”.

Será meramente o medo de perder votos diante de argumentos moralistas desprovidos de qualquer senso científico o que cala o governo Dilma diante da atual blitz evangélica? A chamada bancada evangélica conta com 70 deputados e 3 senadores. Corresponde a 13,6% dos 513 deputados, 3,7% dos senadores e 12,2% do conjunto do Congresso Nacional. O silêncio do governo e de seus principais líderes diante do avanço pentecostal é um mistério matemático.

Politicamente, o cálculo político do governo e da chamada esquerda pode estar se equivocando gravemente, como aconteceu na “omissão ou leniência” do PT, como me disse o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) outro dia, que redundou na “tomada” pelos parlamentares de Cristo da Comissão de Direitos Humanos e Minorias na Câmara.

O monstro chamado Estatuto do Nascituro é a contra mão de tudo o que vem acontecendo no mundo, apenas para ficar no exemplo mais recente. Como lembram organizações feministas em petição divulgada contra esse projeto espúrio, ele “amplia a criminalização do abortamento para as situações que hoje são permitidas por lei”. Até mesmo as mulheres que têm o direito ao acesso ao aborto previsto em lei seriam criminalizadas: nos casos de risco de vida, de estupro e de fetos anencéfalos, que o Supremo Tribunal Federal considerou constitucionalmente válido há pouco mais de um ano.

“O projeto torna a maternidade compulsória mesmo para as vítimas de estupro que serão obrigadas a suportar a gravidez resultante do crime”, lembra a petição. “A situação é especialmente preocupante considerando o grande número de crianças e pré-adolescentes grávidas em decorrência de abuso sexual”. 

“O projeto obrigaria vítimas de pedofilia a suportar gestações que, além de traumáticas, são de alto risco, pois seus corpos não estão completamente formados. É uma situação análoga a da tortura, tratamento cruel, desumano e degradante”, continua a petição das feministas.

Quem tiver a curiosidade de acessar a íntegra do projeto na Câmara dos deputados verá que ele reza no parágrafo único do artigo 2°: “O conceito de nascituro inclui os seres humanos concebidos in vitro, os produzidos através de clonagem ou por outro meio científica e eticamente aceito”. Ou seja, até mesmo as pesquisas com células tronco, também já autorizadas pelo Supremo, seriam banidas.

É algo definitivamente assombroso o parecer Comissão de Finanças e Tributação da Câmara aprovado na semana passada. Parecer, lembremos, do líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha, do Rio de Janeiro.

Segundo a deputada Érika Kokay (PT-DF), uma das poucas que têm se manifestado, “eles fazem parte de uma articulação para a construção de um projeto de poder baseado num estado onde uns podem amar, outros não; uns têm direito, outros não. Tomaram a comissão [de Direitos Humanos] para a construção desse projeto”.

Não acho que chegue a tanto. Mas seguro morreu de velho. "É preciso estar atento e forte."



sexta-feira, 7 de junho de 2013

Coisas que não podem acabar


Como todo mundo sabe, ou deveria saber, estamos numa época em que as coisas são descartáveis e nada que é “velho” faz sentido, porque o bom é consumir, consumir e consumir. Não apenas consumir, aliás, e sim consumir loucamente produtos novos, modernos e bonitinhos por fora, mas quase sempre indecentes no conteúdo.

Por isso me ocorre esse pensamento nostálgico, meio bobo, em coisas que não podem acabar.

Uma coisa que nunca pode acabar é o Chocolate do Padre. Que hoje é da poderosa Nestlé, mas foi fabricado a partir de 1921 por uma fábrica chamada Chocolate Gardano S.A. (foto), que foi comprada pela atual proprietária em 1957.

Realmente, não dá para viver sem o chocolate do padre. Tomar chocolate quente com leite com os horrorosos “achocolatados” que têm mais açúcar do que chocolate afronta um paladar minimamente exigente como o meu. E também ofende quem acha que comer alimentos saudáveis é o mínimo que se pode querer num mundo onde a gente se alimenta de lixo e ainda acha gostoso.

E as cozinheiras que gostam de fazer doce? Como vão fazer bolos e outras guloseimas de chocolate sem o chocolate do padre? Impensável. Até existem produtos similares, mas nada se iguala ao tradicional e eterno chocolate do padre.

Obra do pintor Alessandro Sani
Agora, o interessante é que a imagem dos padres degustando algo muito saboroso é de um quadro do pintor italiano Alessandro Sani (1856-1927). E o mais engraçado é que, na obra pintada pelo artista, o que eles experimentam e se vê ao lado deles, numa travessa, é um frango ensopado. Nada a ver com chocolate! Se você observar ao comprar uma caixa no supermercado, verá que a atual dona da marca inverteu a imagem. Na ilustração da Nestlé, o padre da esquerda está na direita e vice-versa.



Uma vez, há muitos anos, perguntaram ao Gilberto Gil, numa daquelas entrevistas fúteis que cadernos de “variedades” adoram, o que ele usa como desodorante. “Talco Granado”, ele respondeu. Esse é mesmo um produto que não pode acabar. Serve para um monte de coisas, não apenas para você usar no lugar desses horríveis desodorantes que disfarçam o odor do corpo e deixam você fedendo perfume ultrabarato. "Polvilho Antisséptico Granado – Pharmácias – Desde 1870", pode-se ler na embalagem.

Serve para frieiras, como desodorante, alguns tipos de micoses simples, para assadura de bebês e sei lá mais o quê. Como imaginar o mundo sem ele?


A manteiga Aviação é outro produto muito caro a quem gosta, no caso, de uma manteiga que tem gosto. E é gordurosa. Porque esse negócio de hoje em dia tudo ter versão light é um pé no saco.

Às vezes acontece de você entrar no supermercado e não consegue encontrar numa gôndola um requeijão ou uma manteiga que não seja light. Se eu fosse presidente do mundo por um dia, eu proibia produtos light.


O Catupiry, entre as coisas que não podem acabar, é controverso. Tem gente que adora e tem gente que odeia. Eu gosto dele pra passar no pão, como alternativa à insubstituível manteiga quando você quer dar uma variada.

Mas concordo que a obsessão por Catupiry pode ser prejudicial à tradição. Hoje em dia, tudo tem que ter Catupiry. É um negócio que irrita. A velha e boa coxinha, você chega numa padaria metida a chique, pede uma coxinha, e o cara responde perguntando: "com Catupiry ou sem Catupiry?". Ou seja, o tradicional requeijão é melhor do que qualquer outro, na minha opinião, não pode acabar, mas sem exageros. Como dizia minha avó, "tudo o que é demais enjoa".

Maizena é outro produto que me provoca profunda simpatia e eu acho que não deveria acabar. O gozado é que, embora goste de cozinhar, eu na verdade nunca usei e não sei o que fazer com Maizena, que nada mais é do que amido.

Numa rápida pesquisa, descubro que com ela se pode fazer torta, bolinhos, pizza, bolos, molhos e uma infinidade de coisas gostosas. Leio na Wikipedia que para significar amido de milho “usa-se também a palavra maisena, derivada do taíno (língua indígena das Antilhas), maís, pelo espanhol maíz, significando ‘milho graúdo’”. “Amido de milho é o nome que se dá à farinha feita do milho, e usada na culinária como substituto da farinha de trigo ou para o preparo de cremes, como espessante.”

Palavra que vou passar a tentar usar a velha e boa Maisena em algumas receitas.

E como não citar o insubstituível Lysoform, que agora há pouco coloquei na máquina de lavar para bater umas calças jeans? Hoje em dia você vai num supermercado e tem tantos produtos de limpeza e tantas cores e utilidades específicas que eu realmente não consigo comprar. Fico perdido.

Lysoform eu compro, mas geralmente na farmácia. Serve para limpar e desinfetar roupas, e não precisa usar os tais amaciantes com aquele cheiro enjoado de sabonete Gessy.

O Lysoform serve também para lavar banheiro, se não quiser usar cândida (que é como a gente chamava antigamente a água sanitária).

Aliás, por falar em farmácia, lembro do Neutrox, “referência em tratamento capilar há 38 anos e que oferece tecnologia e uma excelente relação custo-benefício”, como li num site.

Aquele “creme rinse”, como a gente falava, era sensacional. Ou ainda é? Não sei, outro dia procurei na farmácia e achei a “linha reformulada”, com um monte de produtos, uma gama de soluções para todo tipo de problemas e cabelos e situações.

Fiquei triste, pois o velho e bom Neutrox tradicional, com aquela embalagem cilíndrica amarelinha, e o produto igualmente amarelinho que você punha no cabelo depois de lavar, esse não achei. Terá sido lamentável se tiverem acabado com o Neutrox básico, que me lembra a infância na praia. Era um remédio perfeito contra o mal que a água do mar e o sol faziam para o cabelo.

E a pomada Minancora, quem nunca usou contra espinhas? A pomada fiel à família brasileira desde 1915, composta de óxido de zinco (0,200g/g), cloreto de benzalcônio (0,005g/g) e cânfora (0,050g/g). A não ser a cânfora, não tenho a menor ideia do que sejam os outros compostos. Mas para espinha na cara adolescente, servia, e como. Usava-se para perebas em geral, para assadura de bebê e um monte de coisa, até para herpes. Leio no site do produto que “é indicada para o tratamento de doenças de pele, como espinhas, frieiras (desidroses) e escaras”.

Não sei se ainda existe. Vou procurar a Minancora numa farmácia, faz muitos e muitos anos que não compro.

Já a Água de Rosas, essa eu nunca usei. Mas diz que é muito útil e antiga. É muito utilizada para limpeza de pele e “é produzida pelo povo árabe desde o século IX. Alguns pesquisadores acreditam que foram os indianos os criadores do produto, já outros pensam que surgiu ao mesmo tempo na Índia, Bulgária e mundo árabe.”

Vou procurar na farmácia também.




*Publicado originalmente à 01:26 de 6 de junho de 2013

Favoritos do cinema (7): Os outros



Nicole Kidman, exuberante no filme de Alejandro Amenábar

Quando era criança, havia uma sessão semanal de cinema na TV Bandeirantes, à noite, não lembro se às sextas-feiras ou sábados, chamada Cine Mistério. Eu ficava vendo aqueles filmes com minha avó Emiliana. Era imperdível. Drácula e lobisomem eram protagonistas frequentes. Eram exibidos "clássicos" no gênero ficção como O incrível homem que encolheu, A mosca da cabeça branca e tantos outros. Acabada a sessão, ia minha avó para o seu quarto e eu, olhando atentamente para as sombras da casa, para o meu; perscrutando o medo, deitava sob as cobertas que me protegiam. Como era bom aquele medo!

Faço a digressão para chegar ao cinema contemporâneo e falar que, no gênero terror, como a gente dizia, um dos filmes mais impressionantes é Os outros (2001), dirigido por Alejandro Amenábar, estrelado por Nicole Kidman. No filme, a grande atriz australiana interpreta Grace, uma mãe superprotetora que vive com seus dois filhos numa casa grande e isolada. Solitária, ela espera o marido, que é soldado e foi aos campos de batalha da Segunda Guerra Mundial.

Os outros tem uma proposta semelhante a O sexto sentido (direção de M. Night Shyamalan – 1999), outra ótima produção, que, além de ser um grande filme, mostra que Bruce Willis, embora tenha preferido trilhar o caminho das superproduções enlatadas, tem grande domínio da chamada arte de interpretar, assim como acontece em Pulp Fiction, de Tarantino. Mas, digressões à parte, o filme de Amenábar é superior ao de Shyamalan. Os outros inverte uma lógica que seria perverso eu contar aqui, pois tiraria a surpresa de quem não viu o filme (detesto críticos de cinema sacanas e "onipotentes" que contam as histórias e finais dos filmes).

O suspense de Os outros é um elemento muito bem trabalhado, assim como a direção de atores, fotografia e roteiro. A interpretação de Nicole Kidman é magnífica, como de resto é normal para ela. No transcorrer do filme, às vezes você tem a impressão de que o roteiro vai redundar num clichê. Parece mesmo, à certa altura, que você está assistindo a um filme banal. Mas quando você pensa que está de fato diante de uma história sem nenhuma pretensão é que entende a maneira pela qual Amenábar inverte a lógica e fica então claro o significado do título Os outros, título que a versão brasileira manteve do original em inglês, The others.

Há cenas muito bonitas e impressionantes. Como a da criada que olha pela janela e comenta sobre aquele dia spleen, cinza, em que não se ouve sequer o som dos pássaros. Ou soluções de roteiro como o papel das crianças, que não podem se expor à luz porque sofrem de uma doença estranha. Ou as cortinas... Esses e outros elementos se acumulam na história e só no fim esses enigmas que vão sendo lançados no decorrer do filme são esclarecidos. Os outros é um filme interessante de assistir mais de uma vez. Porque se pode entender melhor algumas soluções de roteiro e cenas que, ao ver pela primeira vez, passam despercebidas.

Assim como O sexto sentido, Os outros se vale de elementos claramente espíritas. Ou seja, ambas as películas não são construídas a partir de elucubrações tolas (o que é fatal para filmes do gênero), mas de conceitos estabelecidos na doutrina de Alan Kardec e suas ramificações. 

Mas não assista a esse filme em versão dublada. A observação faz sentido porque já ouvi algumas pessoas dizerem “ah, eu vi esse filme, mas vi dublado”. Com certeza, quem viu dublado perdeu tempo e a chance de mergulhar na atmosfera assustadora de um filme incrível. Se você viu dublado, reveja legendado.


Leia também, da série Favoritos do cinema:

"Quando explode a vingança", de Sergio Leone

Fargo (irmãos Coen)

Era uma vez no Oeste - Sergio Leone e o faroeste de cinéfilo italiano

Os Incompreendidos", de François Truffaut

Pasolini

Acossado, de Godard


*Publicado originalmente à 00:24 de 3 de junho de 2013

Protesto (contra aumento de ônibus) em São Paulo não tinha trabalhador


Paulo Henrique Amorim, do Conversa Afiada


As passagens de ônibus e metro aumentaram de R$ 3,00 para R$ 3,20.

E tão pouco, porque a presidenta Dilma Rousseff e o prefeito Fernando Haddad negociaram a retirada de impostos que incidem sobre passagens.

Por isso, em algumas cidades de São Paulo, como São Bernardo, o prefeito se deu ao luxo de reduzir o valor da passagem.

Ainda assim, um conjunto de jovens brancos e de classe média parou São Paulo na noite desta quinta-feira, com depredações e confrontos.

Não havia ali um único negro.

Parecia convenção do PSDB de São Paulo.

Não havia um único trabalhador, que, como observou o Chico Pinheiro no Mau Dia Brasil, estava no trem, no metrô, de volta pra casa, depois de um dia de trabalho.