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sexta-feira, 15 de janeiro de 2016

Pensamento para sexta-feira [63] - My Death (Minha Morte), de David Bowie





Minha Morte (My Death - David Bowie)

Minha morte espera como uma velha libertina 
Então, confiante seguirei seu caminho 
Assobiarei para ela e o tempo que passa...

Minha morte espera como uma verdade da Bíblia 
No funeral da minha juventude 
Estamos orgulhosos por isso e o tempo que passa?

Minha morte espera como uma bruxa na noite 
Tão claramente quanto nosso amor é certo 
Não vamos pensar no tempo que passa...

O que quer que esteja atrás da porta 
Não há muito a fazer 
Anjo ou demônio, eu não me importo 
Porque na frente daquela porta está você 

Minha morte espera como um mendigo cego 
Que vê o mundo através de uma mente opaca
Dê uma moeda a ele pelo tempo que passa...

Minha morte espera para permitir a meus amigos
Alguns bons momentos antes do fim 
Então bebamos a isso e o tempo que passa

Minha morte espera lá entre suas coxas 
Seus dedos frios fecharão meus olhos 
Não vamos pensar sobre o tempo que passa

O que quer que esteja atrás daquela porta
Não há muito a fazer 
Anjo ou demônio, eu não me importo 
Porque na frente daquela porta está você 

Minha morte espera lá entre as folhas 
Nas misteriosas mangas do mágico 
Coelhos e cachorros e o tempo que passa...

Minha morte espera lá entre as flores 
Onde as mais escuras sombras se encolhem 
Então vamos colher lilases pelo tempo que passa...

Minha morte espera lá em uma cama de casal 
Panos do esquecimento e minha cabeça 
Então, puxe teus lençóis contra o tempo que passa

O que quer que esteja atrás da porta 
Não há muito a fazer
Anjo ou demônio 
Eu não me importo, porque na frente daquela porta está você



sexta-feira, 28 de agosto de 2015

Pensamento para sexta-feira [62] - Baladeur de Ozzie Gheirart



Diego Limberti


A música de Ozzie Gheirart, segundo ele, é produzida "de forma caseira, usando garage band". O próprio autor assim define seu trabalho:

"O projeto Baladeur saiu do meu doutorado - em antropologia. É um personagem que aposta no pensamento poético como possibilidade de reinventar a vida. Seria um flaneur do mundo contemporâneo.
Ele transita por diversas camadas da realidade e aproveita a pluralidade de formas criativas para se expressar. Como o nome Baladeur tem vários sentidos (walkman em inglês; balada é caminhada, é um tipo de poema e um tipo de composição musical), tento mesclar diversas linguagens e narrativas.
Para compor, utilizei ferramentas simples, a que qualquer pessoa tem acesso: computador, celular etc. Convidei artistas para participar, músicos, pintores, poetas, estilistas etc. O projeto é coletivo e investi pouquíssimo dinheiro.
A música é eletrônica, mas na sua totalidade flerta com vários estilos. Em especial, o rock." 

Ouça clicando neste link: Naquele Dia/Je Suis Trilili by Baladeur



sexta-feira, 31 de julho de 2015

sexta-feira, 22 de maio de 2015

Pensamento para sexta-feira [59] – Einstein



Wikimedia Commons


"Dois gêmeos idênticos marcam encontro em uma base de lançamento de foguetes. Um fica no solo, o outro inicia uma longa viagem em uma cápsula espacial. Atinge velocidades próximas à da luz, dá a volta em Sírius e volta à Terra. Segundo os relógios da base, passaram-se 100 anos. (Na volta) Os seus tataranetos fazem-lhe uma grande ovação. Ele pouco mudou. Em seu relógio de bordo passaram-se 3 meses."

(...)

"Nas vizinhanças do sol, os trilhos curvos do espaço alteram o curso dos raios luminosos. É por isso que nos eclipses se podem ver as estrelas que o disco solar normalmente deveria ocultar. Mesmo desviada pela massa do sol, sua luz chega até nós. Este fato, previsto por Einstein, foi verificado quando do eclipse de 1919 (...) 'Não compreendo, como é ´possível?', dirá o homem de bom senso. A resposta é que nada há para ‘compreender’. Negar o que se vê porque o que se vê não está de acordo com o que se pensa é bancar o avestruz."

"O tempo absoluto dissipou-se sob o olhar inquisidor de Einstein."


(Trechos do livro Um Pouco mais de Azul, de Hubert Reeves – editora Martins Fontes)

sexta-feira, 8 de maio de 2015

Pensamento para sexta-feira [58] – Luis Buñuel


"No mundo burguês existem muitas falsas revoltas." (Luis Buñuel)




Luis Buñuel (1900-1983) foi diretor de alguns dos mais inquietantes e impressionantes filmes do século XX: Los Olvidados (1950), Simão no Deserto (1965), Viridiana (1961), O Anjo Exterminador (1962), A Bela da Tarde (1967), A Via Láctea (1969), O Discreto Charme da Burguesia (1972), Esse Obscuro Objeto do Desejo (1977), para citar algumas de suas grandes películas.

Buñuel era um dos surrealistas, mas, como o poeta Federico García Lorca, transcendeu essa escola e esse rótulo. A frase citada acima fala por si e é emblemática do gênio espanhol -- além de caber perfeitamente no Brasil de hoje, à esquerda e à direita.

Se você não assistiu a filmes desse inquieto e revolucionário diretor e gosta de cinema, não sabe o que está perdendo.

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

Pensamento para sexta-feira [56] - BARATAS (fatos reais)



"Agora eu só queria gelidamente uma coisa: matar cada barata que existe." (Clarice Lispector)

CRÔNICA DE VERÃO 2




Episódio 1

Eu costumava dizer com orgulho que moramos neste apartamento há mais de seis anos sem que nenhuma mísera barata tivesse aparecido por aqui. Sim, mais de seis anos. Estava quase me sentindo uma pessoa abençoada. Mas eis que de repente, algo aconteceu, na primeira semana de dezembro de 2014.

Eu estava pra sair de casa pra ir trabalhar quando me deu uma leve vontade de ir ao banheiro (necessidade número 2), e por prudência fui, e fui ao banheiro da área de serviço, porque a zeladoria tinha ligado minutos antes para informar que estava desligando a água do “banheiro social” por causa de um serviço de manutenção.

Fui então ao banheiro etc. Puxei a descarga, meio de costas, e quando me virei para fechar a porta do banheiro vi uma enorme barata. Mas, estranhamente, estava morta, muito morta, completamente morta.

Fiquei chocado, pois nunca tinha aparecido uma barata neste AP, nem viva, nem morta. Ela estava exatamente entre a porta, o tapetinho e a privada, onde teria sido impossível eu não tê-la visto ao entrar no banheiro ou enquanto eu estava ali, sentado.

Fiquei me perguntando: mas que diabo é isso? Peguei a pá e joguei a barata pela janela (no grande jardim onde há muitas árvores no condomínio), sempre me perguntando: mas como essa barata morta apareceu aí se não estava aí quando eu entrei no banheiro pra sentar na privada, num lugar tão visível que teria sido impossível eu não tê-la visto ao entrar?

Pensei no enigma, que exigiu de mim um esforço digno de Sherlock Holmes. A hipótese daquele exemplar da mais asquerosa das criaturas ter sido envenenada em alguma dedetização no condomínio, ter vindo tonta, subindo, até morrer ali, não era plausível, já que ela não estava lá quando entrei no banheiro.

Então, fez-se a luz e entendi. Antes de ir ao banheiro (estava meio frio pela manhã, apesar de ser dezembro), eu coloquei sobre o ombro uma blusa de lã azul que tinha levado à praia, nas férias, mas que ficou na mala sem uso. Como na praia tem muitas baratas e usei e abusei de um veneno de inseto, concluí, como um verdadeiro Hercule Poirot, que essa barata morta estava, já morta, desde a praia, dentro da blusa, envenenada pelo monte incalculável de baygon que esguichei nas dependências da casa da praia – pois num dos primeiros dias uma cena de horror aconteceu, quando descobrimos que baratas,  muitas, de repente corriam pelo chão da cozinha num certo início de noite, e foi aquela cena dantesca de baratas correndo até que conseguimos destruí-las todas, após descobrir que tinham feito um ninho. Enfim, a barata que apareceu morta no apartamento deve ter se escondido envenenada na blusa, e lá ficou. E justamente na hora em que me sentei na privada o maldito inseto morto caiu da blusa ali, por trás de mim, pela manga da blusa, pelas costas da blusa, sei lá.

Foi o que concluí.

Episódio 2

Está certo que a barata estava morta, mas aquilo me perturbou. Pois, morta ou não, era uma barata. Algo tinha querido dizer que já não éramos mais invulneráveis em nosso AP. Desde então, o apartamento nunca mais foi o mesmo.

E, de fato, como se aquele cadáver marrom fosse um aviso, cerca de 40 dias depois, num sábado de um calor insuportável, tarde da noite, eis que estava ali, na porta do armário da cozinha, vinda da escuridão da noite diretamente pela janela escancarada, uma gigantesca barata voadora, espreguiçando suas asas prontas para voar, logo acima de uma torta quentinha recém-tirada do forno. Com nossa súbita presença, lógico, ela voou. E todo mundo sabe o que significa uma barata voando numa cozinha de apartamento. Nem o mais bravo soldado mantém a dignidade.

A excomungada por fim se enfiou por trás de uma prateleira. Fomos tirando objeto por objeto, cada um com o cuidado e o temor de estar cutucando a mais terrível fera. Por fim, foi possível vê-la atrás de um vidro vazio, enorme, encaixada entre o frasco e a parede como se sempre tivesse estado ali. Para não correr o risco de ver o demônio de repente voar (é melhor cinco baratas tontas correndo no chão do que uma voando), já fui esguichando o veneno, com tanto gosto que poderia ter danificado a bomba que ejeta a nuvem de líquido mortífero. O animal asqueroso finalmente caiu no chão, correu, mas eu não esmoreci e continuei esguichando a nuvem, até que ela virou de costas, se debateu, e finalmente expirou (ao que parece, pois, como se sabe, as baratas têm uma característica assustadora: elas podem ressuscitar). Pelo sim, pelo não, coloquei-a na pá e atirei-a pela janela do oitavo andar.

Episódio 3

Foi hoje (12), menos de dois meses e meio após o funesto aparecimento da barata morta e pouco menos de um mês depois da barata voadora.

Por falta de opção melhor, comíamos uma pizza na sala quando, de repente, ouço um grito surdo, não escandaloso, mas de pavor, enquanto vejo algo voando baixo pela sala, que pude perceber ser um inseto ligeiramente grande, mas não muito.

Podia ser um besouro, mas imediatamente eu soube: era outra barata. Outra! Seis anos sem nada, nenhuma, e de repente, em 70 dias, uma morta e duas vivas!

Esta, embora menor, também era voadora (é melhor 5 baratas tontas grandes no chão do que uma média voando). E a maldita voou da sala para dentro do quarto. Já fiquei imaginando ter que dormir na sala ou, tarde da noite, desmontar o quarto atrás do famigerado inseto em algum dos infinitos cantos, dobras de roupa, interior de sapatos, por trás do colchão ou qualquer outro esconderijo onde pudesse entrar. Porque, se tem uma coisa que eu não faço, é dormir com uma barata no quarto. Mas, por sorte, ela estava na parede.

Sabem qual é a palava que designa fobia de baratas? Catsaridafobia. Ou seja, até o nome para esse medo causa repugnância.

Quando tirei o chinelo para destruí-la, ela voou, e veio na minha direção. Era só acertá-la em cheio, estava fácil, afinal sou ágil e mato até as ligeiras moscas com facilidade. Mas acontece que baratas são como espíritos que se materializam para perturbar as pessoas, e então errei a chinelada e, evidentemente, ela veio diretamente pra cima de mim, bateu na minha perna e correu para um lado, enquanto, claro, eu fui para o outro. Acho que não gritei, mas a única testemunha presente na casa (que havia gritado antes) afirma que sim.

Vi que ela se enfiou por baixo do criado-mudo. Peguei o veneno e esguichei. Arrastei o móvel e... cadê? Nada. Vários minutos depois, reapareceu correndo, embora tonta, na minha direção. Vi que esta era bem nojenta, meio esbranquiçada. Mais veneno. Com gosto. Ela rodopiou, correu mais um pouco e, filha da puta, entrou numa fresta do armário embutido, no canto da parede. Enfiei o bico do baygon no buraco e injetei uma dose aparentemente letal, até porque aquele buraco não tem saída, a não ser por onde ela entrou. Mas a desgraçada não saiu. Ficou lá. Acredito que tenha morrido. Mas baratas muitas vezes gostam de te deixar na dúvida. Mesmo mortas, como fantasmas em forma de insetos.

É por isso tudo, além do calor intolerável (e pelos relatos nos links abaixo), que eu odeio o verão.


Leia também da série insetos (fatos reais!)

Pensamento para sexta-feira: Eu e os insetos (ou, motivos para ter medo de insetos)

A volta da vespa noturna

A personalidade das moscas


sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Pensamento para sexta-feira [55]
O mosquito drone


Admirável mundo novo

Reprodução

  
Margo Seltzer, professora de ciência da computação na Universidade de Harvard, esteve na semana passada no Fórum Econômico de Davos, na Suíça. Vários sites pelo planeta repercutiram a fala de Seltzer sobre um mundo em que drones-mosquito como esse da foto poderiam, em tese, voar ao redor de você e sugar o seu sangue, mais especificamente seu DNA. Essa notícia não é muito nova, em 2012 ela já circulava. Ou mesmo antes.

“Bem-vindo ao presente. Nós já estamos nesse mundo”, disse a professora novaiorquina.

O pernilongo-drone é um vampiro cibernético.

A notícia sobre essa tecnologia assustadora me remeteu a um poema do nosso poeta maior, Carlos Drummond de Andrade. Na verdade, a um trecho de seu poema “O Sobrevivente”:

Se quer fumar um charuto aperte um botão.
Paletós abotoam-se por eletricidade.
Amor se faz pelo sem-fio.
Não precisa estômago para digestão.

Um sábio declarou a O Jornal que ainda falta
muito para atingirmos um nível razoável de
cultura. Mas até lá, felizmente, estarei morto.”

sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Pensamento para sexta-feira [53]
Eleições: Veredas



"(...) Olhe: o que devia de haver, era de se reunirem-se os sábios, políticos, constituições gradas, fecharem o definitivo a noção - proclamar por uma vez, artes assembléias, que não tem diabo nenhum, não existe, não pode. Valor de lei! Só assim, davam tranquilidade boa à gente. Por que o Governo não cuida?!
Ah, eu sei que não é possível. Não me assente o senhor por beócio. Uma coisa é pôr idéias arranjadas, outra é lidar com país de pessoas, de carne e sangue, de mil-e-tantas misérias...Tanta gente - dá susto de saber - e nenhum se sossega: todos nascendo, crescendo, se casando, querendo colocação de emprego, comida, saúde, riqueza, ser importante, querendo chuva e negócios bons..."

(Guimarães Rosa - trecho de Grande Sertão: Veredas, a partir de post de Gabriel Megracko no Facebook)

Ilustração: Poty (do livro Sagarana/1980- Livraria José Oympio)

sexta-feira, 16 de maio de 2014

Pensamento para sexta-feira [52] – Vai ter Copa



Mídia Ninja

Por Felipe Cabañas da Silva, no Facebook

Vejo notícias sobre manifestações e nelas nunca falta uma foto de um palhaço com a máscara do V de Vingança – que representa o facínora do Guy Fawkes. Como a esquerda não consegue perceber que o discurso anti-copa foi sequestrado pela direita – e não uma direita equilibrada, uma direita intelectual com propostas coerentes – mas aquela fatia estúpida da direita que sai às ruas mais para desopilar suas frustrações do que por qualquer coisa que se pareça com um projeto de país?

Ou a ninguém parece estranho que uma das mais histéricas vozes contra a Copa no Facebook seja a fascistinha TV Revolta, cujos posts 99% das vezes disseminam mentiras e ódio contra o Lula, o PT e a Dilma?


sexta-feira, 18 de abril de 2014

sexta-feira, 11 de abril de 2014

Pensamento para sexta-feira [49] – De Pelé e Maradona, ao som de Manu Chao


Fotos: Reprodução


Muita gente, com razão, ficou indignada com o que disse Pelé, o “rei” do futebol, no dia 7 (segunda-feira), sobre o acidente que matou um jovem de 23 anos nas obras do Itaquerão dias antes, fatalidade abafada pelas autoridades responsáveis pela construção do estádio e pela realização da Copa do Mundo. Pelé falou literalmente o seguinte:

“O que aconteceu no Itaquerão, o acidente, isso é normal, é coisa da vida, pode acontecer, foi um acidente, morreu, isso aí não acredito que assuste. Mas a maneira que está sendo administrado a entrada e saída de aeroporto e turista no Brasil, eu acho que isso é uma coisa que tá preocupando.”

Isso foi mote pra uma discussão com amigos por e-mail (o velho, bom e esquecido e-mail nesses tempos de redes sociais). Lá pelas tantas, inevitavelmente, surgiu no debate o nome de Maradona, como é comum acontecer. A dicotomia Pelé x Maradona, que começou no futebol, acabou transcendendo o esporte.

É indiscutível que Pelé foi mais jogador que Maradona. Mas o argentino foi o segundo maior da história. Já como pessoa, homem e cidadão, também é indiscutível que o hermano dá de 10 a 0 no brasileiro, seja como ser político (o que reflete o grau de politização muito maior dos argentinos em relação aos brasileiros), seja como figura humana, o que a amiga Tania Lima, na troca de e-mails acima referida, tão bem definiu: “Maradona, apesar dos percalços, e talvez principalmente pelos percalços, deixa-nos enxergar que existe ali uma figura humana”.

E chegando ao fim desta livre-associação de sexta-feira, convido-os a ver o trecho (de 2’42”) do documentário Maradona by Kusturica (2008), do diretor de cinema sérvio Emir Kusturica, que mostra uma “canja” do músico parisiense Manu Chao com sua linda canção “La Vida Tombola”, que compôs justamente inspirado em Maradona:





quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Pensamento para sexta-feira [48] – A cegueira segundo Jorge Luis Borges





"As pessoas imaginam o cego encerrado num mundo negro. Existe um verso de Shakespeare que talvez reforce essa opinião: Looking on darkness wich the blind to see – "contemplando a escuridão que os cegos veem". Se entendemos negrume por escuridão, então o verso de Shakespeare é falso.

O preto é uma das cores que fazem falta ao cego (ou, pelo menos, a este cego). A outra é o vermelho. De modo que "le rouge et le noir" são as cores que não temos. Para mim, que estava acostumado a dormir no escuro, foi bastante incômodo, por muito tempo, ter que dormir nesse mundo de neblina esverdeada ou azulada e vagamente luminosa que é o mundo do cego. Preferiria recostar-me no escuro, apoiar-me na escuridão. Vejo o vermelho como um vago marrom. O mundo do cego não é a noite, como se supõe.

(...)

O cego vive num mundo bastante incômodo e indefinido, onde surgem algumas cores; no meu caso, ainda existe o amarelo, o azul (exceto que o azul pode ser verde) e também o verde (que pode ser azul). Quando não desaparece, o branco se confunde com o cinza. O vermelho, por sua vez, sumiu completamente. É verdade que estou fazendo um tratamento para melhorar; espero então poder ver de novo essa incrível cor, essa cor que resplandece na poesia e tem nomes tão lindos, nos vários idiomas (...).

Vivo num mundo de cores."

*Trechos do livro Sete Noites (Jorge Luis Borges, do original Siete Noches), editora Max Limonad, 1980, tradução de João Silvério Trevisan


Publicado originalmente em 27/09/2013 às 11:43


quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Pensamento para sexta-feira [46] – A classe média segundo Marilena Chaui


A fala que se segue é da filósofa Marilena Chaui, às vésperas da eleição municipal do ano passado, no comitê da educadora Selma Rocha, então candidata a vereadora pelo PT, que não se elegeu. Eu estive nesse evento e um ano depois aqui está, para quem não viu.





sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Pensamento para sexta-feira [45] - Que o Cairo e Damasco sobrevivam



Dedico o pensamento desta sexta-feira às vítimas inocentes da insanidade tardia dos genocidas do século XXI – e, embora eu não creia no juízo final, desejo de todo coração que eles não tenham perdão;

às crianças mortas pelas armas químicas e por todas as armas na Síria, essa imagem horrenda que me recuso a olhar;

aos civis executados em praça pública, às centenas, no Cairo.

Que muitos milhões de orações sejam entoadas em nome deles.

Amém.

sexta-feira, 10 de maio de 2013

Pensamento para sexta-feira [43] – O Sermão da Montanha (trecho)



Independentemente de se atribuir aos Evangelhos um caráter sagrado, histórico ou literário, o fato é que O Sermão da Montanha é uma das mais belas passagens do Novo Testamento.

Consta (dir-se-á um dia, talvez daqui a séculos: conta a tradição) que Mahatma Gandhi afirmou: “Se se perdessem todos os livros sacros da humanidade, e só se salvasse O Sermão da Montanha, nada se teria perdido.”

Abaixo segue apenas um pequeno trecho do capítulo 5, extraído da longa passagem que abrange os capítulos 5 a 7 do Evangelho de Mateus:


Mateus (5, 1-12)

Vendo Jesus as multidões, subiu ao monte, e como, ao sentar-se, dele se aproximassem seus discípulos, ele se pôs a ensiná-los, dizendo: 
Bem-aventurados os humildes de espírito, porque deles é o reino dos céus.
Bem-aventurados os que choram, porque serão consolados.

Bem-aventurados os mansos, porque herdarão a terra.
Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados.
Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia.
Bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus.
Bem-aventurados os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus.
Bem-aventurados os perseguidos por causa da justiça, porque deles é o reino dos céus.
Bem-aventurados sois quando vos caluniarem e perseguirem e, mentindo, disserem todo o mal contra vós por minha causa. 
Regozijai-vos e exultai, porque será grande vossa recompensa nos céus; pois assim perseguiram os profetas que vieram antes de vós.

sexta-feira, 19 de abril de 2013

Pensamento para sexta-feira [42] – Abril é o mais cruel dos meses



Foto: Carmem Machado


April is the cruellest month. Este é o primeiro verso do epifânico The waste land (“A terra devastada” – em tradução livre), de T. S. Eliot.

“Abril é o mais cruel dos meses.”

Impressionante como algumas sentenças adquirem aura de verdade pela força de um verso, quando o autor é um grande poeta. Mas Eliot não é mais importante do que o mês de abril. Como uma antena, ele apenas captou alguma coisa. Como poeta, conseguiu registrar.

Abril é sempre pra mim um mês estranho e marcante, com seu céu azul e o sol, e a melancolia do outono. Às vezes cruel, como diria Eliot. Por exemplo: num dia 4 de abril (acho que de 1996), um gato que tínhamos chamado Siruiz (um lindo e selvagem gato preto de olhos verdes) foi atropelado na rua Diana, em Perdizes, e morreu no dia 5. Siruiz é o nome de um personagem de Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa.

Meu pai, o seu Oswaldo, de 83 anos, foi atropelado no último dia 5 de abril (uma sexta-feira) de 2013, há duas semanas, na avenida João Pedro Cardoso, Jardim Aeroporto, zona sul de São Paulo, por uma moto. Ficou internado três dias num hospital municipal, pra onde foi levado numa ambulância do Samu. Por milagre, não quebrou nenhum osso do corpo. Apesar dos hematomas, escoriações, cortes e tudo o mais, está em sua casa desde a segunda-feira 8, se recuperando com galhardia. Até já estende suas roupas no varal. É um exemplo impressionante de amor à vida.

Abril também tem coisas bonitas. Na minha biografia, duas, que coincidentemente acontecem no mesmo dia 14: é o dia do aniversário de nossa querida sobrinha e afilhada Iara Terra Holtz, que mora na linda Florianópolis e completou 16 aninhos no último domingo; 14 de abril é também a data de fundação do Santos Futebol Clube, que, como os que frequentam este blog sabem, é o time do coração do blogueiro.

E tem também o dia 23 de abril, que é dia de São Jorge.

sexta-feira, 5 de abril de 2013

Pensamento para sexta-feira [41] – García Lorca



Panorama cego de Nova York


Se não são os pássaros
cobertos de cinza,
se não são os gemidos que golpeiam as janelas da boda,
serão as delicadas criaturas do ar
que manam o sangue novo pela escuridão inextinguível.
Mas não, não são os pássaros,
porque os pássaros estão prestes a ser bois;
podem ser rochas brancas com a ajuda da lua
e são sempre rapazes feridos
antes que os juízes revelem a teia.

    Todos compreendem a dor que se relaciona com a morte,
mas a verdadeira dor não está presente no espírito.
Não está no ar nem em nossa vida,
nem nestes terraços cheios de fumaça.
A verdadeira dor que mantém despertas as coisas
é uma pequena queimadura infinita
nos olhos inocentes dos outros sistemas.

    Um traje abandonado pesa tanto nos ombros
que muitas vezes o céu os agrupa em ásperas manadas.
E as que morrem de parto sabem na última hora
que todo rumor será pedra e toda pegada latido.
Nós ignoramos que o pensamento tem arrabaldes
onde o filósofo é devorado pelos chineses e larvas.
E alguns meninos idiotas encontraram pelas cozinhas
pequenas andorinhas com muletas
que sabiam pronunciar a palavra amor.

    Não, não são os pássaros.
Não é um pássaro o que expressa a turva febre da laguna,
nem a ânsia de assassínio que nos oprime a cada momento,
nem o metálico rumor de suicídio que nos anima a cada madrugada.
É uma cápsula de ar onde nos dói o mundo todo,
é um pequeno espaço vivo ao louco uníssono da luz,
é uma escada indefinível onde as nuvens e rosas olvidam
à gritaria chinesa que ferve no desembarcadouro do sangue.

Eu muitas vezes me perdi
para buscar a queimadura que mantém despertas as coisas
e só encontrei marinheiros atirados sobre as varandilhas
e pequenas criaturas do céu enterradas sob a neve.
Mas a verdadeira dor estava em outras praças
onde os peixes cristalizados agonizavam dentro dos troncos;
praças do céu estranho para as antigas estátuas ilesas
e para a terna intimidade dos vulcões.

    Não há dor na voz. Só existem os dentes,
mas dentes que calarão isolados pelo raso negro.
Não há dor na voz. Aqui só existe a Terra.
A terra com suas portas de sempre
que levam ao rubor dos frutos.


Extraído de Federico García Lorca - Obra Poética Completa
(Editora Universidade de Brasília /Martins Fontes - 1989)
Tradução: William Agel de Melo



sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Pensamento para sexta-feira [40] – Harmonia e desarmonia



Teoria de conjuntos
(Mario Benedetti)


Cada corpo tem
sua harmonia e
sua desarmonia.
Em alguns casos
a soma de harmonias
pode ser quase 
enjoativa.
Em outros
o conjunto
de desarmonias
produz algo melhor
que a beleza.

*Poema e ilustração enviados por e-mail pelo amigo Sérgio Alves
(clique na imagem para ampliar)

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Pensamento para sexta-feira [número 36] - Santa Maria Egipcíaca


Trecho do Oratório de Santa Maria Egipcíaca, de Cecília Meireles


E.M.
Senhor, senhor, senhor, eu sou Maria,
aquela do porto de Alexandria,
que desde menina vivo dedicada
a amar quem passa pela cidade.
Como posso cantar para a Eternidade,
se a minha vida é só para breves instantes?
E como poderei amar a Divindade,
se apenas mortais têm sido os meus amantes?
Senhor, eu não sou romeira nem peregrina,
eu sou a que fugiu de casa, quando era menina,
a que era tão leve, tão bela e graciosa
que nem a palmeira, que nem a brisa, que nem a rosa.