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quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Lembrando Pasolini a partir da excrescência Big Brother Brasil


*Publicado originalmente às 14:18 de 07/02/11



Em 1973, o cineasta e pensador italiano Pier Paolo Pasolini fazia o seguinte comentário sobre a televisão e seu papel culturalmente desagregador e brutalmente destrutivo, analisando a massificação e a padronização da Cultura (e das culturas particulares, seus falares, dialetos e idiossincrasias):

"A responsabilidade da televisão em tudo isso é enorme. Não enquanto meio ‘técnico’, mas enquanto instrumento de poder e poder ela própria. (...) É no espírito da televisão que se manifesta concretamente o espírito do novo poder. (...) O fascismo, no fundo, não foi capaz nem de arranhar a alma do povo italiano: o novo fascismo, através dos novos meios de comunicação e informação (especialmente a televisão) não só a arranhou, mas a dilacerou, violentou, contaminou para sempre." (do livro Os Jovens Infelizes – Antologia de Ensaios Corsários, Editora Brasiliense, 1990.)

Quem leu Pasolini – o grande cineasta diretor de Mamma Roma, Accattone, Salò – os 120 Dias de Sodoma e tantos outros – fica para sempre contaminado por uma irrevogável visão crítica da Cultura, pelo inconformismo e a incapacidade de assistir a certas coisas sem indignar-se.

É com um sentimento de repulsa que escrevo sobre o asqueroso Big Brother Brasil (vulgo BBB), da TV Globo, programa pervertido, boçal e pernicioso ao qual jamais assisti. Dia desses entrei numa padaria para tomar um lanche e eis que a televisão do estabelecimento estava ligada nessa excrescência. Como eu estava morto de fome e a padaria era a única por perto, comi o lanche de costas para a TV. Ao sair, disse à moça responsável pelas “comandas” que da próxima vez que fosse ali nem entraria se a TV estivesse ligada no programa. Ela me olhou em silêncio, com um ar desdenhoso, como se o idiota fosse eu, e não disse nada.

Como temia Pasolini em relação à sua amada Itália, em nosso país a televisão – uma concessão pública, lembremos – transformou a esmagadora maioria dos brasileiros numa massa amorfa, acrítica e incapaz de julgar por si mesma (por favor, não falo de conjunturas meramente eleitorais), incapaz muito menos de preservar sua cultura e suas tradições, as culturas particulares, a criatividade, os falares. Não sei se o próprio Pasolini podia imaginar o quão baixo a televisão chegaria.

E não venham me dizer que o povo é apenas uma vítima. Como dizia Jean-Paul Sartre, “não há vítimas inocentes”.

Leia também: Favoritos do cinema (5): Pasolini

quinta-feira, 19 de julho de 2012

Vincent D'Onofrio: um grande ator nem sempre é um superstar


Como o detetive Robert "Bobby" Goren, em Criminal Intent

Muitas vezes se fala de grandes atores como se um grande ator tivesse de ser necessariamente um superstar. Marlon Brando, Al Pacino, Robert De Niro, Jack Nicholson, Russell Crowe, Anthony Hopkins, Gene Hackman etc.

Vincent D’Onofrio – nascido no Brooklyn, em 30 de junho de 1959 – não é um superstar, mas é um excelente ator. Ele é bastante conhecido como o detetive Robert "Bobby" Goren da série policial Law & Order: Criminal Intent, uma das poucas séries de que eu gosto, ou gostava, de ver, já que ela infelizmente acabou.

Na ótima série com locações em Nova York, o policial Robert Goren faz dupla com a detetive Alexandra Eames, interpretada pela atriz Kathryn Erbe.

A maneira como D’0nofrio encarna o culto policial que penetra nas mentes dos criminosos com um raciocínio lógico apurado aliado à intuição é dessas coisas que fazem a arte dramática valer a pena. Extremamente irônico, Bobby Goren/D’Onofrio está anos-luz à frente de personagens policiais insípidos que não convencem nem a própria mãe, seja de longas-metragens, seja de séries. Prova disso é que uma temporada da série que contou com o ator Jeff Goldblum substituindo D'Onofrio (mas não no mesmo papel) foi um fracasso. É como se Criminal Intent tivesse perdido sua alma.

Como disse o The New York Times em uma matéria, “os espectadores de Criminal Intent geralmente sabiam quem era o culpado (pelo crime). A recompensa de assistir à série, porém, era ver Goren agonizar – em cada caso, um Getsêmani pessoal – para resolver o mistério”.

Li em algum lugar, acho que no NYT mesmo, que Goren/D’Onofrio é um “detetive brilhante e atormentado que canaliza a mente criminosa enquanto a parceira mais prosaica, Alex Eames (Kathryn Erbe), cuida das provas”.

A série Law and Order: Criminal Intent completou 195 episódios ao longo de dez temporadas.

Nascido para matar, de Kubrick

Ator engordou 30 quilos para fazer o papel
Muitos devem se lembrar do perturbador filme Nascido para matar (1987) de Stanley Kubrick. Vincent D’Onofrio – que estudou no Actors Studio – era aquele gordinho psicopata (foto ao lado), o personagem Private Pyle. D’Onofrio engordou 30 quilos para fazer o papel (o que é uma prova de abnegação incrível).

Sobre a chance que lhe foi dada por Kubrick, D’Onofrio uma vez declarou: “Antes de Nascido para Matar, eu era um simples ator de teatro. Honrado, mas que nunca imaginei uma carreira no cinema. Kubrick ofereceu-me esta carreira. Devo agradecer a ele, e somente a ele, o que sou hoje".


Leia também:

Gandes atores (1): Anthony Hopkins, Gene Hackman, Marlon Brando, Rod Steiger

Gandes atores (2): Henry Fonda

Gandes atores (3): Paulo José: Macunaíma, Quincas Berro D'Água e O Palhaço

segunda-feira, 4 de junho de 2012

Jornalismo esportivo acabou


Acabou pelo menos na televisão. Dias atrás, assistindo a um jogo da Libertadores da América, quase no fim da partida dei-me conta de que aquela também era uma data de Copa do Brasil. E que, ligado na Fox Sports, eu não tinha informação de como estavam os duelos desta competição nacional, simplesmente ignorada pela emissora que transmitia a Libertadores, como se o torneio nacional não existisse.

Na TV do plim-plim não existe Olimpíada
A mesma "estratégia" pôde ser observada na transmissão global do jogo da seleção brasileira neste domingo. Como notou o Uol, não se ouviu na TV Globo, durante o duelo em que os mexicanos deram um chocolate e venceram o time de Mano Menezes por 2 a 0 em Dallas (EUA), nenhuma vez a menção de que aquela seleção está se preparando para a Olimpíada de Londres (eu não vejo futebol nessa emissora quando a transmissão é de Galvão Bueno). A informação de que o time do Brasil, formado quase inteiro por jogadores jovens, está enfrentando as seleções principais de outros países também foi ignorada.
Na outra, só há Libertadores

Em suma, a Fox Sports não fala de uma competição transmitida pelas concorrentes (Sportv e ESPN), a Globo ignora o maior evento esportivo do mundo porque os direitos de transmissão para a TV aberta pertencem à Record, e por aí vai. E assim o “jornalismo” esportivo vai se transformando numa fantasia, um objeto comercial travestido de informação. Uma vergonha, como dizia aquele âncora que se manifestou sobre os garis de modo absurdo no final de 2009.

É o cúmulo a maior rede de televisão do país simplesmente fazer de conta que não existem Jogos Olímpicos (eles se preocupam com a tal credibilidade?). Ou uma empresa que detém os direitos de transmissão da Libertadores em TV fechada fingir que não há futebol no Brasil a não ser o que faz parte da competição que eles transmitem.

Como jornalista que sou, sempre entendi minha profissão como uma prática que precisa também ser um serviço. No fundo, a informação é um serviço. Ou deveria ser. Ou era.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Para Gabriel Priolli, uma solução como a Ley de Medios argentina é utopia no Brasil


“O Estado é laico no Brasil, mas teme a Deus e a força de suas igrejas”


ENTREVISTA

Atualmente diretor de conteúdo da Fabrika Filmes, de Brasília, Gabriel Priolli é jornalista, professor, apresentador e diretor de televisão. Foi membro do Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional, do Conselho Superior do Cinema (Ministério da Cultura) e do Comitê Consultivo do Sistema Brasileiro de TV Digital (Ministério das Comunicações).

Entre outras atividades, Priolli foi editor do Jornal Nacional, implantou e dirigiu o Canal Universitário de São Paulo e comandou a TV PUC (SP), da universidade onde lecionou por vários anos.

Começou como repórter na TV Cultura de São Paulo, emissora onde dirigiu o programa "Vitrine". Gabriel Priolli ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo na categoria Informação Cultural em 1988. Ele não está otimista quanto às perspectivas da TV brasileira e à democratização da mídia no país. Leia a entrevista e veja por quê.

Por Eduardo Maretti

Fatos Etc: O parágrafo 5° do artigo 220 da Constituição Brasileira prevê: "Os meios de comunicação social não podem (...) ser objeto de monopólio ou oligopólio". Apesar das inúmeras propostas tiradas da Conferência Nacional de Comunicação, a regulamentação dos artigos 220 a 223 não parece próxima, seja pela pressão e poder dos meios de comunicação, seja pelo “corpo mole” evidente do governo. É possível ser otimista diante desse quadro? Uma solução tipo Ley de Medios argentina é uma utopia no Brasil?

Gabriel Priolli: – Não é possível ser otimista, quando o assunto é regulação de mídia no Brasil. Esse é um setor praticamente sem controle, com uma legislação defasada e parcial, mas com um poder político imenso. Não apenas porque a mídia manipula a opinião pública à sua vontade, constrangendo governos, mas também porque controla o parlamento, já que 20% dos parlamentares e quase todas as lideranças expressivas são ligados a meios de comunicação. Raramente são aprovados decretos, leis, normas ou portarias que contrariem os interesses da mídia. Quando acontece, os autores são demonizados como "censores" e as medidas acabam neutralizadas, revistas ou inteiramente revogadas. A boa regulamentação, para a mídia brasileira, é regulamentação nenhuma. Dessa forma, é uma completa utopia imaginar que possamos ter algo avançado e moderno como a Ley de Medios argentina.

Sobre a democratização das verbas publicitárias, houve avanços no governo Lula. Mas é evidente certo desinteresse em uma ampla reformulação, até porque o governo, entidades públicas e políticos (e já ouvi lideranças petistas admitirem isso) preferem pagar o preço da poderosa oposição midiática mas continuar desfrutando do espaço publicitário dos grandes meios. Qual seria um ponto de equilibrio aceitável no rumo da tal democratização?
    O aceitável é que todos os veículos, independente de seu porte, tenham acesso às verbas publicitárias públicas. O Governo Lula caminhou bastante nessa direção, mas ainda há muito por fazer. Essa é uma área que precisa de uma "política afirmativa", semelhante à política de democratização racial, que favorece etnias historicamente prejudicadas. A grande mídia acha que a verba publicitária estatal deve ser partilhada por critério de audiência e circulação, isto é, do número de consumidores de cada veículo. Isso garante a ela a parte do leão, deixando migalhas aos veículos pequenos. Eu penso que eles devem ser incentivados pelo Estado, para que possam se qualificar e desenvolver. Mas sob estrito controle público, para que esse processo não se transforme em cooptação, compra de noticiário e opinião favorável.

Como encara o crescimento do espaço de programas e “canais de aluguel” religiosos na TV brasileira, considerando-se que, constitucionalmente, a TV é uma concessão pública e o Brasil, em tese, um estado laico?
    Como mais um desrespeito ao interesse público e à democracia no país. As religiões são abusivamente privilegiadas e não apenas nas concessões de canais de TV. O Estado é laico no Brasil, mas teme a Deus e a força de suas igrejas. Procura ser bem obediente a eles, para não ter problemas.

Sendo ex-membro do Conselho Superior do Cinema (Ministério da Cultura), qual sua avaliação da gestão da ministra Ana de Hollanda, criticada por grande parte do setor cultural do país?
    Não vejo um projeto claro de ação, nesta gestão do MinC. Não vejo a ministra se pronunciar publicamente em nenhum assunto relevante, nem se apresentar ao debate das inúmeras questões que envolvem a cultura e a comunicação. Não a vi reclamar do corte de orçamento que teve, nem reivindicar mais recursos. Em contrapartida, vejo retrocesso em quase todos os programas implementados nas gestões de Gilberto Gil e Juca Ferreira. Vejo descuido com projetos e políticas democratizantes. Vejo ampla insatisfação, de vários segmentos da cultura. Não posso ter, dessa forma, uma avaliação favorável de Ana de Hollanda.

Você, que conhece bem a TV Cultura, vê alguma perspectiva para a emissora?
    Apenas quando acabar a gestão de João Sayad e dependendo de quem o substituir. Mas não são muito boas as perspectivas, em princípio. Com o PSDB no governo de São Paulo, a televisão pública paulista nunca terá muito incentivo. O partido deixou claro, no combate ferrenho que fez e faz à TV Brasil no plano federal, que é contrário ao uso de recursos públicos no financiamento de canais de TV. Acredita que o modelo comercial-privado é suficiente para o país. Logo, a TV Cultura será mantida à míngua, padecendo de falta de recursos e da impossibilidade de ousar, criar, avançar. Acabar com ela talvez tenha um custo político muito alto. A opção é fazer de conta que ela existe e mantê-la no limbo da irrelevância.

A eterna discussão sobre a necessidade ou não do diploma de jornalista continua, apesar de o STF ter derubado a exigência. Duas propostas de emenda à Constituição voltam a propor a volta da exigência para “resgatar a dignidade dos jornalistas” e “garantir um jornalismo de qualidade”. Entre os argumentos contra, o de que o diploma incentiva a reserva de mercado e a “indústria do canudo” e afronta liberdade de manifestação do pensamento. Qual solução você defende?
    Sou totalmente a favor da exigência de diploma universitário específico, para profissionais de jornalismo. A desregulamentação da profissão só interessa ao empresariado, que quer ter flexibilidade total na contratação de mão de obra. Para os jornalistas, o diploma fortalece as conquistas profissionais, preserva o piso salarial, evita o ingresso de oportunistas e desqualificados. Para a sociedade, interessa um jornalismo feito por profissionais bem capacitados, que os cursos superiores de comunicação podem oferecer. Outros profissionais, de outras categorias, podem e devem ter acesso ao jornalismo. Mas na condição de articulistas, comentaristas, especialistas. Como sempre lhes foi assegurado.

O que diria aos jovens que hoje sonham em fazer jornalismo?
    Que se preparem para uma carreira profissional difícil, onde os sonhos rapidamente revelam-se ilusões. É uma profissão bonita, digna, apaixonante. Mas as condições em que é exercida, neste país, são muito difíceis. Manter o espírito livre, o pensamento autônomo e a consciência crítica, numa mídia que exige a máxima subserviência de seus funcionários, é uma tarefa hercúlea. Como disse um colega, antigamente a gente apenas trabalhava em jornal. Hoje é preciso ser "filiado" dele, pensar como ele. Isto costuma ser bem doloroso. Para não falar das condições de trabalho, as jornadas abusivas, a precariedade, a insegurança. É preciso muito amor pela profissão, para não desistir no caminho.