sexta-feira, 26 de novembro de 2010

O Rio de Janeiro sob ataque

"Rio de ladeiras
Civilização encruzilhada

Cada ribanceira é uma nação"
(Chico Buarque)

Parte enorme do Rio de Janeiro, situada na zona Norte, vive hoje uma conflagração. A verdade incontestável é que os criminosos estão muito incomodados com as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), porque perdem espaço e dinheiro.

Fotos: Reprodução/ Globo News

São muitas as inquietações. Há a parcela dos cidadãos que assinam o princípio malufista de que “bandido bom é bandido morto”. O que não vou discutir aqui porque não debato com a direita que não dialoga e vive entre a ignorância e a estupidez.

Mas há também quem resiste a admitir que no Rio, hoje, trava-se uma luta entre o Estado e o crime: os militantes mais radicais (e tolos) dos “direitos humanos”. Li no twitter uma frase interessante:

(citações literais, sem revisão)

@jazzmanbrasil: Viva o verdadeiro efeito anestésico do Tropa de Elite! Hoje, qualquer um que fale em direito humanos é chamado de idiota.

A ironia da frase acima soa entre intelectualizada e irreal, embora, provavelmente, seja de fato sincera. Mas há pessoas que dentro da realidade também exprimem, por exemplo, ainda no twitter, um sentimento muito mais sincero, porque não teórico:

@ReginnaSampaio Minha prima ligou não tem como sair do Alemão.

Quer dizer, é uma cidadã cuja prima (o povo) está encurralada. Ela está na realidade. Ou... tem ligação direta com ela, e não fala apenas de si mesma, confortavelmente embaixo do ar condicionado na redação ou no lar.


Podem dizer que o cara é um babaca, que Tropa de Elite é “anestésico” (e é), mas o que o ex-capitão do Bope e roteirista dos dois filmes, Rodrigo Pimentel, disse a Terra Magazine (aqui na íntegra) é para se pensar: “Eu sempre fui um crítico contundente da operação em favela. Eu sempre achei uma ação desnecessária e ineficaz, que não tinha o menor motivo. Porque você entrava na favela e saía. E aquilo não tinha fim nunca. Aí surge a UPP que entra na favela e permanece. De fato, funciona. Mas essa política de enfrentamento momentânea é para estabelecer e consolidar o processo de pacificação”, afirmou Rodrigo. “Não tem jeito. É um caminho sem volta. É agora ou nunca. O Estado não pode ser refém, não pode se ajoelhar.”

Como diz Wálter Maierovitch em brilhante texto (na íntegra aqui) em seu blog: “A confederação criminal fluminense emprega método terrorista, mas não se confunde com as organizações terroristas, cuja ideologia não é o lucro”.


O que quero dizer com tudo isso? Quero dizer que, na minha humilde opinião, o Estado tem que acabar com essas células terroristas, custe o que custar. Seja nos morros ou favelas, seja nas coberturas de Copacabana.

É triste dizer isso, mas a repressão é necessária, e militarmente bem executada, ao mesmo tempo em que as UPPs têm de continuar. É preciso limpar a terra, plantar e depois colher bons frutos. Nenhuma grande nação conquistou a soberania sem derramar sangue.

PS (atualizado às 02h54):
Sobre o tema, importante o post do Conversa AfiadaControle do Complexo do Alemão é exemplo de integração policial

4 comentários:

Felipe Cabañas da Silva disse...

A imprensa está resumindo tudo à questão das UPPs, e colocando uma idéia míope de que se a polícia conseguir vencer, pelas armas, os aproximadamente 600 traficantes que lideram o tráfico no Rio, então o problema estará resolvido.

Isso é uma bobagem, e até uma parte expressiva da esquerda está caindo nessa ladainha.

A realidade é uma só: não há lugar para todos na economia formal, o desemprego é estrutural, a miséria nos países "emergentes" ainda é um problema descontrolado. Diante disso, surgem circuitos paralelos de economia (tráfico de drogas, tráfico de animais, tráfico de seres humanos, pirataria, roubo, assalto, sequestro, etc etc etc), que movimenta rios e mais rios de dinheiro. Só o tráfico de drogas, estima-se, movimenta mais de 500 bilhões de dólares. Não é um milhão, não são 100 milhões, nem um bilhão: são 500 bilhões de dólares. 1/6 do PIB brasileiro.

O que acontece no Brasil e a situação militar nos morros do Rio, se o Estado vai conseguir tomar conta ou não, não pode ser dissociado desse contexto econômico global. Matar 600 traficantes, 1000 traficantes 10000 traficantes não vai cortar a raiz do problema. Acreditar que o problema do tráfico é o traficante é terminar na opinião malufista de que bandido bom é bandido morto, é não querer pensar a estrutura social.

A miséria é uma fábrica de traficantes. Corte o galho hoje, e amanhã milhares de crianças e adolescentes sem perspectivas estarão dispostos a pegar em armas para fazer dinheiro.

A miséria é uma violência exercida todos os dias, e felizmente só posso falar disso como espectador, geógrafo e professor, que nunca passou privações de nenhum tipo. Faço parte, portanto, dessa coisa que se convencionou chamar "burguesia esclarecida", ou "elites progressistas" ou coisa que o valha. Mas é fato: o Estado pode até tomar o controle de todos os morros do Rio de Janeiro, para inclusive fazer um show midiático e mostrar serviço para Copa e Olimpiada, mas a violência encontrará outras formas de manifestação, e o tráfico de drogas encontrará outros meios de continuar entregando suas mercadorias, inclusive, como já acontece hoje, com a conivência de boa parte do poder oficial do Estado, cujos comandantes conhecem muito bem (porque não são nem um pouco ingênuos) os limites da repressão diante de um quadro social que não apresenta alternativas.

Fui.

Edu Maretti disse...

Felipe, não discordo em quase nada de teu ótimo comentário. É quase tudo verdade.

Minhas ressalvas são só essas:

1) você diz: "A imprensa está resumindo tudo à questão das UPPs, e colocando uma idéia míope de que se a polícia conseguir vencer, pelas armas (...) então o problema estará resolvido."

Não dá pra dizer "a imprensa" de maneira assim tão genérica. Não dá pra discordar de que as UPPs são o embrião de algo que pode dar muito certo. (Houve um projeto em Diadema -ABC paulista- que uniu toda a sociedade civil, empresários, comunidades e polícia... politicamente, o projeto conseguiu diminuir brutalmente a violência na cidade, que era uma das maiores do país.)

As UPPs são algo semelhante, em dimensão muito maior. Isso está afetando justamente interesses que se dão bem com a miséria e, por isso, estão reagindo.

2) é óbvio que o caminho é longo e que só com educação e cultura as pessoas (nos morros do Rio ou nas favelas de São Paulo, Salvador etc) vão ser cidadãs de fato, vão prescindir do crime. Mas esse horizonte, que deve ser perseguido com obstinação, dará frutos no longo prazo. O que acontece hoje é que chegou num ponto em que o Estado não pode recuar. O governo Lula foi que enviou as tropas. Elas são necessárias e essa operação tem que ir até o fim.

"A miséria é uma fábrica de traficantes", você diz. Verdade. Mas por que Dilma ganhou a eleição? Porque um dos maiores frutos dos 8 anos de Lula foi a sensível diminuição da miséria. O trabalho tem que continuar. Com cultura e educação, principalmente.

Paulo M disse...

Se as ações conjuntas das polícias e do exército tiverem de fato o intuito de restringir o poderio do crime organizado no Rio, é preciso que as autoridades "saibam" e que a mídia exponha que esses traficantes de morros e favelas são meros "passadores" da droga, e que os chefes supremos desses esquemas (dentro do território brasileiro)certamente não moram nas favelas, não pegam em armas pra enfrentar a polícia nem estão nos presídios. É preciso também modernizar e "descorromper" o sistema carcerário e a parte podre da polícia, além de oferecer à população excluída acesso a educação, cultura, saúde e habitação, como já se disse neste blog e como vem sendo feito desde 2002 pelo governo Lula. Acho necessárias tais operações militares no Rio desde que se cumpram esses itens.

alexandre disse...

concordo com tudo e com todos, e só com minha ignorância, passividade e longe desse caldeirão, diria até mesmo campo de batalha, acredito que organizações como a mafia italiana p ex, seja uma das influentes nesse leito de crimes. É dificil acabar com isso, mas é possível amenizar e usar a força para estabecer uma ordem. É preciso ordem. Agora não tem outra alternativa. Isso é urgente. É guerra e guerra não tem palavras. Pessoas morrem todos os dias em função do trafico, devem viver amedrontadas, dia após dia. Lá no morro também tem trabalhador, tem pessoas normais, querem viver suas vidas, não aderem ao crime, optam pelo trabalho, não é justo que tanta gente se torne escudo do tráfico.