sexta-feira, 1 de julho de 2011

Cesar Cielo, o doping nos esportes e a condenação a priori

O doping no esporte, ou melhor, a maneira como é tratado pelos sistemas esportivos antidoping e pela mídia, sempre me pareceu uma covardia com o atleta “flagrado”, independentemente de ele ter ou não agido com dolo.

No caso que estourou hoje, do nadador Cesar Cielo, isso se repete. E eis que, na ESPN Brasil, ouvi o depoimento do médico Sabino Loguércio, autoridade no assunto, que, me parece, foca com precisão os motivos do incômodo que o tema provoca, pelo menos em mim. Diz Loguércio que o sistema antidoping é “absurdo” e afronta a Constituição de qualquer nação, por ser um sistema “contra os direitos humanos e a ética médica”.

Cielo em Pequim (2008)
Foto: Washington Alves/
Divulgação COB
Para ele, esse sistema de controle (que eu, acrescentando, reputaria kafkiano) “não pode invadir o organismo do indivíduo e dele extrair uma notícia infamante” contra esse indivíduo, no caso o atleta Cesar Cielo ou outro em sua situação. Após ouvir a opinião do médico, procurei e achei no Youtube uma entrevista dada por Loguércio há cerca de quatro anos a Juca Kfouri, em que aborda o mesmo tema (a entrevista é longa, por isso posto abaixo apenas a primeira parte, que já é esclarecedora).

O esporte possui um sistema de punição que realmente afronta os mais básicos direitos humanos e as garantias individuais. Graças aos sistemas de controle antidoping, um atleta como Cesar Cielo é jogado aos leões e às manchetes sumariamente, e todo o estrago que for feito à sua imagem e à sua carreira pelo pré-julgamento, pela exposição e por uma condenação tácita a priori (contra o preceito de que todo cidadão é inocente até prova em contrário) será provavelmente irreparável.

Segundo Sabino Loguércio, há tecnologia suficiente para que se faça um controle preventivo do doping nos esportes. O que eliminaria muitas injustiças e pré-julgamentos.

Voltando ao caso atual, não tenho motivos para defender ou julgar Cesar Cielo, sou leigo em medicina, não estou por dentro do processo (é muito fácil julgar e condenar de ouvir falar). Se ele fez uso de substância proibida para dela auferir vantagem na disputa nas piscinas, deve ser punido. Mas, se não fez, como repará-lo dos danos causados pela notícia e, principalmente, pela exploração midiática da notícia?

De mais a mais, e aqui vai uma impressão pessoal mesmo, não consigo imaginar que um atleta como Cielo (campeão olímpico dos 50 metros livre nos Jogos Olímpicos de Pequim em 2008, campeão e recordista mundial dos 100 metros livres e campeão mundial dos 50 metros livres em Roma, em 2009, ganhador de três medalhas de ouro e uma de prata nos Panamericanos de 2007, no RJ*, entre outras conquistas) vá tomar um remedinho para conseguir resultado num mero Troféu Maria Lenk.

Segundo matéria do Uol, “A farmácia de manipulação que produz suplementos para Cesar Cielo assumiu a culpa pelo exame positivo do campeão olímpico e mundial” e mandou um relatório à Confederação Brasileira de Desportes Aquáticos “avisando que causou a contaminação das cápsulas de cafeína ingeridas por Cielo e outros três nadadores”.

Tá, e como é que fica o atleta, cuja foto amanhã ilustrará todos os jornais do país com a subliminar ou direta informação de que é um suspeito de se dopar para ganhar frações de tempo num torneio secundário?

Veja a primeira parte da entrevista de Sabino Loguércio a Juca Kfouri há cerca de três anos:



*Fonte: Wikipedia

2 comentários:

Felipe Cabañas da Silva disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Felipe Cabañas da Silva disse...

Nesta semana acompanhamos outro caso de pré-julgamento. Quando sua foto estampa um jornal dizendo que você se dopou ou que é um criminoso sexual, até dizer que focinho de porco não é tomada o caminho é longo. Coisa boa Strauss-Kahn não é, mas o espetáculo midiático inverte uma das pedras angulares do direito, e o sujeito se torna culpado até prova em contrário. E põe a estrutura da lei no bolso, tanto é que a justiça do país mais rico do mundo demorou para perceber as incongruências do depoimento da camareira... mas se as fotos do cidadão já estampavam os jornais mais importantes do mundo com cara de culpado, o que pode a "modesta" estrutura legal?