segunda-feira, 12 de julho de 2010

Espanha bate Holanda e mostra que se pode ganhar jogando futebol

Berço de Luis Buñuel, um dos meus cineastas favoritos, do maravilhoso poeta Federico Garcia Lorca (assassinado pelo franquismo) e de Miguel de Cervantes, a Espanha conquista a Copa do Mundo de 2010 com toda a justiça.

Constatação por si só importante, já que futebol nem sempre premia o melhor, o que faz desse o esporte mais bonito que existe.
Reprodução

Iniesta fuzila para marcar o gol do título

A segunda coisa: como alguns comentaristas bem observaram, a vitória espanhola foi muito positiva para o futebol: mostrou que, em nome da competitividade e do título, uma seleção não precisa abrir mão do talento, de jogar futebol como sabe.

Violência x futebol
A final da 19ª Copa do Mundo, no belíssimo estádio Soccer City, em Joanesburgo, mostrou uma equipe jogando futebol, ou tentando jogar, e outra destruindo e batendo. Os holandeses tomaram nove cartões amarelos e um vermelho. Deram pancada o primeiro tempo inteiro, como forma de parar o toque de bola do time de Vicente Del Bosque. Dependeram em toda a decisão do passe de Sneijder e a infiltração de Robben. Ou da jogadinha de Robben, pela direita, cortando para o meio e batendo de esquerda. Mais nada. E, como é futebol, não fosse o goleiro Casillas e a Holanda estaria comemorando.

Os espanhóis levaram cinco amarelos (um na comemoração do gol de Iniesta). Note-se que, normalmente, a Espanha não faz muitas faltas e muito menos toma cartões. Não tem sequer um volante brucutu. Aos 29 minutos do primeiro tempo, De Jong deu uma entrada com a sola, no peito de Xabi Alonso, no meio de campo. Absurda, criminosa, para mostrar o atual estilo holandês de jogar futebol. Era para o time laranja ter perdido um jogador já ali, mas o péssimo árbitro Howard Webb, condescendente, deu só amarelo. Pouco depois, o craque holandês Sneijder entrou solando, com o pé alto, contra o adversário. Nem cartão tomou.

Navas e Fabregas
Violência à parte, a Espanha começou a se impor a partir das entradas de Jesus Navas no lugar de Pedro (aos 15 do segundo tempo), dando a opção da habilidade e da infiltração pela direita, e de Fabregas no de Xabi Alonso no finzinho dos 90 minutos, o que proporcionou mais talento e agressividade a partir do meio campo.

Na prorrogação, com essas duas alterações, diante do visível cansaço dos holandeses, o toque de bola espanhol começou a fluir e, aos poucos, esgotar o adversário. E, o que parecia fatal, aconteceu a apenas 4min do fim da prorrogação. Em linda jogada, Jesus Navas partiu da lateral direita de sua defesa driblando, na velocidade chegou ao meio de campo; a bola foi para Iniesta, que, de calcanhar, tocou para Fabregas, e daí para Fernando Torres tentar o cruzamento, a bola sobrar outra vez para Fabregas, e este tocar para Iniesta fuzilar (veja o gol abaixo, neste post; no vídeo, apenas o fim desta belíssima jogada).

A nota triste da final foi constatar que a Holanda, como já observado aqui e em todo lugar, jogou o anti-futebol e optou por um esquema defensivo e violento. Historicamente, o time laranja fazia por merecer um título, após chegar à terceira final. Perdeu em 1974 para a Alemanha e em 1978 para a Argentina. Mas, levando-se em conta apenas a Copa da África do Sul e o jogo decisivo, a boa notícia é que o futebol venceu.

Diego Forlan
Muito justo o título de melhor jogador da Copa ganho pelo uruguaio Diego Forlan, que coroa a histórica a participação da Celeste no Mundial.

Outras coisas dignas de nota: a alegria do povo sul-africano. A presença da figura magnífica de Nelson Mandela.

A nota negativa, as tais vuvuzelas. Que negócio insuportável. Espero que essa moda babaca não chegue por aqui.

FICHA TÉCNICA
Holanda 0 x 1 Espanha

Holanda
Stekelenburg, Van der Wiel, Heitinga, Mathijsen e Van Bronckhorst (Braafheid); Van Bommel, De Jong (Van der Vaart) e Sneijder; Kuyt (Elia), Van Persie e Robben.
Técnico: Bert van Marwijk.

Espanha
Casillas, Sergio Ramos, Piqué, Puyol e Capdevila; Xabi Alonso (Fabregas), Busquets, Xavi e Iniesta; Villa (Torres) e Pedro (Jesus Navas).
Técnico: Vicente del Bosque.
Gol: Iniesta, aos dez minutos do segundo tempo da prorrogação.

Cartões amarelos: Van Persie, Van Bommel, De Jong, Van Bronckhorst, Heitinga, Robben, Van der Wiel, Mathijsen (Holanda); Puyol, Sergio Ramos, Capdevila, Iniesta, Xavi (Espanha). Cartão vermelho: Heitinga (Holanda)

Estádio: Soccer City, em Joanesburgo (AFS). Data: 11/07/2010. Árbitro: Howard Webb (ING). Assistentes: Darren Cann (ING) e Michael Mullarkey (ING). Público: 84.490.

Veja o gol do título, de Iniesta


4 comentários:

Felipe Cabañas da Silva disse...

A Espanha não me convenceu a copa inteira. Mesmo depois de bater a Alemanha, ainda não via nada de mais no time espanhol. Descobri ontem o motivo: ainda não tinha visto um jogo da Espanha inteiro.

A final me convenceu. Belíssimo título. Como o Edu, eu também acho que históricamente a Holanda já devia ter ganho uma Copa, mas esse time definitivamente não merecia.

A Holanda é o Stirling Moss do futebol (para quem não conhece, o piloto de F1 que foi tetra-vice e é considerado o maior piloto a nunca ter ganho um campeonato).
Diga-se que era pra Holanda ser bi. Perdeu as duas anteriores pras anfitriãs, fora o fato de que em 1978 o Cruyff não jogou a Copa em protesto contra a ditadura argentina, que de qualquer forma fez de tudo e mais um pouco pra Argentina ganhar.

Mas esse time ae que vá pra casa e fique por lá...

xau...

Edu Maretti disse...

Mas o caso da Holanda parece mesmo sina, carma, destino, essas coisas.

Em 1974, enfrentou na final o grande time da Alemanha de Maier (goleiro),Beckenbauer, Breitner, Overath e Gerd Müller. Saiu na frente logo no começo do jogo, aos 2min, mas tomou a virada ainda no primeiro tempo e não conseguiu o empate no segundo.

Em 1978, toda a pressão da ditadura argentina não teria dado em nada se, nos últimos instantes dos 90 min, a Holanda não tivesse perdido um gol feito, por puro azar... a bola chutada da pequena área bateu na trave e não entrou. Na prorrogação, os argentinos de Mario Kempes e Luque detonaram e fizeram 3 a 1. Diga-se, o que mais impressionou naquela prorrogação foi o vigor físico inacreditável dos argentinos, que correram o tempo extra como alucinados, como se o jogo estivesse começando, enquanto os holandeses estavam extenuados (o que era normal). Aquilo sim, foi muito suspeito. Mas se aquela bola da Holanda tivesse entrado... não estaríamos falando da Holanda eternamente vice.

Paulo M disse...

A Espanha foi o time mais regular da Copa, jogou bem, mereceu levar o tíulo. Essa copa teve algumas particularidades, uma delas ter feito surgirem ou ressurgirem surpresas como Paraguai, Uruguai e Gana, por exemplo (não sei se tanto por mérito deles ou demérito do padrão dos adversários), além de ter um campeão inédito numa final inédita, e também ter feito decepções como Itália, França e até mesmo o Brasil. A Espanha tem um grande elenco, de jogadores no rol dos segundos maiores entre as seleções campeãs do mundo. O desempenho do time no campo já não acho que tenha sido tão elogiável, embora, como já disse, satisfatório o suficiente pra merecer. Ganhou com sobras apenas de Honduras, mas penou contra o Chile e perdeu da Suíça, e até ontem, quando foi impedida de mostrar a que veio por conta de uns dois ou tês gorilas holandeses, jogou sem encantar. Legal pro futebol ter mais um campeão mundial além daqueles sete que pareciam se revezar eternamente no trono. Abrs.

Edu Maretti disse...

Prezado Paulo, concordo em parte e disconcordo de parte de seu comentário.

Concordo:

- "a copa teve algumas particularidades, uma delas ter feito surgirem ou ressurgirem surpresas como Paraguai, Uruguai e Gana."

- "Legal pro futebol ter mais um campeão mundial além daqueles sete que pareciam se revezar eternamente no trono."

Disconcordo (hehe):

- "não sei se tanto por mérito deles ou demérito do padrão dos adversários."
Discordo apenas pela restrição. Acho que Paraguai, Uruguai e Gana, principalmente a Celeste, tiveram muitos méritos. Muitos mesmo.O melhor jogador da Copa, eleito pela FIFA, foi Forlán. Justíssimo.

- A Espanha "ganhou com sobras apenas de Honduras". Ora, mas a equipe bateu NA SEQUÊNCIA, em mata-matas, Portugal (que o Brasil enfrentou num jogo de compadres em que o 0 a 0 foi útil a ambos),Paraguai (que vendeu caro a derrota, como vendeu caro para a França de Zidane nas oitavas em 1998 em Paris),Alemanha (a sensação do Mundial) e Holanda (que havia vencido 6 jogos, inclusive o Brasil). A vitória da Espanha sobre a Alemanha por 1 a 0 na semifinal foi inquestionável, pq foi a final antecipada da Copa. A Alemanha, que havia feito 4 a 1 na Inglaterra e 4 a 0 na Argentina, sucumbiu. Não fez nenhum gol, foi sufocada e tomou um gol de campeão do Puyol, naquela cabeçada antológica.

- "jogou sem encantar"
A mim encantou. Enquanto no futebol de hoje, em que todo mundo tem que ter um ou dois porteiros de boate (chamados volantes) pra proteger a defesa, a seleção da Espanha joga com um volante como Xabi Alonso, um gentleman incapaz de bater, e meias como Xavi e Iniesta.

Há uma ironia histórica nesse confronto Espanha x Holanda. É que a Espanha foi campeã com a base do Barcelona, clube em que foi implantado esse jogo, que acaba de ganhar o mundial, por Rinus Michels (técnico da seleção holandesa em 1974), Johan Cruyff,Van Basten e outros monstros que criaram a esquadra laranja que aprendemos a admirar em tempos idos. Ou seja, a Espanha ganhou com o aprendizado holandês que a própria Holanda esqueceu com seus gorilas (que não foram só três não).

Acho que um time campeão da Europa e campeão do mundo tem que ser analisado com menos restrições.

abraços