quarta-feira, 13 de março de 2013

Francisco I, o novo papa da velha Igreja Católica



Reprodução
A escolha, pelo conclave concluído hoje, do cardeal argentino Jorge Mario Bergoglio como o novo papa, nomeado Francisco I, deve ser recebida com alívio pelos brasileiros, cristãos ou não, que sejam comprometidos com lutas políticas e almejam uma sociedade moderna (no sentido mais amplo), justa, laica e igualitária.

É possível que se o cardeal Odilo Scherer, arcebispo de São Paulo, fosse eleito, houvesse um recrudescimento moralista no Brasil, dificultando ainda mais a discussão de temas como a descriminalização do aborto, casamento homossexual e outros pelos quais a sociedade civil tem reivindicado avanços dos poderes estabelecidos.

Bergoglio é o primeiro papa latino-americano da história e o primeiro não europeu. Segundo se veicula em veículos de imprensa independentes, o novo papa foi vinculado ao regime militar argentino (1976-1983), o mais violento da América do Sul, responsável pela morte de 30 mil pessoas. Bergoglio estaria ligado ao sequestro e à tortura de dois jesuítas argentinos e ao rapto de bebês de presos políticos no período mais obscuro da história recente de seu país.

Reproduzo trecho de matéria de João Peres, da Rede Brasil Atual:

O próprio cardeal se orgulhava das boas relações com o comandante da Marinha [argentina] Emilio Massera, integrante da primeira Junta Militar e responsável, em 1955, por derrubar Juan Perón durante a autodenominada Revolução Gloriosa – um golpe de Estado, na realidade.
Foi na Marinha que se formou o principal campo de concentração do regime iniciado em 1976. A Escola de Mecânica (Esma, na sigla em castelhano) recebeu 5 mil prisioneiros, e menos de 200 deles saíram com vida.

(...) ansioso pela possibilidade de assumir o papado em caso de renúncia de Joseph Ratzinger, Bento XVI, Bergoglio encomendou em 2010 uma operação de ‘limpeza’ de seu nome. Segundo reportagem do jornal argentino Página12, o livro El Jesuíta foi escrito com a intenção de desfazer as más impressões criadas em torno do religioso pelo período em que comandou a Companhia de Jesus, entre 1973 e 1979” (a matéria na íntegra está aqui).

Esse aspecto digno de O Poderoso Chefão 3, de Francis Ford Coppola, não é surpreendente para quem conhece minimamente a atuação da Igreja Católica na história do mundo. Segundo o jornal espanhol El País, Bergoglio chegou a escrever uma carta a freiras carmelitas sobre a lei do casamento gay na Argentina dizendo que a oposição a essa legislação era uma "guerra de Deus" contra um "movimento do diabo", o que provocou séria reprimenda da presidente Cristina Kirchner. No entanto, o El País diz também: "Este sacerdote da Companhia de Jesus, poderosa ordem intelectual dentro da Igreja, muitas vezes em conflito com Roma e nos últimos tempos também com a Opus Dei, se distinguiu ao permitir que os padres mais progressistas de sua diocese tivessem muita liberdade. Em 2005, quando foi eleito o papa Bento XVI, Bergoglio foi o candidato da oposição, representando moderação frente ao mais extremo conservadorismo".

Seja como for, os escândalos de corrupção e pedofilia minaram muito da credibilidade da Igreja e a guinada reacionária operada desde João Paulo II não dá mostras de arrefecimento. O que, francamente, para nós, tanto faz. Mas, se era para escolher um papa latino-americano, um brasileiro poderia ser mais útil para a própria Igreja (repito, não para nós, brasileiros), visto que somos o país com mais católicos no mundo, que o Brasil é um país alçado hoje a uma importância internacional inédita em sua história e considerando ainda um fato meramente circunstancial, a realização de Jornada Mundial da Juventude, em julho de 2013, no Rio de Janeiro, com a presença do papa, segundo se prevê. Ou seja, um evento que no início de um papado em busca de fiéis e da recuperação da Igreja poderia capitalizar muita coisa.

***

PS (às 13:09, 14/03) - O Vaticano informou que o certo ao se referir ao nome do novo papa é dizer Francisco, e não Francisco I. Isso porque ele só será Francisco I quando houver um Francisco II. Faz sentido. Mas não vou mudar o título da postagem porque, no blogger, o título em si é gerador de um link. Se o título é mudado depois de postado, o link do título corrigido se perde e fica-se com um link de página "não existente" circulando por aí...

3 comentários:

Alexandre disse...

Muito boa essa obs. Algo também já observado em alguma matéria por aí, talvês no UOL, não me lembro onde li sobre essas informações, mas certamente essa desse blog é mais completa. Mas também não há de se estranhar muito, lembrando que a Igreja católica, por ordem de um papa, mandou executar milhares de pessoas, consideradas à época, hereges ou contra as doutrinas da Igreja Católica, por volta do século XVIII, se estou certo. A Igreja sempre foi sinistra, não seria diferente hoje.

Eduardo Maretti disse...

Bem, o Vaticano, por meio de seu porta-voz, padre Federico Lombardi, disse que as acusações são bastante conhecidas e fazem parte de uma "campanha difamatória".

"A Justiça argentina o interrogou várias vezes, mas nada foi imputado a ele", afirmou.

É bom registrar, pois, em se tratando de figuras de alto poder como um papa, nem sempre se pode saber de fato onde está a verdade.

Fabio Fernandes disse...

Olá, Edu Maretti!
Infelizmente, algumas religiões tomam outro rumo fazendo com que as pessoas vivam amedrontadas na verdadeira escuridão da alma. Vai ter que trabalhar muito, esse Sr. Abraço!
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