terça-feira, 15 de maio de 2012

Com Hollande, uma França que fala de solidariedade e crescimento

Se a França na prática vai ser ou não um novo parâmetro político na conjuntura da Europa, onde paira a nuvem negra e sinistra da recessão, pelo menos simbolicamente já é algo alentador que o novo presidente, que tomou posse hoje, dê outra direção ao discurso em voga no país de René Descartes com Nicolas Sarkozy, cujo governo só tem um mérito: sua digníssima esposa Carla Bruni...

Como o lema Liberdade, Igualdade e Fraternidade,
Arco do Triunfo é um dos símbolos da França
François Hollande, eleito no dia 6 de maio com 51,6% dos votos, é o primeiro socialista a assumir a presidência francesa depois de 17 anos da direita no poder. Hollande chega ao Palais de l'Elysèe com um discurso que se vale de palavras esquecidas do vocabulário francês: união, solidariedade e crescimento. Ele também aponta para uma política que reverta a discriminação aos imigrantes. Já inaugura o governo reunindo-se com a reacionária chanceler da Alemanha, Angela Merkel. Na pauta do encontro, a crise europeia. Vale lembrar que Angela Merkel, que apoiou Nicolas Sarkozy na eleição presidencial, sequer conversou com o então candidato Hollande. Vai ter que conversar agora...

Na cerimônia de posse de François Hollande, a massa de cidadãos empunhava faixas, entre as quais algumas pediam medidas contra a crise e um governo igualitário. O que não é pedir muito, considerando que estamos falando do país que, com a Revolução Francesa em 1789, mudou a história do Ocidente universalizando os princípios de Liberdade, Igualdade e Fraternidade.

Quem sabe a França de Jean-Jacques Rousseau, Gustave Flaubert, Victor Hugo, Théophile Gautier, Stendhal, Baudelaire, Jean-Paul Sartre, Simone de Beauvoir e tantos outros grandes reencontre o caminho perdido em busca de Liberdade, Igualdade e Fraternidade, embora esta afirmação soe também um tanto quanto... romântica, de minha parte.

4 comentários:

Gabriel Megracko disse...

A Esperança é um desejo subvertido e obscurecido, cuja luz é verdadeiramente negra e boa. Quando a Noite for legitimada, poderemos olhar o Dia com algum carinho. A Sociedade ainda está retardada pelo medo da repressão bélica diurna...
Desejo ardentemente que a Realidade, manifestada no desejo exacerbado de justiça, entre sorrateiramente, na noite macambúzia, no estômago das estruturas pesadas e lhes causem uma congestão fatal.
"Próxima estação: Esperança"

Felipe Cabañas da Silva disse...

Caríssimo Edu, falemos de política então, que em matéria de política nos entendemos mais que em matéria de futebol... he he he...

Pois é. A França sempre "na vanguarda". Enquanto a resposta da maioria da União Europeia à crise é a direita, com seu arrocho generalizado, sua subserviência aos ditames do mercado financeiro, sua frieza frente ao agravamento do sofrimento social e sua truculência frente às revoltas da massa, a França responde à crise com a esquerda.

No entanto, apesar da França ser hoje vista no mundo mais como um país progressista que conservador, esse é apenas o segundo governo de esquerda de toda a Quinta República, inaugurada na década de 1950. Mittérand só ficou 14 anos no cargo por conta das peculiaridades do mandato presidencial daquela época, que mudou posteriormente de 7 anos com direito à reeleição para 5 anos com direito à reeleição.

Sarkozy, no melhor estilo "José Serra" de ser, tentou de tudo para ficar no cargo (afinal de contas o alpinista social tem apetite insaciável), inclusive quebrou um princípio sagrado da direita gaullista francesa, que é não fazer acordo com a extrema direita xenófoba. De forma repulsiva, quanto mais sua necessidade de votos ia crescendo, mais o alpinista social Nicolas ia "endireitando" o discurso. No final das contas, Marine Le Pen, pensando mais estratégicamente que o pai, deixou a UMP na mão para garantir algumas cadeiras na Assembléia nas eleições legislativas. Provavelmente, a Frente Nacional neo-nazi francesa entrará no parlamento este ano. François Hollande, que é chamado de "esquerdinha caviar" pelos conservadores (naquela crítica rasteira clássica ao homem de esquerda que tem raízes burguesas), era um candidato secundário até ser alçado ao centro do palco pelas circunstâncias políticas (as perfídias de DSK principalmente) e, na comparação dos franceses com o outro François socialista, o Mittérand, não é considerado um líder de mesma força e militância. Com o tamanho dos desafios que se apresentam, espero que tenhamos uma grata surpresa e que ele não seja colocado no bolso da direita alemã. Ele é agora o homem de esquerda com maior poder dentro da União Europeia, e o que assistiremos será o embate entre a escola progressista e a escola conservadora na condução da crise. Esperemos que a escola conservadora não triunfe.

Leandro disse...

O "norte" do mundo, hoje, está ao sul do Equador e do outro lado do meridiano de Greenwich.
Por conta disso, espero que os franceses se inspirem não apenas em seus "pais" do constitucionalismo e do liberalismo (liberalismo no bom sentido), mas espero, sobretudo, que busquem inspiração em governos e regimes de inspiração efetivamente popular, como os que acarretaram na constituição Zapatista do bravo povo mexicano, diploma pioneiro na ascensão de direitos sociais consagrados e hoje tão caros e necessários a uma alteração do estado das coisas na NaziEuropa.
Espero também que busquem inspiração no paradigmático governo do nosso querido ex-presidente Lula para se desintoxicaram destes anos seguidos de conservadorismo neo-liberal e consequente vassalagem ao grande capital internacional.
Uma foto de Lula e Hollande me tocou bastante quando lia a respeito da eleição deste, e qualquer semelhança entre a desintoxicação pós-Sarkozy que desejo para eles e a nossa desintoxicação pós-FHC por meio de Lula não é mera coincidência.

Paulo M disse...

E mais ou menos surpreendentemente entra um carro na contramão da política de Israel e dos Estados Unidos (e também da Rússia e da China) diante das questões síria, iraniana e palestina. Ainda mais porque a França tem poder de veto no Conselho de Segurança da ONU, e pode fazer uma intermediação entre interesses que faz tempo estão em jogo e que fazem os olhos de tantos voltarem-se para o Oriente Médio. Quem sabe não é o começo do fim da receita americana de democracia na política internacional, que o Lula já tinha desmontado. Algo vai mudar, resta saber o que é que vai sair dos bastidores.