Por Luiz Egypto
(publicado no Observatório da Imprensa)
Mais um quiproquó entre o presidente Hugo Chávez e a mídia venezuelana. Desta vez a truculência chavista emparedou seis emissoras de TV por assinatura, entre elas a RCTV, este um canal oposicionista cuja concessão em sinal aberto não foi renovada ano passado pelo governo – daí sua opção por transmitir via cabo.
A verdade é que não há inocentes nessa história. O debate está radicalizado, há mortes nas ruas, a Venezuela é hoje um país dividido.
A mídia oposicionista pega pesado, foi cúmplice de uma tentativa de golpe de Estado em 2002, e o governo, que não deixa barato, responde sempre uma oitava acima. Com maioria folgada no Parlamento, aprovou, em 2004, uma de Lei de Responsabilidade Social em Rádio e TV e nela embutiu, no final do ano passado, um decreto segundo o qual as emissoras a cabo passaram a submeter-se às mesmas regras daquela legislação.
E onde foi que o caldo entornou? As emissoras por assinatura que tiverem pelo menos 70% de sua produção de conteúdo nacional agora são obrigadas a formar as cadeias de radiodifusão convocadas pelo governo, no mais das vezes para transmitir discursos do presidente Chávez. Quem não obedecer está sujeito a penas de multa e "suspensão administrativa". De acordo com a ONG Human Rights Watch, citada na quarta-feira (27/1) pela Folha de S.Paulo, em 2009 foram 141 discursos – um deles com 7 horas e 34 minutos de duração.
O que será?
A organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF) monitorou a formação dessas cadeias governamentais de radiodifusão e contou, em 2008, 154 episódios desse tipo, nos quais o presidente Chávez usou 190 horas de falação – o que equivale a oito dias inteiros de palavrório. Noves foras o programa semanal Alô Presidente, veiculado aos domingos pela VTV (Venezolana de Televisión), que, como a antiga e brasileiríssima Discoteca do Chacrinha, "só acaba quando termina".
Registre-se: há quem goste dessas longas perorações. Registre-se também: agride o espírito democrático o apetite com que o presidente se lança ao projeto de controle absoluto do espaço midiático. Ano passado, segundo levantamento da RSF, Chávez fechou 34 veículos audiovisuais e confiscou 29 frequências de radiodifusão para distribuí-las em favor do "desenvolvimento de meios de comunicação comunitários". Pelo menos uma delas, a da emissora AN Radio, foi atribuída à Assembléia Nacional da Venezuela.
Nas emissoras estatais, é o presidente no céu e Deus na terra, nesta ordem. O contraditório ali não existe. Nessa batida, o que será da Venezuela?
Luiz Egypto é redator chefe do Observatório da Imprensa
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