quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Jorge Amado, 100 anos, eterno intérprete da Bahia


Reprodução
Já cansado da lida de mais um dia que acabou, pois já passa da meia-noite, vou traçar umas poucas linhas para falar de Jorge Amado, que nasceu há cem anos (Itabuna, 10 de agosto de 1912) e morreu há 11 (em Salvador, a 6 de agosto de 2001). Duas efemérides quase na mesma semana.

Quando Jorge Amado morreu, um amigo jornalista, Enrique Portilla (chileno, mas que à época morava no México), figura interessante que eu tinha conhecido tempos antes num bar na região da Paulista em São Paulo, se comunicou comigo para encomendar uma matéria sobre Jorge para o jornal Reforma, do México. Matéria para a qual falei com algumas personalidades das letras brasileiras, como Lygia Fagundes Telles, Moacyr Scliar e Millôr Fernandes. Essa matéria foi publicada no jornal mexicano sob o título "El heroe de Bahia", e ainda está lá, nos arquivos do jornal, mas para acessar o texto (que tenho impresso, guardado numa pasta) é preciso ser assinante do jornal ou fazer um cadastro.

Gosto muito de Jorge Amado. Sempre penso que ele foi menos brilhante quando confundiu as letras com sua militância no Partido Comunista. Mas sempre foi um grande escritor, um contador de histórias cuja sensibilidade era capaz de captar e registrar a cultura de um povo inteiro, o povo da Bahia, como uma antena.

Povo que não eu conheço tão bem como gostaria, embora adore Salvador e tenha me encantado com o Recôncavo quando lá estive fazendo uma reportagem. Sou descendente de italianos pelo lado paterno, mas minha avó materna era baiana de uma cidade antigamente chamada Santana dos Brejos, nome que hoje não existe mais. Hoje é conhecida só como Santana. Tiraram o lado feio (mas poético) do nome da cidade que é mencionada por Euclides da Cunha em Os Sertões, pois Antônio Conselheiro passou por Santana dos Brejos.

É incrível a história e os arquétipos. Pensar que meus bisavós maternos foram contemporâneos do Conselheiro, que podem ter visto o homem passar por ali, até tê-lo visto, ou apenas terem ouvido falar de sua sombra passar por lá. Glauber Rocha.

Mas voltando a Jorge Amado. Sua obra é rejeitada por certos setores academicistas da USP. Puro preconceito da elite intelectual paulistana, diga-se. O Jorge Amado de A morte e a morte de Quincas Berro D’água, de Gabriela cravo e canela, de Mar Morto e tantos outros livros não pretendeu revolucionar a linguagem, mas apenas contar histórias do povo baiano, seus mitos e lendas, suas paixões e sua realidade sem pecado. Daqui a cem anos, com certeza, Jorge Amado será lembrado, e duvido que os irmãos Campos sejam, com toda a sua erudição concretista indefensável, com suas obras brilhantes, sim, mas fragmentárias e sempre caudatárias de algo maior. Jorge Amado, não. Ele não precisa de intérpretes concretistas.

É possível comparar Jorge Amado com Gabriel García Márquez, embora o colombiano trafegue mais pela via do realismo fantástico, e o brasileiro por um outro tipo de linguagem, onde o fantástico existe (Mar morto), mas nunca se afasta tanto da realidade.
Foto: Edu Maretti
O cara sem camisa é o Marujo, pescador de Pedra Furada
Em Salvador existe um lugar chamado Pedra Furada, aonde um amigo que fiz lá, o Zezéu, dono de uma empresa de transporte turístico, me levou uma vez e, depois, outra vez, quando lá estive com Carmem em 2007.

A Pedra Furada fica perto do Bonfim. Depois de descer uma ladeira impressionante, você acaba numa viela de pescadores. Pobre. Onde você come um peixe e uma moqueca absolutamente divinos.

É difícil entender Jorge Amado se você não conhece lugares assim, como a Pedra Furada, perto do Bonfim. Mas é possível, senão entender, pelo menos sentir.

Um comentário:

Alexandre disse...

Cheguei a percorrer alguns lugares do sertão da Bahia e pude entender/sentir mais "Grande Sertão", de Guimarães Rosa. Senti o clima hostil, mas num contraste entre um vasto cerrado, num horizonte que parece ser infinito, e uma vegetação verdejante, escassa, mas com um verdume de vida, os chamados brejos, que ficam mais pra cima, nas regiões mais úmidas, as serrinhas.

Jorge Amado já conta, como Caymmi canta, pelo menos a que tenho conhecimento, o outro lado da Bahia, a Bahia dos pescadores, do cacau, do mar...

Realmente, a Bahia é um lugar mágico, embora haja muito sofrimento ainda. Parece que lá, quando estamos, vivemos uma lenda, uma história contada.

Parabéns pra Jorge Amado.