quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Para lembrar: a mídia contra a democracia em quatro momentos históricos

As vésperas das eleições têm sido invariavelmente tensas, desde que a população brasileira retomou o direito de votar, pós-ditadura. Não só nas eleições presidenciais. Exemplo inesquecível: a eleição de Leonel Brizola em 1982, no Rio, quando houve uma tentativa espúria de golpe, o chamado “caso Proconsult”, que o combativo ex-companheiro de João Goulart conseguiu abortar.

Brizola foi também personagem de outro momento histórico (item 3, abaixo), quando a TV Globo foi obrigada a lhe dar um direito de resposta de mais de três minutos em 1994. A participação decisiva da mídia no episódio do seqüestro de Abílio Diniz, em 1989, que ajudou a eleger Fernando Collor, é outro emblema do golpismo e do desprezo pela democracia. Relembrem, abaixo.


1) Caso Proconsult
Em 18 de novembro de 1982, com a demora na divulgação dos resultados da eleição para o governo do Rio de Janeiro, o então candidato Leonel Brizola, do PDT, apontado como virtualmente eleito na boca de urna, foi à imprensa internacional para denunciar uma tentativa de fraudar a apuração a favor do candidato do PDS e da ditadura, Moreira Franco. Foi o chamado escândalo da Proconsult (nome da empresa encarregada de apurar os votos). Trabalhando a favor da conspiração, a TV Globo foi forçada a recuar. Brizola venceu o combate, foi eleito e governou o estado. Leia mais clicando aqui.

2) Lula x Collor
Em 1989, às vésperas do segundo turno da eleição presidencial entre Lula e Fernando Collor, o empresário Abílio Diniz foi estranhamente sequestrado por ativistas políticos (argentino, chileno e canadense) que, supostamente, pretendiam com o resgate arrecadar fundos para a guerrilha em El Salvador. Collor ganhou, com apoio da Rede Globo, que ainda editou o último debate entre os candidatos de maneira suja. Se eram de fato militantes de esquerda (nunca se sabe), eram muito burros aqueles seqüestradores.

3) Brizola x Globo, de novo
Atacado pela TV Globo, que o chamou de senil, novamente Leonel Brizola, governador do RJ, venceu uma batalha e conseguiu um direito de resposta de mais de três minutos. O texto de Brizola foi lido por Cid Moreira no próprio Jornal Nacional. Era o dia 15 de março de 1994, ano de eleições para presidente da República e governadores de estado. O histórico direito de resposta está abaixo:



O link do video acima está aqui: http://www.youtube.com/watch?v=ObW0kYAXh-8

4) Mídia x Lula
Em 2006, depois de mais ou menos aceitar a inevitável eleição de Lula em 2002 após o catastrófico governo de Fernando Henrique Cardoso, e amparados na certeza de que o governo do metalúrgico fracassaria, os barões da grande imprensa tentaram de fato um golpe. A revista Veja trabalhou sistematicamente por quase todo o primeiro mandato de Lula tentando enfraquecê-lo com seu jornalismo marrom, produzindo manchetes que se alastravam para os jornais e que se auto-alimentavam em profusão, principalmente a partir do chamado “escândalo do mensalão”.

Veja não conseguiu abalar a popularidade do presidente, e, diante da iminente reeleição do petista, a mídia golpista estampou em capas apoiadas por manchetes as célebres fotos ilegais, tiradas por um policial, do dinheiro apreendido – no chamado “escândalo dos aloprados” – e supostamente destinado a comprar um dossiê contra o então candidato ao governo de São Paulo José Serra (PSDB), sempre Serra, que parece estar presente em todos os lugares onde aparece o termo “dossiê”. Por falar em jornalismo marrom, a capa inteira da Folha de S. Paulo de então – com Lula abaixo da página, encapuzado, proporcionando a óbvia associação com a imagem de um criminoso – é o mais acabado exemplo desse gênero de subjornalismo que o jornal da família Frias conseguiu produzir.

5) O trocadilho vagabundo de Veja

Por tudo isso, não surpreendem coisas do nível da capa de Veja desta semana, com a “manchete” valendo-se de um trocadilho vagabundo: “O polvo no poder”, para “denunciar” o “escândalo” da quebra do sigilo de adversários políticos do PT. A manchete denota, de resto, como é mesquinha e calhorda a elite brasileira diante da idéia do “povo no poder”, que é justamente o que ela sempre temeu. A frase de Veja é um significativo sintoma de seus temores. Talvez até um ato falho, em formato semântico. O problema para a publicação dos Civita, que se gaba de ter 1 milhão de assinantes, é que esse milhão é pouco diante dos 30 milhões de cidadãos que os oito anos de Lula elevaram às classes médias.

Por tudo isso, apesar da dianteira de Dilma Rousseff nas pesquisas, “é preciso estar atento e forte” nesta reta final do processo eleitoral. Não será surpresa se novas bombas de lixo forem atiradas contra a democracia pela aliança entre José Serra e a vergonhosa imprensa deste país.

4 comentários:

Felipe Cabañas da Silva disse...

Fala, Edu. Então, no post anterior, quando toquei no assunto, não queria fazer uma cobrança, mas uma provocação para o debate. Gostei do post.

Bom, é fato que não existe no mundo jornalismo absolutamente independente, como se auto-proclamam alguns diários por aí. Se é independente do aparelho de Estado, o que é ótimo, é dependente de um mercado consumidor, que alimenta grandes conglomerados de empresas que exploram a informação. Essas empresas, evidentemente, têm suas posições e interesses políticos, e é desnecessário dizer para que lado pendem.

Mas o que chama atenção no Brasil é justamente uma espécie de jornalismo tabajara, cuja liderança tabajara é a revista Veja e suas capas ridículas, como a da última semana.

E também como o Brasil é o país do dito pelo não dito, irrita em certas publicações a tendência a campanhas subliminares. Lendo a Folha todos os dias (porque sou masoquista), fica claro de que lado o jornal está, mas em nenhum momento isso é declarado abertamente. Ao afirmar em inúmeros editoriais que a Dilma é "candidata inventada", "tirada do bolso do colete", "neófita eleitoral" etc, só um leitor mais ingênuo para não perceber a posição eleitoral do jornal. Mas sempre auto-declarada imparcial e pluralista.

É difícil saber em qual publicação atear fogo primeiro.

Alguns dos momentos mais escandalosos dessa relação tensa e nem sempre honesta que você citou eu desconhecia, mas só sei que no momento, acompanhando o noticiário de perto o ano todo, foi nítida a mudança de comportamento a partir do momento em que se percebe o óbvio: Dilma não perde mais. A partir daí, diante da constatação de que somente um fato escandaloso envolvendo diretamente a Dilma poderia dar alguma esperança ao "seu Zé", se começa a buscar irregularidades e cobrar "celeridade nas investigações". A Folha com o "escândalo do dossiê", e a Veja com o "lobby". Uma profusão de articulistas começam a avaliar o "grau de octanagem" dos escândalos e as possibilidades de interferência nas urnas. Mas o Serra continua em queda livre. Sem posição clara, sem projeto, com dinheiro escasso, poucas alianças e algumas traições na base demo-tucana. Não vai ser com uma revistinha de quinta categoria que vai chegar ao poder.

Victor disse...

O seu post ficou ótimo. A Veja na eleição passada bateu muito mais no Lula, se dedicou a isso com capas e capas, mas percebeu que isso não deu certo e não dá certo, porque não há ligação com o povo, a ligação que o presidente e o PT têm.
Ontem, altas horas, vi a entrevista na Band do Zé Eduardo Cardoso e o diretor da Vox e acho que o Roberto Damata. A certa altura o Mitre, irq, perguntou sobre a liberdade de imprensa. O Zé Eduardo respondeu que esta é intocável, mas que é preciso haver uma regulação pelos abusos que tem acontecido e todos os entrevistas se uniram nesta reclamação. Sobre a regulação o Mitre concordou, de fachada, é claro. Na minha opinião, a comunicação é o principal desafio, senão o primeiro, que a Dilma deve enfrentar no seu governo, porque a imprensa "imparcial" irá atazaná-la desde o primeiro minuto, até o último.

Paulo M disse...

Graaande Brizola! A maior referência não petista na formação política do velho Sapo Barbudo. Histórico esse vídeo que mostra o direito de resposta contra a Globo. Esse post do blog sobre os golpes históricos ficou ótimo. Aliás, ouvi uns rumores sobre uma possível tentativa de novo golpe midiático, que viria à tona na última quinta-feira antes do primeiro turno. Não sei especificar o que seria. Tomara seja só boataria... Abrs.

Eduardo Maretti disse...

Brizola faz falta.