terça-feira, 7 de janeiro de 2014

O "casamento" bem-sucedido de
Martin Scorsese e Leonardo DiCaprio



Reprodução


Assisti na semana passada ao filme O Aviador (do original The Aviator), de Martin Scorsese, sem saber que o diretor e o ator Leonardo DiCaprio estão novamente juntos, agora em pleno trabalho de divulgação da nova produção de Scorsese, O Lobo de Wall Street. O novo filme do diretor é violentamente criticado por colocar no pedestal, digamos assim, um personagem real e nada nobre: Jordan Belfort, operador do mercado financeiro reconhecidamente um homem inescrupuloso, “pilantra” e corrupto, que levou pessoas à bancarrota com suas especulações e sede de dinheiro e poder. O “herói” de Scorsese é interpretado por DiCaprio.

Scorsese e DiCaprio estão se especializando em filmar magnatas americanos poderosos. O Aviador é um épico que conta um período da vida do milionário Howard Hughes (1905-1976), homem inquieto, extremamente inteligente, que foi aviador, produtor e diretor de cinema, homem de negócios, projetista de aviões e controlador da companhia aérea TWA dos anos 1940 até 1966.

Independentemente dos méritos dos personagens que escolhe, o fato é que Scorsese sabe fazer cinema. O Aviador tem quase três horas de duração, mas é um filme que você não vê passar. Além da trama bem amarrada, de achados fílmicos impressionantes, há momentos absolutamente espetaculares, como a epifânica sequência em que Hughes/DiCaprio filma (filme dentro do filme) um combate de Hell's Angels, produção de cinema que “na vida real” o empresário lançou em 1930 com estrondoso sucesso ao custo astronômico, para a época, de quase 4 milhões de dólares.

Ou a sequência em que, ao testar um novo projeto (o próprio Hughes pilotava os aviões que projetava), a aeronave, o XF-1, caiu e por milagre o piloto-criador não morreu.

O Aviador também é interessante ao traçar e construir a personalidade de Hughes, a partir da curta introdução em que mostra sua mãe superprotetora, cuja fobia de micróbios levou o filho a crescer com graves sequelas psicológicas que nunca o abandonaram. O filme mostra com grande competência o contraste desse homem louco que em um momento estava confinado em uma crise de loucura e em outro podia pôr no bolso um senador que, fazendo o lobby da poderosa concorrente da TWA, a Pan Am, o interrogava em uma CPI com o objetivo de destruí-lo e tirá-lo do nascente mercado da aviação norte-americana que se expandia rumo à Europa.

Há também o humor, por exemplo quando Hughes/DiCaprio lava as mãos no banheiro obsessivamente, ou outras situações em que fica clara sua condição de vítima de uma espécie de transtorno obsessivo-compulsivo (TOC). Enfim, um belíssimo filme.

O problema é que, diferentemente de Howard Hughes, rico e excêntrico, sim, mas que tinha sua grandeza, um personagem rico também do ponto de vista humano, glamouroso, amante e produtor de cinema e aviões, o novo objeto da lente do diretor, o especulador Jordan Belfort de O Lobo de Wall Street, não tem nada de charmoso ou nobre, muito pelo contrário, e por isso Scorsese tem sido criticado e atacado pelos que consideram sua escolha uma afronta imoral. Francamente, é um filme que não tenho vontade de ver.

Seja como for, o “casamento” de Leonardo DiCaprio com Scorsese, ao que parece, vai muito bem. Além de O Aviador, eles já trabalharam juntos em Gangues de Nova York (2002), Os Infiltrados (2006), A Ilha do Medo (2010) e agora na nova e polêmica produção sobre o bilionário sem-vergonha do mercado financeiro estadunidense.

DiCaprio

Como Edgar Hoover, no filme de Clint Eastwood
Quanto a Leonardo DiCaprio, com o qual vi vários filmes, me parece um ótimo ator, e sua atuação em O Aviador e outros filmes mostra isso. É óbvio que ele não está sempre ao lado de grandes diretores por acaso. No mais recente dos que eu tinha assistido, está também excelente como J. Edgar Hoover (no filme J. Edgar, de Clint Eastwood, 2011). Talvez mereça ser colocado na seção Grandes atores. Vou pensar sobre isso... Mas ele me parece ainda um pouco aquele ator que interpreta sempre a si mesmo (mas Al Pacino não é o maior exemplo disso?). Ou então seus personagens têm sido muito semelhantes (homens que representam o poder e o dinheiro) e ele precise interpretar outras personalidades. 

Um de seus melhores papeis é no ótimo Prenda-me se for Capaz (Catch me if You Can,  2002), direção de Steven Spielberg, em que interpreta o personagem Frank Abagnale Jr. (também real), um falsário, estelionatário e farsante que se faz passar por médico, advogado e piloto de avião, ganhando muito dinheiro e fazendo a atônita polícia de trouxa. Um filme imperdível.

Talvez DiCaprio, que tem apenas 39 anos, precise de um pouco de estrada em sua carreira para amadurecer e se tornar realmente um dos grandes. Parece-me que é seu destino.

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