quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

É 31 de dezembro





Por Roseli Costa

É 31 de dezembro. E antes que você se empenhe em fazer as comidas que irão coroar os rituais dessa data tão esperada, na companhia de amigos e familiares, aquiete-se e medite. Muitos fatos que se queriam resolvidos não tiveram solução ou até pioraram. Judeus e palestinos não chegaram à paz; a fome existe e persiste; as mortes e violências verbais às minorias mancharam o decorrer de 2014; as famílias continuam gerando sem querer e os jovens quedam no Nada, cercados por celulares com Internet... Na sua morada pessoal – seu íntimo –, sonhos jazem inertes; nódulos emocionais permanecem sem solução; hábitos nocivos persistem a amenizar a perplexidade...

No seu escritório, livros observam sem ser lidos; e-mails de amizade calam nos dedos preguiçosos; contas a pagar não fecham em saldo positivo. Mas é 31 de dezembro, data que não se consegue passar como outra qualquer, em que costumes e tudo ao redor clamam por planejamentos, desejos, revisões, esperanças e novas tentativas. Então, se é cultural, se é mais forte do que nós sozinhos, sonhemos...

Sonhemos com um mundo mais digno, mais humano, mais justo, mais igual, menos fascista. Esperemos que ao menos um passo seja dado à frente para a solução de conflitos mundiais. Que a injustiça contra as mulheres, os negros, os índios, os trabalhadores, os homossexuais, os menos favorecidos, os animais seja diminuída com a implantação de direitos legítimos e ignorados.  Que, ao menos, não tenhamos forte ímpeto de virar as costas para as possibilidades, para as portas abertas, semifechadas, ou cerradas mas sem trinco...

Feliz Ano Novo, amigos! Não nos abandonemos a sós com nossas esperanças, com nossos verbos de bom-senso, de carinho, de compreensão. Alimentemo-nos juntos da arte, do vinho, da natureza e do respeito. Mas, sobretudo, não olhemos para o horizonte sinistro, criado pela própria Humanidade, como um muro inescalável e perpétuo; ao contrário, superemo-nos e sigamos de mãos dadas!

terça-feira, 23 de dezembro de 2014

Um papo exclusivo com Luiz Gonzaga Belluzzo sobre o Palmeiras



Reprodução


Conversei na sexta-feira (19) com o ex-presidente do Palmeiras, Luiz Gonzaga Belluzzo, para uma matéria de economia para a RBA. Na oportunidade, tivemos um breve colóquio sobre algo menos importante, mas que ele conhece tanto como economia: como vê hoje o clube que presidiu no biênio 2009/2010. “Acho que o Palmeiras está reformulando o elenco ao meu ver de uma maneira que dá esperança de que o time não tenha um desempenho tão ruim quanto teve em 2014, porque contrataram um profissional, Alexandre Matos (ex diretor de futebol do Cruzeiro), que pelo retrospecto é um sujeito judicioso. Claro, com limitações que têm que ser impostas mesmo. Mas ele tem um retrospecto que o recomenda. O Palmeiras está fazendo contratações que, no ambiente do futebol brasileiro hoje, são bastante razoáveis”, diz Belluzzo.

Sem citar nomes, o economista afirma que o presidente do clube, Paulo Nobre, ouviu pessoas sem a estatura digna do clube. “Como disse o Brunoro, ele se aconselhou com pessoas que não tinham gabarito suficiente para serem assessores, conselheiros de um clube grande como o Palmeiras. O aconselharam a encolher o clube. Ele já percebeu, espero que tenha percebido, e a torcida do Palmeiras não admite isso”, acredita.

O Alviverde anunciou ontem a contratação do meia Zé Roberto (ex-Grêmio), de 40 anos, e o atacante Leandro, destaque da Chapecoense no Campeonato Brasileiro. O técnico Oswaldo de Oliveira foi anunciado como novo treinador da equipe na semana passada.

Ainda sobre Paulo Nobre, Belluzzo diz que o presidente de um clube grande precisa pensar de acordo com essa grandeza. “Se você se fechar dentro do clube e ficar se aconselhando com quem não tem condições de dirigir um carrinho de pipoca, é difícil... O cara pode até ter superávit com um carrinho de pipoca, mas é um carrinho de pipoca.”

Para Belluzzo, a torcida do Alviverde “não admite” um time “mais ou menos”, que tem sido a política no clube nas últimas temporadas.

Ele se diz esperançoso de que o Palmeiras consiga finalmente se manter com uma estrutura profissional e acha que a Arena pode ser um pilar para isso. “O Palmeiras é um dos poucos clubes, talvez o único no Brasil, que tenha construído uma fonte alternativa de receitas adicional (a Arena) num momento em que o futebol brasileiro está com uma reputação muito ruim. O estádio foi pensado pra isso. Mas precisa conseguir parceiros, ir atrás de patrocinadores”, diz o ex-dirigente, que bancou a ideia da Arena quando presidiu a agremiação.

sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

O preço do petróleo, Estados Unidos, Rússia, o Brasil e o fusca do Mujica



Ou: peças de um quebra-cabeça


Roberto Stuckert Filho/PR
Dilma cumprimenta Putin em reunião de cúpula dos Brics (22/11/2014)

A crise do preço do petróleo, que tem queda violenta e chega a 60 dólares esta semana é uma pancada considerável em países como Rússia, Venezuela e Irã. Principalmente para a Rússia.

Por incrível que pareça, a desvalorização do preço do petróleo pode favorecer o Brasil. Por quê? Porque pode reduzir o déficit que o país e a Petrobras assumiram ao manter artificialmente o preço do óleo abaixo do mercado internacional em tempos recentes. E porque o Brasil importa muito petróleo, ainda, embora tenha reservas enormes.

Para a Rússia, a situação é catastrófica. Cito matéria da Agência EFE:

"Como gás e óleo respondem por cerca de 75% das exportações russas, teme-se que o país perca condições de gerar divisas necessárias para cumprimento de seus compromissos comerciais e financeiros com o exterior.

O petróleo caiu devido a uma decisão unilateral da Arábia Saudita — maior exportador mundial do combustível e principal aliado dos EUA no Oriente Médio, ao lado de Israel."  

Leia a matéria da Agência EFE neste linkPutin afirma que EUA querem fazer da Rússia um 'troféu de caça'

Fecho aspas.

De outro lado, o restabelecimento das relações entre os Estados Unidos de Barack Obama e a Cuba de Raúl Castro, e a muito pouco divulgada, em nossas plagas, aproximação visível da Rússia com a Argentina.

O Brasil ao lado de Rússia, Índia, China e África do Sul nos Brics.

As poderosas Alemanha e China em estratégico silêncio.

E, no Leste, a preocupante situação na Ucrânia, sob um governo neofascista com apoio das potências ocidentais, Estados Unidos da América à frente.

O mundo é uma panela de pressão.

Enquanto isso, aqui na terrinha a galera está encantada com as sandálias e o fusca do Mujica.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Dilma se emociona ao falar aos que perderam familiares, amigos e companheiros na ditadura


Ex-guerrilheira e presidente da República, ao receber relatório da Comissão Nacional da verdade, nesta quarta-feira, dia 10.





... E na célebre foto na sede da Auditoria Militar no Rio de Janeiro, em novembro de 1970, quando tinha 22 anos. Depois de 22 dias sendo torturada, ela responde a interrogatório. No segundo plano, militares cobrem o rosto.





sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Favoritos do cinema (10) – Paradise Now, a Palestina e a beleza misturada à dor





Revi esses dias um filme que é preciso mesmo ver, no meu caso rever. Paradise Now, dirigido pelo palestino Hany Abu-Assad (2005).

É a sensível história dos amigos de infância Khaled (Ali Suliman) e Said (interpretado por Kais Nashef). São mecânicos e trabalham em uma oficina em Nablus, cidade localizada na Cisjordânia, a cerca de 60 km de Jerusalém, com população estimada  de 200 mil habitantes.

Sob a ocupação israelense, eles cresceram com os traumas de viver numa “cidade que virou uma cadeia”, como resume a personagem Suha (protagonizada pela linda atriz Lubna Azabal), uma jovem cosmopolita, filha de família palestina tradicional, que nasceu na França e viveu no Marrocos, e que não resiste a voltar às origens e a certa altura exclama: “Não sei o que estou fazendo aqui”.

A trama das vidas de Said e Khaled subitamente sofre dramática e definitiva transformação: do cotidiano comum – até onde se pode, sem ser cínico, chamar de “comum” a vida em um território militarmente sitiado –, os dois rapazes são de repente alçados à condição de mártires palestinos, e convocados pelas lideranças a uma missão suicida em que terão que representar mais uma vez os papeis que lhe são reservados nessa terrível e interminável tragédia de dois povos. Na narrativa do filme, fica claro que eles fazem parte de uma lista, como soldados alistados à espera de serem recrutados ao teatro da guerra, em seu caso uma guerra desigual.

É impressionante a transformação operada pelo diretor nos personagens Said e Khaled, como mostram as fotos do primeiro, antes e depois de ser recrutado para a missão.

Said, o mesmo personagem, antes e depois...

Said é filho de um “colaborador”, ou seja, um palestino que se rendeu aos interesses israelenses, que entre nós chamamos “informantes”. Seu pai foi executado quando o jovem ativista era criança. Ao se dirigir ao líder que o recruta para a missão, Said justifica sua aceitação do destino, em uma fala marcante no filme:

Os crimes da ocupação são incontáveis. Mas o pior de tudo é explorar a debilidade das pessoas e convertê-las em colaboradores. Não só aniquilam a resistência, como também arruínam as famílias, sua dignidade e nosso povo. (Meu pai) era um homem bom, mas ficou frágil.”

Mas Paradise Now não propõe uma visão maniqueísta. A jovem Suha, com a experiência de ter vivido em outros contextos, por quem o jovem Said nutre uma paixão correspondida, mas impossível diante do destino histórico-fatalista que ele próprio se impõe, representa no filme a percepção de que a violência de um ataque suicida é não só inútil para a causa palestina como também a enfraquece ainda mais.

Dito assim, pode parecer que o filme de Hany Abu-Assad é baseado em um roteiro tolo e previsível. Mas não é assim. É um grande filme, que não ganhou por acaso vários prêmios, como o Globo de Ouro de melhor filme estrangeiro, o Anjo Azul do Festival de Berlim e um da Anistia Internacional. Foi indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro em 2006. E também não foi por acaso que a indicação ao Oscar provocou protestos em Israel, por "humanizar" os suicidas muçulmanos denominados no Ocidente de "homens-bomba".

Paradise Now tem muitas virtudes estéticas: a construção da trama mantém o suspense até o fim; apesar de ambientado em um cenário opressivo, o filme não se rende à violência barata a que nos acostumamos a assistir sob o rótulo de Hollywood, que um certo cinema brasileiro faz questão de reproduzir; a fotografia, com a cidade de Nablus, milenar e moderna, ao fundo, é exuberante e emocionante; a delicada construção dos personagens, as amizades, as relações familiares, as cores usadas pelas mulheres (a jovem Suha ou a mãe de Said, a impressionante atriz Hiam Abbass, nascida em 1960 em Nazareth, Israel, mesma cidade onde em 1961 nasceu o próprio diretor Abu-Assad). A beleza misturada à dor.


Kais Nashef (como Said) e Lubna Azabal (Suha)

Uma associação inevitável: será por acaso que a cena inicial de Paradise Now remeta inequivocamente à cena de Eva (Eszter Balint) chegando a Nova York no filme Stranger than Paradise, de Jim Jarmusch, de 1984? Paradise Now, Stranger than Paradise. Não creio nesse acaso. Paraíso, paradise. Palestina, Nova York.

Tudo isso para dizer que Paradise Now é um filme que precisa ser visto.



segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

Com Levy e Nelson Barbosa, Dilma tenta aliar equilíbrio e desenvolvimento



Da praia direto para a política econômica. Acabo de chegar de férias e, como a vida não para, conversei hoje com o professor Giorgio Romano Schutte para uma matéria para a RBA, sobre as escolhas da presidente Dilma Rousseff para a área econômica, Joaquim Levy (Fazenda), Nelson Barbosa (Planejamento) e Alexandre Tombini (mantido no Banco Central).

Wilson Dias/Agência Brasil
Joaquim Levy

Coordenador do curso de Relações Internacionais da Universidade Federal do ABC, Schutte discorda das avaliações segundo as quais a opção da presidente por Joaquim Levy seria uma guinada do governo à direita, no caminho do neoliberalismo. “Acho que estão se enganando. Não existe longo prazo, se existe caos no curto prazo. O Brasil não teria condições de segurar uma reação violenta se colocasse alguém claramente identificado com o PT na Fazenda. Você precisa tranquilizar o mercado e a partir daí conversar. Esse é o jogo”, diz o professor.

Não é demais dizer que concordo com ele. Além da difícil conjuntura atual (contas públicas desorganizadas, com déficit público nominal de 5% em 2014, seguidos resultados negativos da balança comercial e inflação no limite do teto), ele lembra que a estratégia política de Dilma não é novidade na história brasileira. “Ao indicar os dois juntos, Dilma quis sinalizar que precisa ter equilíbrio (com Joaquim Levy) e ao mesmo tempo colocar alguém mais ligado a uma visão desenvolvimentista [Nelson Barbosa]”, afirma o acadêmico da UFABC.

“O Lula fez em 2003, Getúlio fez em 1951. O Brasil não tem tradição de enfrentamento com o mercado. O governo também não tem maioria confiável no Congresso, não tem povo mobilizado e numa economia aberta os investidores vão embora rápido. São as limitações com as quais um projeto de transformação tem de saber lidar.”

E é isso, por enquanto. Está de bom tamanho, para um primeiro dia depois das férias.

A matéria da RBA, com links para outras opiniões na rádio, estão neste link.