terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Os caminhos da liberdade de Jean-Paul Sartre [3] – Com a morte na alma



Com a Morte na Alma é o último volume da trilogia Os Caminhos da Liberdade. A guerra é realidade, Paris é ocupada pelos nazistas, e a consciência dos personagens construídos a partir do inaugural A Idade da Razão, que nas páginas de Sursis torna-se gradativamente a consciência conflituosa e multifacetada da própria Europa, desemboca na amarga realidade de um país, a orgulhosa França, vencido.

Os personagens são levados, pela magnitude dos fatos que os superam, a entender que a História é mais forte do que as idéias de liberdade burguesa de cada indivíduo. Diante da Guerra, há como que uma suspensão dos princípios individuais, queiram ou não os personagens aceitar esse estado de coisas. Os egos se dissipam. A Europa se fragmenta. A França cai. A história sombria e sem saída toma conta das consciências e das ruas abandonadas:

Ninguém no Bulevar St.-Germain; rua Danton, ninguém. Nem mesmo as portas de ferro estavam abaixadas, os mostruários brilhavam: tinham simplesmente tirado o trinco das portas ao partirem. Era domingo. Era domingo há três dias; em Paris agora havia um só dia em toda a semana. Um domingo como outro qualquer, um pouco mais vazio que de costume, um pouco mais químico, silencioso demais, já cheio de podridões secretas (...) Longas esteiras brancas sujavam os vidros das vitrines. Daniel pensou: ‘os vidros choram’ Atrás dos vidros era uma festa: milhões de moscas zumbiam.”

Diante dessa realidade inóspita, na alma e nos bulevares, em que não há futuro, o protagonista Mathieu Delarue, que nos volumes anteriores da trilogia sufocava diante de uma liberdade vã (o homem está condenado à liberdade) está agora na linha de frente, como combatente. É a consciência da liberdade.

Por meio de um ato gratuito de sacrifício, o homem ilusoriamente pode achar que é livre. O ato de matar um nazista pode ter a aparência de um ato de liberdade, de redenção, mas não o é. É a História, maior do que qualquer consciência, que o engole.


Leia também:

Os caminhos da liberdade de Jean-Paul Sartre [1] – A idade da razão

Os caminhos da liberdade [2] – Sursis

Sartre resiste ao século

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