segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

Documentário Amy, de Asif Kapadia, desmonta a historinha contada por Mitch Winehouse



Gravação de Back to Black no estúdio: emocionante

O documentário Amy, do diretor britânico Asif Kapadia, vira a página da história contada pelo pai de Amy Winehouse, Mitch.

O filme mostra que o pai-biógrafo, que cuidava da carreira e da conta bancária da filha, era uma pessoa manipuladora, egoísta e que claramente usava Amy como escada para seus próprios interesses. O ex-marido de Amy, Blake Fielder-Civil, que a introduziu na heroína, é ainda pior. Cercada por gente como essa, seus problemas só aumentaram com o sucesso.

Sucesso que ela não fazia questão de alcançar e mesmo repelia. “Eu enlouqueceria”, disse ela antes de explodir e virar alvo da mídia, que em sua vida exerceu papel tão ou mais pernicioso do que Blake Fielder-Civil. Ao ver o documentário, fica esclarecido que a condescendência de Mitch com a agressiva perseguição da mídia e dos paparazzi a Amy foi um comportamento calculado ao escrever seu relato biográfico da filha. Ele não queria ficar mal com eles.  

A omissão dos pais diante dos problemas da filha desde sua infância é notória no filme. A própria mãe conta que Amy, ainda menina, pediu mais atitude dela, que pegasse "mais pesado". A menina nunca ouvia "não". A omissão da família diante da bulimia, por exemplo, é declarada pela mãe.

Havia pessoas sinceras e mais interessadas na saúde e bem-estar da estrela do que nos dividendos de sua arte, como Nick Shymansky, o primeiro empresário e amigo dela. O próprio depoimento do segurança, Andrew, parece demonstrar sincera dor. Mas no mundo em que Amy viveu, é preciso ser mais forte do que ela.

Amy não queria e não sabia lidar com a fama. “Se me deixarem em paz eu vou escrever músicas”, disse.

Um dos produtores diz no filme que Amy “era uma velha num corpo de jovem”.  É uma definição muito interessante. Toni Bennet declarou que Amy deveria ter sido encarada e tratada como uma Billie Holiday ou uma Ella Fitzgerald, porque “era tão grande” quanto elas.

Acho que o filme de Asif Kapadia dá exagerado destaque ao longo relacionamento com Blake. Nesse ponto poderia ter equilibrado mais, com um pouco menos de tempo dedicado aos aspectos da intimidade, e pelo menos um pouco mais de espaço à pura arte, como a cena emocionante da gravação de Back to Black com Mark Ronson.

Mas o fato importante é que Amy, de Kapadia, desmonta a historinha contada pelo mau caráter Mitch Winehouse. Não é por outra razão que a família ficou muito contrariada e afirmou que o filme é “enganador".

7 comentários:

evelyn pedrozo disse...

Era uma menina carente e caiu nas garras de um bando de gente ruim, como o pai explorador, o marido, sua lâmina, e uma mãe vergonhosamente ausente. Pena ver a perda gradual de um ser tão especial

Eduardo Maretti disse...

Pena mesmo, Evelyn. É uma história triste.

Eduardo Maretti disse...

Aliás, não é à toa que Mitch Winehouse ficou furioso com o documentário. A família disse que o filme deturpa a história.

Tania Lima disse...

Achei que o filme foi apenas uma compilação do que já havia sido explorado pela mídia, exaustivas vezes. Quanto ao pai, a canção Rehab já nos dava uma ideia de como ele se posicionava de maneira permissiva. Enfim, uma vida de muitos excessos para uma figura psicológica e fisicamente frágil. Acho que com muito dinheiro, ninguém deveria se preocupar com carreira e sucesso, o dinheiro se presta a isso, para não ser necessário submeter-se a nenhuma pressão, no caso em específico, apenas compor e cantar por puro prazer, sem pressa e expectativa de resultados satisfatórios.

Paulo M disse...

Achei bom o filme ter exposto o pai da cantora, um babaca que só pensa em dinheiro. Algumas declarações foram condizentes com sua grandiosidade musical, como as já colocadas pelo post. Ela disse também, a certa altura, que estava se sentindo impulsionada pelo rock, pois considerava o jazz elitista. Acredito que o jazz era sua alma e que ela jamais o deixaria (embora fizesse parte de projetos de Mick Jagger para participar de shows e gravações da banda como membro externo, conforme o que li anos atrás), mas a declaração é positivamente significativa, porque mostra que a cantora tinha também um sensor de conhecimento de diferenças sociais. O filme esticou um pouco demais sua relação com o marido (como já dito no post) e, consequentemente, sua relação íntima com as drogas, que acabaram ceifando sua vida e a expectativa de seus fãs por seu trabalho futuro. Uma pena, mas o que ficou é o que importa.

Felipe Cabañas da Silva disse...

Me lembro de ter visto esse seu post no Facebook e pensei: vou ler depois de ver o filme. Concordo com tudo. Fiquei com a triste percepção que pai e marido a queriam cada vez mais fraca... A fraqueza, no caso, era a garantia de sua dependência emocional e que eles não perderiam seu lugar ao sol. Assisti recentemente "Cobain: Montage of Heck" (um documentário bárbaro que indico a todos), e a história da Amy me lembrou muito a do Kurt: uma história de abandono, sofrimento e genialidade. A Amy é a diva do jazz do século XXI. É a única até agora que possa ser colocada no panteão junto com Ella Fitzgerald e Billie Holliday. Nenhuma outra jazzista atual (Diana Krall, Madeleine Peroux, Jane Monheit, etc.) se aproxima da genialidade e da peculiaridade da voz. A Madeleine Peroux tem a voz mais parecida com a Billie Holliday, o que a torna uma lembrança da Billie e não uma voz única como a Amy.
E vendo esses documentários é inevitável ficar com essa pergunta sem resposta: por que tantos gênios de vida curta e miserável? Eles mereciam muito mais por fazer do mundo um lugar mais bonito, mas talvez estejam agora num lugar bem melhor que este. Um abraço.

Eduardo Maretti disse...

Felipe, concordo com tudo também, embora eu conheça menos jazz que você...
"Por que tantos gênios de vida curta e miserável?" Também não sei, quem saberá? Quando Amy morreu escrevi um post, entre chocado e emocionado (link abaixo), "Amy Winehouse foi se juntar a outros anjos" (que aliás você também comentou) em que eu especulava: "Para mim, como para Rilke, os que morrem de morte precoce são anjos que por aqui passaram". Algo talvez demasiado simplório, mas, enfim, como você diz, "talvez estejam agora num lugar bem melhor que este".

Abraço

Amy Winehouse foi se juntar a outros anjos:
http://fatosetc.blogspot.com.br/2011/07/amy-winehouse-foi-se-juntar-outros.html