Reprodução/Youtube
O magnata Donald Trump, terror do pensamento progressista no
mundo, um outsider, representante republicano descolado do establishment
político, que ameaça construir um muro para separar os Estados Unidos do
México, entre outras propostas consideradas absurdas, pode ganhar as eleições
dos Estados Unidos em novembro, contra todos os prognósticos de até poucos
meses atrás?
A poderosa máquina democrata comandada por Hillary Clinton,
que envolve poderes de Wall Street, do aparato de guerra e dos setores de
informação e tecnologia dos Estados Unidos, pode ser derrotada por um candidato
considerado histriônico e fanfarrão, ou protofascista, pelos analistas
políticos?
O cineasta Michael Moore não apenas acha que Trump pode ser
o próximo presidente do país mais poderoso da Terra, como enumera cinco razões
para respaldar sua opinião. Em primeiro lugar, ele diz que parcelas dos trabalhadores
insatisfeitos com o desemprego podem enxergar em Trump, com seu discurso
populista, uma saída para a crise de emprego que abala o país.
A segunda razão é que o magnata republicano pode representar
uma reação à ameaça que os neoconservadores acreditam existir num partido (o
Democrata) que já elegeu Barack Obama, um negro, duas vezes, e agora pode
eleger uma mulher. “Vamos deixar que uma mulher nos governe por oito anos?
Depois haverá gays e pessoas transgênero na Casa Branca”, pensariam os
conservadores, segundo Michael Moore.
O terceiro e quarto motivos pelos quais o documentarista
Moore acha que Trump chegará à Casa Branca se confundem. Podem ser resumidos
pela rejeição a Hillary por parte eleitores democratas mais à esquerda (que só
votariam na candidata como voto útil) e pela indisposição dos jovens que
preferiam Bernie Sanders em relação a uma representante da “velha política”.
Por fim, haverá, segundo Moore, o voto de protesto de
parcela considerável dos eleitores contra o sistema político norte-americano,
cujas mazelas associam aos democratas e a Obama, o presidente que está há oito
anos no poder.
Para Reginaldo Nasser, professor de Relações
Internacionais da PUC-SP, as projeções de Michael Moore fazem sentido. Mais do
que isso: “É difícil prever, mas Trump, hoje, é favorito, mantidas as
circunstâncias atuais, já que os Estados Unidos mudam muito e pode acontecer um
fato novo.”
Segundo ele, como Hillary assumiu uma posição conservadora
dentro do Partido Democrata para tentar ganhar votos do centro, os jovens que
ajudam a compor o perfil de esquerda dos eleitores democratas estão arredios à
candidata. A crise que atinge os Estados Unidos, onde a pobreza vem
crescendo, também deve prejudicá-la.
Hillary tem contra si um grande contingente do eleitorado à
esquerda que a identifica com causas muito distantes do pensamento jovem e dos
setores progressistas. “Ela é bastante conservadora. Por exemplo, é claramente
pró-Israel, é belicista e apoia a guerra. O eleitorado democrata mais à esquerda
não vota nela. Pode votar, mas como voto útil. Mesmo assim, vai pensar muito”,
diz Reginaldo Nasser.
MARC NOZELL/FLICKR CC
Do lado dos conservadores que Hillary quer atrair, também há
problemas. “Na cabeça deles, o terrorismo no mundo aumentou com
Obama e os latino-americanos estão tomando seu emprego. Vão colocar tudo isso
na conta de Obama. Hillary pode ser vítima tanto do descontentamento dos
democratas de esquerda como do voto dos conservadores que temem que os
democratas de esquerda comecem a mandar no governo”, diz Nasser.
Por fim, há quem considere absurdo que um “maluco” como
Trump chegue à Casa Branca. Mas não seria a primeira vez que um “ator”, de fato
ou simbolicamente, conseguiria tal proeza. “Ronald Reagan, um ator de fato, não
ganhou duas vezes?”, lembra Nasser. O republicano Reagan, presidente dos
Estados Unidos de 1981 a 1989, foi ator em Hollywood de 1937 a 1964.
Para o professor da PUC, a força da candidatura de Trump
pode ter sido subestimada: "o que a gente não pode esquecer, e aí divirjo
um pouco do Moore, é que ele denigre a imagem do Bush e a gente ri. Só que
esses caras, Reagan, Bush ou Trump, têm uma equipe de primeira. O sociólogo
Erving Goffman fazia uma analogia com o teatro: é preciso ver o palco e o que
está atrás. No palco estão os idiotas. Mas os que estão atrás do palco
(backstage, os bastidores) não são idiotas, são competentes e poderosos.”
Apesar de tudo, Michael Moore, com seu estilo
irônico, previu que o republicano Mitt Romney venceria as
eleições em 2012. Mas quem ganhou e acabou reeleito foi Barack Obama.
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*Escrevi este texto para ser publicado originalmente na RBA
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*Escrevi este texto para ser publicado originalmente na RBA
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