Foto: Stella Senra (clique para ampliar)
Manifestação em Brasília contra o golpe - 31 de março de 2016 |
Não sou cientista político, mas alguns indícios parecem apontar na direção contrária à desejada pelos grupos midiáticos que querem convencer a população brasileira de que o golpe, via impeachment, é favas contadas. Somados, alguns desses indícios podem começar a configurar um cenário menos sombrio ao prognosticado pelas máfias da comunicação, embora não se saiba que tipo de armas ou táticas possam estar reservadas para os próximos dias ou semanas pelos articuladores do golpe no Brasil e da verdadeira guerra (veja abaixo: a Guerra Híbrida).
Eis alguns deles:
- Algumas vozes importantes vêm se pronunciando no sentido de condenar as barbaridades jurídicas contra direitos constitucionais, perpetradas há muito tempo pelo juiz de Curitiba, principalmente de dois meses para cá, com o ápice na condução coercitiva de Lula e na divulgação dos grampos da conversa entre o ex-presidente e Dilma.
O ministro Marco Aurélio, do STF, é uma dessas vozes. Na quarta-feira (30),
ele disse, sobre o impeachment: "Se não houver um fato jurídico que
respalde o processo de impedimento, esse processo não se enquadra no figurino
legal e transparece como golpe (...) Por que não se sentam à mesa para discutir
as medidas indispensáveis nesse momento? Por que insistem em inviabilizar a
governança pátria? Nós não sabemos."
O senador Renan Calheiros, figura em quem a prudência não
aconselha confiar muito, mas que tem sido aliado importante do Planalto, disse
nesta quinta que o desembarque do PMDB do governo "não foi um bom movimento”.
Menciono Renan e Marco Aurélio, obviamente, porque seria
muito fácil falar de Chico Buarque, um eterno aliado das causas populares. Mas,
principalmente, a voz do ministro do Supremo tem significado, pelo que ele
representa em termos de um dos três poderes da República.
- O senador Lindbergh Farias (PT-RJ) faz a seguinte
avaliação sobre o desembarque golpista do PMDB comandado por Michel Temer: "o PMDB achava que, rompendo com o governo, outros partidos iam
debandar também. Isso não aconteceu, abriu-se mais espaço para que outros
partidos participem do governo". Ok, é a avaliação de um governista, mas
faz sentido, embora ainda seja cedo para concluir pelo erro ou acerto da
avaliação do senador petista.
- A conta para o impeachment comandado por Eduardo Cunha
passar na Câmara está longe de ser simples para os golpistas. Estes precisam de
342 votos (pelo menos dois terços de 512 - a Câmara tem 513 deputados, mas o presidente da casa não vota). Porém, o governo não necessita de 171 para barrar o processo. Basta que os favoráveis ao golpe não cheguem aos 342. Por
exemplo: 340 votam pelo impedimento, 120 se ausentam e 52 se abstêm. Nesse
caso, o impeachment é arquivado.
A conta do Miguel do Rosário, no Cafezinho, é outra: "se forem 341votos contra Dilma, e zero votos a favor dela,
mesmo assim o impeachment não passa, pois os votos dos ausentes são
considerados contra o impeachment". Dá no mesmo.
- As manifestações da sociedade a favor da democracia, mesmo
não sendo necessariamente decisivas (e quem lembra das Diretas Já sabe disso),
pressionam enormemente deputados em suas bases, principalmente no Nordeste.
Afinal, o Brasil não é São Paulo.
- Ao contrário de Collor, renegado pelas multidões que nele
votaram, desprezado por aliados e amigos, abandonado e combatido pela mídia que
o elegeu, Dilma conta com o apoio de uma base e movimentos sociais cuja só
presença certamente vai intimidar muitos parlamentares, na hora de votar. Eles
sabem que, quando voltarem a seus redutos eleitorais, e ao longo dos meses e
anos seguintes a um impeachment sem fundamento legal, o estigma de golpista poderá ser fatal a seu futuro político. Pelo sim, pelo não, talvez não sejam poucos os que ponderem sobre essa espécie de cenário de si mesmo.
- Por fim, as repercussões do golpe em marcha no Brasil já
são consideráveis na imprensa internacional. Isso tem influência, pois, para o bem ou para o mal, nenhum país
é uma ilha. Mais informações sobre o assunto neste artigo de Grazielle
Albuquerque, pesquisadora do Sistema de Justiça e doutoranda em Ciência
Política pela Unicamp, publicado no site Pragmatismo Político:
A repercussão do golpe na mídia internacional,
Exatamente há 52 anos, nesta mesma madrugada de 31 de março para 1º de abril, era deflagrado o golpe militar no Brasil.
Exatamente há 52 anos, nesta mesma madrugada de 31 de março para 1º de abril, era deflagrado o golpe militar no Brasil.
A Guerra Híbrida, segundo Pepe Escobar
Como epílogo, quero terminar registrando que a grande luta
que se trava é invisível e está além dos meros serviçais de golpe no Brasil. Essa é a
guerra de que se trata, que o jornalista Pepe Escobar aponta melhor do que
ninguém:
"A matriz ideológica e o modus operandi das revoluções coloridas já são, hoje, assunto de domínio público. Mas não, ainda, o conceito de Guerra Não Convencional (GNC) [orig. Unconventional War (UW).
"Essa guerra não convencional apareceu explicada no manual
das Forças Especiais para Guerra Não Convencional dos EUA, em 2010. O parágrafo
chave é:
"1-1. A intenção dos esforços de GNC dos EUA é explorar
vulnerabilidades políticas, militares, econômicos e psicológicos de um poder
hostil, mediante o desenvolvimento e sustentação de forças de resistência, para
alcançar os objetivos estratégicos dos EUA. (...) Para o futuro previsível, as
forças dos EUA se engajarão predominantemente em operações de guerra
irregular."
" 'Hostil ' não se aplica apenas a potências militares;
qualquer estado que se atreva a desafiar alguma trama importante para a
"ordem" mundial Washington-cêntrica - do Sudão à Argentina -, pode
ser declarado"hostil".
"Hoje, as ligações perigosas entre Revoluções Coloridas
e Guerra Não Convencional já desabrocharam, como Guerra Híbrida: caso
pervertido de Flores do Mal. Uma 'revolução colorida' é apenas o primeiro
estágio do que, adiante, será convertido em Guerra Híbrida. E Guerra Híbrida
pode ser interpretada, na essência, como a teoria-do-caos armada - paixão
conceitual dos militares dos EUA ("política é a continuação da guerra por
meios linguísticos"). No fundo, meu livro de 2014, Empire of Chaos
rastreia as miríades de manifestações desse conceito.
"Os detalhados e bem construídos argumentos [de Andrew
Koribko, um dos capítulos já traduzidos, e outros em tradução (NTs)] dessa tese
em três partes esclarece perfeitamente o objetivo central por trás de uma
grande Guerra Híbrida:
"O grande objetivo por trás de toda e qualquer Guerra Híbrida é esfacelar projetos multipolares transnacionais conectivos, mediante
conflitos de identidade provocados de fora para dentro (étnicos, religiosos,
regionais, políticos, etc.), dentro de um estado de trânsito tomado como
alvo.
"Os BRICS - palavra/conceito de péssima reputação em
Washington e no Eixo de Wall Street - teriam de ser os alvos preferenciais de
Guerra Híbrida. Por incontáveis razões, dentre as quais: o movimento na direção
de comerciar e negociar em suas próprias respectivas moedas, deixando de lado o
dólar norte-americano; a criação do Banco de Desenvolvimento dos BRICS; o
confessado interesse na direção da integração da Eurásia, simbolizada pelos
projetos: Novas Rotas da Seda - ou, na terminologia oficial, Um Cinturão, uma
Estrada [ing. One Belt, One Road (OBOR)] liderados pela China; e União
Econômica Eurasiana (UEE) liderada pela Rússia."
Leia o artigo de Pepe Escobar na íntegra, no site O Cafezinho: Brasil e Rússia sob ataque de “Guerra Híbrida”
Leia o artigo de Pepe Escobar na íntegra, no site O Cafezinho: Brasil e Rússia sob ataque de “Guerra Híbrida”
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