quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Na era da tecnopolítica, informação é o que está oculto


No dia 12 de novembro passado, um dia antes dos ataques a Paris pelo Estado Islâmico, o sociólogo Laymert Garcia dos Santos, que foi meu professor na PUC lá se vão muitos anos, participou de seminário na Assembleia Legislativa e falou sobre o tema informação. Mais do que a análise, como sempre sofisticada e aguda, a respeito de vários aspectos da realidade atual – as relações entre informação, mídias e política –, foi marcante a abordagem sobre a dificuldade de compreensão, por parte da esquerda, desse fenômeno hoje.

Segue um trecho da exposição de Laymert, que fala por si.


Reprodução/Youtube
Há hoje uma dimensão totalitária da linguagem e a instrumentalização da linguagem política. Não vejo como a esquerda possa reagir diante dessa ofensiva totalitária da mídia.

"O que não me satisfaz no modo como os blogs sujos combatem essa linguagem totalitária [dos meios de comunicação de massa, da ‘grande mídia’ ou como se queira chamar] é que eles não entenderam ainda, apesar de estarem mais próximos do entendimento disso, que a política hoje é tecnopolítica, não é mais só política. Quem entendeu que a política não é mais a política tradicional, mas que tínhamos passado para uma dimensão da tecnopolítica, é Julian Assange, é Edward Snowden e outros menos heroicizados, mais desconhecidos, gente que entendeu a potência e o poder da informação (...) Eles entenderam que o poder e o controle hoje se dão em torno da informação, estão com quem detém a informação e a torna acessível. O Facebook, por exemplo, acho que sabe fazer tecnopolítica. Quando ele consegue vender para milhões e milhões de pessoas que o que interessa é mais do mesmo. De certa maneira, ele conseguiu trazer para o campo das novas mídias uma coisa das velhas mídias. O que a Globo faz é mais do mesmo. No Facebook também é mais do mesmo, porque o Facebook é o meu espelho. Eu só reconheço as coisas que estão lá, só me interesso pelo reconhecido. Não o conhecido, mas reconhecido. Todo mundo vai se comprazer em ficar olhando para um espelho narcísico, para si mesmo, para seus amigos ou sua própria imagem, ou para tudo aquilo que é mais do mesmo. Informação é diferente disso: informação é o diferente, não o mesmo.

Por que digo que Assange e Snowden são intelectuais do futuro? Porque eles entenderam que o problema da dominação é a questão da informação, vão procurar o que é o mais guardado, o que não pode ser exposto. O contrário do que faz o Facebook. ' O que o poder dos poderosos não quer mostrar? É isso que nós vamos mostrar. É isso o que interessa.’ Então (...), ao invés de ficar olhando para o próprio espelho, você cria uma ruptura, porque aparece uma outra dimensão, que é dada precisamente porque ela é aquilo que quem detém o poder não quer mostrar. Porque no mundo de hoje tudo é exposto, menos aquilo que devia ser exposto. O que devia ser exposto é o que Snowden mostra: todos nós somos vigiados, todos temos nossos dados manipulados (...) O que fazem as grandes corporações, como Google, Facebook? ‘ Temos especialistas que vão trabalhar com os sentimentos das pessoas, dos afetos das pessoas, os rastros afetivos, sociais, linguísticos, o cartão de crédito etc, e todos esses rastros deixados pelas pessoas vão nos permitir fazer uma leitura delas e conhecê-las melhor do que elas mesmas (...) É isso que é capitalismo hoje. São essas informações que vão contar.

O usuário comum do Facebook vai estar lá se deliciando com sua própria fotografia, sem saber que tem uma outra instância onde ele está sendo programado o tempo inteiro para ter a reação X, que vai ser cada vez mais ele ficar contente com seu narcisismo. Vejo a esquerda querer se contrapor a essa ofensiva – que trabalha neste nível, no nível da tecnopolítica – ainda com uma política da representação. Mas você está lidando com uma coisa que tem uma dimensão de ficção científica, e lida com isso dessa maneira, como se você estivesse no século XIX? É claro que você vai perder todas.

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