Foto: Eduardo Maretti
A crise vivida pelo governo Dilma Rousseff no início do seu
segundo mandato, os desafios do PT decorrentes de ter se afastado das bases e
do “caráter politizador” que tinha nas origens, a frustração causada no
eleitorado da presidente por ter adotado soluções como o ajuste fiscal, que contradizem
a plataforma de campanha, o ódio ao PT por parte de setores significativos da
chamada elite.
Esses são alguns dos temas comentados pelo cientista
político André Singer, que entrevistei para a RBA na semana passada. Para Singer, ao iniciar o 13° ano no poder, com a presidente Dilma Rousseff, o lulismo enfrenta seu maior desafio, assim como o PT do ex-presidente e da atual chefe do Executivo brasileiro.
Ex-secretário de redação da Folha de S. Paulo,
ex-secretário de Imprensa do Palácio do Planalto e ex-porta-voz da Presidência
da República no primeiro governo Lula, Singer fala também do conceito de realinhamento
eleitoral, “elaborado nos Estados Unidos para designar a mudança de clivagens
(divisões) fundamentais do eleitorado”, que aborda em seu livro Os Sentidos do
Lulismo (2012, Cia. Das Letras).
Veja alguns trechos da entrevista e, abaixo, os links para a
íntegra.
Esquerda e eleições
A esquerda não disputa eleições só para ganhar. É claro que
também para ganhar. Mas ela disputa para educar, para politizar a população.
Para mostrar que existe um programa alternativo àquele da classe dominante que
pode ser implementado, e ganhar apoio para esse programa.
(...) A transformação social que vem ocorrendo, de 2003 para cá, não foi acompanhada de uma ação pedagógica. O PT abriu mão do seu caráter politizador.
(...) A transformação social que vem ocorrendo, de 2003 para cá, não foi acompanhada de uma ação pedagógica. O PT abriu mão do seu caráter politizador.
Governabilidade, PMDB, Congresso
A aliança com Sarney é anterior a 2005. Em 2005, o que
ocorre é uma tentativa de aliança com o conjunto do PMDB. Tenho dito uma coisa
desde 2007 que vou repetir aqui: alianças parlamentares para a manutenção da
governabilidade são justificáveis. Porque o governo, qualquer governo, chega ao
Executivo e tem que dialogar, ter uma relação produtiva, digamos assim, com o
Parlamento. Ele não pode escolher o Parlamento, que é escolhido pela sociedade.
É preciso respeitá-lo e negociar com ele. Os pactos parlamentares que dão
sustentação a uma ação executiva são justificáveis, desde que a política do
Executivo seja justificada. E acho que as políticas do Executivo brasileiro
desde 2003 para cá foram políticas sociais importantes. Foi feito um combate
efetivo à extrema pobreza, à miséria, houve uma redução da desigualdade.
Se para isso foi necessário se estabelecerem determinadas
alianças parlamentares, foi um preço a pagar para se lidar com a realidade. E
esse preço que foi pago produziu frutos reais, avanços reais na direção de um
programa de maior igualdade, que é um programa de esquerda. Agora, essas
alianças não deveriam se transformar em alianças eleitorais. Quando se transforma
isso em uma aliança eleitoral, você não se apresenta para o eleitorado com cara
própria.
Economia e ajuste fiscal - Dilma Rousseff
Primeiro mandato - O governo Dilma, no primeiro mandato, foi
muito corajoso, entre meados de 2011 e final de 2012, tentando alavancar a
economia com industrialização e distribuição de renda. Para fazer isso, ela
adotou o que eu chamo de ensaio desenvolvimentista. Talvez tenha sido, durante
todo o período do lulismo, o mais nítido ensaio desenvolvimentista que ocorreu
na política econômica. Os juros foram reduzidos para um patamar de 2% reais ao
ano, não nominais, que é uma aproximação importante da taxa de juros
internacional. Houve uma política de controle cambial, e simultaneamente de
investimento público por meio do PAC. Naquele momento houve uma transformação
do chamado tripé macroeconômico neoliberal.
Segundo mandato - Certamente existiria (alternativa ao ajuste
fiscal e à política econômica adotada por Dilma no segundo mandato). Insistir
em reativar a economia brasileira e resolver o problema dos gastos públicos por
meio do aumento de receitas que adviria da própria reativação da economia.
O que aconteceu, por razões que eu não compreendo muito bem,
é que a presidente Dilma resolveu fazer uma campanha dizendo isso (apontando
para uma política desenvolvimentista). E acabou sendo eleita com essa
plataforma. Foi uma eleição apertada, e nesta diferença pequena que se
consolidou no segundo turno esse discurso teve um papel de catalisador, que
animou muita gente a ir pra rua fazer campanha.
Hoje, em face do que está
acontecendo, eu digo que foi um erro. Se ela não tinha a avaliação de que
poderia desenvolver essa política, não deveria ter feito a campanha nesses
termos, porque a mudança entre o que se diz o que se faz, em termos eleitorais,
cobra um preço muito alto. O eleitorado costuma não perdoar esse tipo de
mudança. Criou-se uma expectativa de uma política diferente e uma certa base
política para uma outra tentativa de reativar o crescimento que, no meu
entendimento, é o que foi prometido explicitamente na campanha. Agora, se
existe uma avaliação de que as medidas necessárias para isso seriam medidas que
não teriam base política, isso tem que ser explicado para a sociedade, para o
eleitorado e também para a militância que apoiou essa proposta.
Primeira parte - Para André Singer, governo precisa ativar
economia e 'mudar de rumo' para enfrentar crise
Segunda parte - "Ódio ao PT não é saudável para a
democracia", diz André Singer
Leia também:
Um comentário:
É interessante, - .. o gov Dilma foi corajoso entre meados 2001 ate final 2012, uma política desenvolvimentista.Depois promete um apolítica econômica na campanha e faz outra no mandato.????? marco antonio ferreira
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