quarta-feira, 18 de março de 2015

Crônica do absurdo por excelência


 "No Brasil, o absurdo perdeu a modéstia" (Nelson Rodrigues)

Por Jean Wyllys 


Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados
A Folha de São Paulo publicou ontem pesquisa do Data Folha acerca da estima popular em torno do Câmara Federal. Segundo essa pesquisa, apenas 9% dos brasileiros entrevistados consideram os parlamentares "bons". Mais da metade considera o Parlamento "péssimo".

Qualquer pesquisa rasa em postagens e comentários nas redes sociais ou qualquer conversa de botequim mostra o que a maioria ou a média dos brasileiros e brasileiras pensa do Parlamento (e, por extensão, da política): lugar de aproveitadores egoístas e de "bandidos" interessados em enriquecer por meio do Erário (se levarmos em conta a postura da bancada de fundamentalistas religiosos, há pessoas que acham que o Parlamento só reúne ignorantes obscurantistas e analfabetos políticos).

A Operação Lava Jato - que investiga um pesado e antigo esquema de corrupção na Petrobras, envolvendo empresários e políticos - indiciou, por enquanto, duas dezenas de parlamentares, alguns destes assumindo posições na Mesa Diretora da Câmara e dois deles - Cunha e Renan Calheiros - presidindo as casas legislativas (sendo que o que preside a Câmara Federal é alvo de outros tantos processos por corrupção).

Todos assistimos, na tevê, a escândalos de corrupção envolvendo parlamentares e a chantagens de políticos contra o governo federal a fim de adquirir mais ministérios e outros privilégios. E vimos, no Youtube, um parlamentar em atividade pedir a senha do cartão de crédito de um fiel de sua igreja como dízimo.

Todos os dias, há parlamentares no Plenário da Câmara resvalando na baixaria; em ofensas impublicáveis uns contra os outros. Alguns deles recorrem ao seu machismo para ofender a presidenta da República. Um deles já chamou Dilma Rousseff de "sapatão" (não como elogio!) e disse que só não estupraria uma colega deputada pelo fato de ela ser "feia".

A Corregedoria da Câmara e o Conselho de Ética arquivam a quase totalidade das representações que lhes são apresentadas contra os deputados, num flagrante e vergonhoso corporativismo.

Ou seja, a Câmara Federal está - e sempre foi - desqualificada em função muito mais de seus próprios parlamentares.

Porém, em vingança por ter sido denunciado pelo Ministério Público Federal ao Supremo Tribunal Federal em razão de seu possível envolvimento na corrupção da Petrobras, Eduardo Cunha e o baixíssimo clero que lhe deu a presidência da Câmara e vem sustentando seus desmandos decidiram que o que "desqualificou" o Parlamento foi a frase infeliz - mas não de todo falsa! - do ministro da Educação Cid Gomes, segundo o qual haveria mais ou menos 400 "achacadores" na Câmara.

Eduardo Cunha et caterva decidiram fazer tempestade em copo d'água com a frase de Cid Gomes porque acham que o possível envolvimento de Cunha no esquema de corrupção da Petrobras vazou à imprensa graças ao Palácio do Planalto.

Cunha et caterva conseguiram convocar o ministro Cid Gomes para uma Comissão Geral que se encerrou agora há pouco da pior maneira possível para a Câmara Federal (a demissão do ministro comunicada há pouco também não causa surpresa, já que sua postura era a de quem veio preparado para a batalha, e não para fazer média com seus detratores - ele pediu desculpas àqueles em cujas cabeças não caiu a carapuça; e eu o desculpei, pois jamais me senti ofendido, já que não sou achacador ).

O que se viu aqui foi um espetáculo grotesco: uma Comissão Geral transformada num tribunal de exceção, em que Cid Gomes era espinafrado pela maioria dos líderes partidários e em que o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, comportava-se como o dono do brinquedo de uma classe de quinta série do ensino fundamental (nem o nome do ministro ele pronunciava, virando sua face rubra de raiva para o lado - o que lhe deixava ainda mais patético!).

O ápice do freak show se deu quando o deputado Sérgio Sveiter (PSD-RJ), aos berros, chamou Cid Gomes de "palhaço" - na verdade, ele disse que o ministro estava fazendo papel de "apalhaço" ao tentar se desculpar - e este reagiu, exigindo respeito. Eduardo Cunha - longe da postura de um presidente do poder legislativo - cortou o microfone de Cid Gomes, que acabou fazendo aquilo que qualquer pessoa com dignidade faria: retirou-se da comissão e foi embora.

Respondam-me: quem se sente representado por essa gente?


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