segunda-feira, 27 de outubro de 2014

Crônica de uma vitória não anunciada



Fotos: Carmem Machado
Avenida Paulista/ São Paulo, 26/10/2014

O QG montado pelo Partido dos Trabalhadores, em um hotel na região da avenida Paulista, na capital de São Paulo, para acompanhar a apuração da mais dura eleição após a redemocratização do país neste domingo, 26 de outubro, foi um termômetro da ansiedade e da desinformação que marcaram por todo o país a contagem dos votos na disputa entre o tucano Aécio Neves e a petista Dilma Rousseff.

Já se sabia que o processo de apuração seria nervoso, mas não se esperava tanto. Eram aguardadas a presença de ministros do governo Dilma oriundos do estado de São Paulo, principalmente Aloizio Mercadante (Casa Civil), Marta Suplicy (Cultura) e José Eduardo Cardozo (Justiça), que haviam comparecido no mesmo hotel quando da eleição do prefeito Fernando Haddad, em 2012.

O semblante de militantes e das poucas lideranças que chegavam caladas, falando ao celular ou procurando informações entre si, era de angústia e dúvida. Depois das seis e meia da tarde, 90 minutos antes da prevista divulgação dos resultados, que seria atrasada em função do fuso horário e do horário de verão, nenhum ministro havia chegado. Informações sobre supostas pesquisas de boca de urna vazadas aqui e ali começaram a pipocar. Elas falavam em vitória de Dilma Rousseff, por 54% a 46%.

Também chegavam informações de que trackings de fontes confiáveis do PT davam uma disputa “pau a pau”. Diferentemente de situações desse tipo, em que lideranças “bem informadas” costumam dar alguma sinalização do que poderia estar ocorrendo, todos eram iguais no hotel: repórteres de todos os tipos de veículos de mídia, líderes sindicais, militantes e as poucas autoridades petistas que, aos poucos, foram chegando. Ninguém arriscava palpites nem tinha informação confiável.

As especulações começaram a dar conta de que as ausências de ministros e do próprio prefeito Fernando Haddad eram sintoma de que algo estava muito mal para a “candidata oficial”, como se referia a Dilma Rousseff o tucano Aécio Neves durante a campanha. Isso porque o PT é reconhecidamente competente no acompanhamento de informações de processos de apuração em eleições. A avaliação era de que, se não havia informação, era porque não havia boas notícias para os petistas, era porque a coisa "estava feia."

Confrontado com essa versão, o presidente do PT paulista, Emidio de Souza, afirmou que era natural que os ministros ficassem em Brasília, com Dilma. O secretário de Desenvolvimento e Trabalho do prefeito Fernando Haddad, Artur Henrique, também não sabia de nada. “Eu sei o que vocês sabem”, disse. Ele não estava blefando. O semblante mostrava isso.

Um importante líder sindical petista da região metropolitana de São Paulo, olhando para o telão, comentou: “é importante observar a expressão facial das pessoas. Olhe a cara do Walter Feldman", disse o sindicalista, no momento em que o líder da Rede de Marina Silva aparecia num debate televisivo. “Ele não perece estar muito feliz.” Era verdade. Contudo a TV também mostrava o recém-eleito deputado federal petista José Américo enquanto ele passava as mãos no rosto. E também o ex-candidato ao governo de São Paulo, Alexandre Padilha. Ninguém parecia estar muito feliz. Era a face de tucanos e petistas em todo o país.




A contagem regressiva começou quando faltavam oito minutos para as 20 horas e a militância começou a se agitar e entoar cantos e palavras de ordem. Porém, ao contrário do que essa manifestação poderia significar, não era nenhuma informação de vitória captada por alguma liderança e vazada que se alastrara de repente. Era pura e simplesmente torcida. Informação, de fato, ninguém tinha. Era como quando a prorrogação de uma final de Copa do Mundo acabou empatada e vai começar a disputa de pênaltis.

Aconteça o que acontecer, o PT precisa repensar as estratégias em São Paulo", disse um dos líderes presentes.

Então, lideranças do PT e de movimentos sociais, militantes, jornalistas e sindicalistas foram se aglomerando perto do telão ligado em uma emissora de TV, do lado esquerdo do palco tomado por fotógrafos, e da tela do TSE, do lado direito.

Havia quem chorava, quem passava a mão no rosto, quem andava de lá para cá, quem não queria nem ver e quem tentava animar a militância. Faltava um minuto para as 20 horas. “A tucanada vai cair, a tucanada vai cair”, gritavam algumas poucas dezenas de vozes entre as centenas de angustiados no anfiteatro.

A âncora da emissora de TV, então, anunciou que iria revelar os resultados das urnas para a Presidência da República.

Com cerca de 94% dos votos totalizados, Dilma Rousseff tinha 50,99% dos votos válidos, contra 49,01% de Aécio Neves. Explosão. Gritos de alegria, palavras de ordem. “Ei, Veja, vai tomar no c...”

No entanto a fatura não estava concluída. “Ainda faltam seis milhões de votos!”, exclamou um repórter. “Velho, estou tremendo”, disse outro, de um veículo da “mídia tradicional”.


Passaram-se vários minutos. Muito longos. Como se diz, o tempo é relativo. Até que, às 20h17, o presidente do PT de São Paulo, Emidio de Souza, subiu ao palco. Na companhia da vice-prefeita paulistana, Nádia Campeão (PCdoB), ele disse: "Em nome da coligação que sustentou a candidatura da Dilma, quero anunciar com orgulho a vitória da presidenta. É uma vitória da democracia contra os golpistas. Os golpistas têm nome e endereço. Eles se chamam revista Veja."

O resultado final da apuração seria 51,64% a 48,36%.

2 comentários:

Paulo M disse...

Foi tenso. Segundo o Uol (minha paranoia já me faz desconfiar irracionalmente de qualquer formiga que atravessa o chão do meu quarto), o Aécio (que não terá mais assento após a reforma política) vencia até as 19:32 hs. O PT precisa planejar a partir de agora as eleições de 2016 e 2018. Perdemos feio aqui em São Paulo, na cidade inclusive, o que poderia ter decidido as eleições em favor do adversário. Não faltou empenho a Fernando Haddad, mas a meu ver faltou carisma. Se Lula estiver em forma em 2018, acho que podemos garantir presença no poder pelo menos até 2022. A Veja, a continuar assim, até lá vai estar ainda naquela do "eles sabiam", mais paranoica do que eu. Os caras tão deixando buraco na defesa. Essa foi por pouco, mas vencemos nos descontos.

Mayra disse...

Ótima crônica, Edu! Que tenso tudo... que lindo foi dançar na Paulista, mais uma vez, Apesar de você com o povo transbordando alegria. É o q o Paulinho falou: foi por pouco. A eleição acabou, mas os próximos 4 anos só começaram. E vai ser guerra.